Estudo aponta valores de referência para consumo de água em propriedades leiteiras
Trabalho das empresas proporciona aos produtores acesso aos dados que
são referência em indicadores de eficiência hídrica para o consumo de
água de vacas. Essas informações são diferenciadas segundo o sistema de
produção confinado, semiconfinado e a pasto
No Dia Mundial da Água, a Embrapa
e a Nestlé apresentam valores de referência para o consumo de água na
atividade leiteira. Os resultados exclusivos proporcionam aos produtores
de todo o País acesso aos dados que são referência em indicadores de
eficiência hídrica para o consumo de água de vacas em lactação e também
para lavagem de sala de ordenha (lavagem dos pisos, do equipamento de
ordenha e do tanque de leite). Essas informações são diferenciadas de
acordo com o sistema de produção confinado, semiconfinado e a pasto.
Em
um sistema a pasto as vacas em lactação bebem em torno de 64 litros de
água ao dia. Já no semiconfinado, são 48 litros de água por vaca em
lactação ao dia e, no confinado, 89 litros. Esse consumo das vacas em
lactação é influenciado por sua produtividade de leite. A pasto, a
produtividade média foi de 17,6 litros de leite por vaca ao dia; no
semiconfinado, 14,4 e, no confinado, 25 litros.
Assim, uma vaca
em sistema confinado consome 8 litros de água ao dia a mais do que uma
vaca a pasto e produz uma quantidade maior de leite, 7,4 litros
adicionais.
Em relação ao consumo de água por litro de leite ao
dia, os valores para os três modelos de produção variaram de 3,3 (a
pasto) a 3,8 (confinado) litros de água por litro de leite ao dia.
Para
a lavagem da sala da ordenha, os valores de referência foram 17 litros
de água por vaca em lactação ao dia para os produtores que mantêm os
animais no pasto; no semiconfinado e confinamento, foram 20 e 21 litros
de água, respectivamente.
De acordo com o pesquisador da Embrapa Pecuária Sudeste (SP) Julio Palhares (foto à esquerda),
que avaliou os dados, para esse tipo de uso da água há grande variação
entre as fazendas. “Enquanto a maior parte das propriedades em sistema
semiconfinado consome 20 litros de água por vaca ao dia, há fazendas
consumindo em torno de 55 litros. Nos locais onde o consumo é muito
alto, os produtores devem se perguntar: por que estamos consumindo essa
quantidade de água se outras fazendas consomem menos para o mesmo uso?”,
observa Palhares.
O pesquisador diz que a variação no valor do
indicador ocorre porque esse tipo de uso da água é influenciado por
vários aspectos, como raspagem ou não do piso, utilização de água com ou
sem pressão, mangueira com fechamento do fluxo hídrico, condição do
piso da ordenha (rachaduras, buracos etc.) e mão de obra capacitada.
Quando
se fala em eficiência hídrica do produto leite, o confinamento foi o
mais eficiente – um litro de água por litro de leite produzido ao dia.
No semiconfinado, o consumo foi maior – 1,5 litro por litro de leite. No
sistema a pasto, o valor foi de 1,2 para cada litro de leite produzido.
Com
esses valores, o produtor de leite pode saber se seu consumo de água
está de acordo com os valores de referência. Se o gasto for além, o
pecuarista não está sendo eficiente e, consequentemente, desperdiçando
dinheiro. Há uma lista de boas práticas para melhorar esses indicadores.
Boas práticas hídricas
O
estudo teve como referência o programa Boas Práticas Hídricas,
desenvolvido pelas duas empresas, que oferece apoio às fazendas
leiteiras e instalação de hidrômetros para ajudar a mensurar o consumo
de água na produção. Foram analisadas cerca de 10 mil leituras dos
hidrômetros de 1.200 produtores que fornecem leite para a Nestlé, no
período de 2021 e 2022, dos estados de Goiás, Minas Gerais, Paraná e São
Paulo.
Por meio do monitoramento mensal realizado com
hidrômetros instalados em diversos locais de consumo nas propriedades,
ao longo desses dois anos, foi possível analisar o volume total de água
utilizado em cada propriedade. Esse trabalho foi realizado por
profissionais da Embrapa e da Nestlé, que computaram os dados no
aplicativo Leiteria, uma ferramenta que permite aos produtores fazer a
documentação hídrica e inserir mensalmente as informações referentes ao
consumo dos hidrômetros. Com isso, foi possível gerar os valores de
referência.
“Há cinco anos que o programa Boas Práticas Hídricas
contribui, de forma prática, para o desenvolvimento da nossa jornada de
sustentabilidade no campo. A cada ano, novos índices de produtividade e
eficiência são alcançados. O que antes parecia distante para a cadeia
leiteira agora é uma realidade que supera os desafios em cada uma das
milhares de fazendas leiteiras do nosso País”, explica a gerente de Milk
Sourcing da Nestlé Brasil, Barbara Sollero.

Casos práticos
No
grupo analisado existem extremos, tanto positivos quanto negativos. Um
exemplo é um produtor na cidade de Lagoa dos Patos, Minas Gerais. Ele
trabalha com sistema confinado. No uso para lavagem da sala de ordenha, o
consumo foi de 79 litros de água por litro de leite ao dia. Já a
quantidade de água por vaca em lactação ao dia foi de 1.133 litros. O
consumo está muito acima dos valores de referência – de um e 21 litros –
para cada um desses indicadores. No mesmo estado, na cidade de Serra do
Salitre, uma pecuarista consegue ser eficiente e mostra que é possível
fazer melhor uso da água. A fazenda consome um litro de água por litro
de leite ao dia, valor igual à referência, e 19 litros diários por vaca.
Ou seja, ela é mais eficiente porque consome, diariamente, dois litros
de água por vaca a menos que o referencial, que é 21.
O fato
atípico da propriedade de Lagoa dos Patos, segundo o pesquisador, pode
ser um erro de anotação dos tipos de consumo medidos pelo hidrômetro. É
possível que outros usos passem pelo hidrômetro, como irrigação, por
exemplo.
Outro produtor, agora no estado de São Paulo, que
trabalha com as vacas no pasto, gasta 36 litros de água por vaca na
lavagem, quando a referência é 17. Ou seja, ele consome mais que o dobro
do valor referência. Além disso, usa 2,5 litros de água para cada litro
de leite produzido diariamente. Nesse caso, não há problemas de
anotação, mas de gestão hídrica. “É um indicativo de que há necessidade
de adequação por parte do gestor da fazenda. É bem provável que exista
falha na mão de obra, que não está capacitada, ou pode indicar que as
vacas passam muito tempo na sala de ordenha, o que aumenta a quantidade
de esterco a ser retirada”, acredita.
O pesquisador alerta que
não existe sistema hidricamente melhor; cada uso de água vai determinar
se a propriedade está sendo eficiente ou não.
O objetivo do
trabalho é iniciar a geração desses valores de referência de indicadores
do uso da água no Brasil. É uma ação contínua. “Esses não são valores
de referência definitivos. O banco de dados não está fechado, continua
sendo alimentado mensalmente. Quanto mais informações, maior robustez.
Também vamos gerar referências para outros usos da água, como irrigação,
residências etc.”, esclarece Palhares.
Essas são as primeiras
referências para uso da água em propriedades leiteiras que se têm no
Brasil e estão entre as poucas no mundo. Os valores irão auxiliar os
produtores e o setor leiteiro para o melhor uso deste recurso natural
finito e para mostrarem à sociedade que a produção de leite é feita com
eficiência hídrica.
Adoção de boas práticas O
manejo adequado da água proporciona disponibilidade hídrica em
quantidade e com qualidade na propriedade rural. A gestão da água não
pode ser deixada em segundo plano para evitar o risco de não se ter o
recurso em quantidade e qualidade suficientes. Alguns estados
brasileiros já sofreram ou sofrem com crises hídricas. Este ano, o Rio
Grande do Sul, por exemplo, passa por uma seca com impactos negativos na
agropecuária. A Embrapa Pecuária Sudeste tem à disposição do
setor produtivo um guia de boas práticas para auxiliar técnicos,
produtores e gestores na gestão dos recursos hídricos. São práticas
simples de serem adotadas na fazenda, como instalação de hidrômetros,
uso de mangueiras de pressão, manutenção do piso, captação de água da
chuva para uso na lavagem do piso, eliminação de vazamentos, raspagem do
piso da sala de ordenha, além de manter a nutrição dos animais
balanceada e capacitar a mão de obra. Na publicação,
a Embrapa considera a realidade da produção leiteira brasileira e a
legislação ambiental para proposição das ações de gestão eficiente da
água. |
Meta dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável
Esses
resultados contribuem para o alcance dos Objetivos do Desenvolvimento
Sustentável (ODS), meta nº 6, uma vez que orienta e estimula a adoção de
práticas conservacionistas nas propriedades rurais. Segundo a meta, até
2030, o Brasil precisa aumentar substancialmente a eficiência do uso da
água em todos os setores. Além disso, deve assegurar retiradas
sustentáveis e o abastecimento de água doce para reduzir o número de
pessoas que sofrem com a escassez.