A FATOS HISTÓRICOS ESCONDIDOS >> Campos de concentração no Ceará, no Nordeste do Brasil.
Na
tentativa de manter os ricos afastados dos sertanejos, que procuravam
amparo na cidade grande devido à seca, locais de aprisionamento dos
flagelados foram criados muito antes dos campos criados pelos nazistas
na Alemanha.
Em 1932, devido a seca, milhares de retirantes chegavam a Fortaleza na esperança de encontrar uma solução para escapar
da falta de chuva no sertão. Os jornais da época chamavam a atenção
para o clima alarmante com o desembarque dos flagelados. Era comum, na
época, notícias que relatavam o comportamento dos retirantes, como
invasões a trens e indícios de revoltas. Criou-se com isso a imagem de
homens e mulheres que poderiam se tornar ameaçadores. Entre as classes
dominantes de Fortaleza, surgiu o hábito de temer o grupo de pessoas.
As famílias ficavam espalhadas pelas
cidades do Interior, mas a partir de 1930 o rumo certo era Fortaleza.
As elites, então, começavam a conclamar na imprensa, tanto em Fortaleza,
como em Sobral e no Cariri, para a formação desses campos de
concentração.
Foram construídos, ao todo, sete
campos de concentração no Ceará, distribuídos em lugares estratégicos
para garantir o encurralamento de um maior número de retirantes, sendo
dois em Fortaleza e os outros em Ipu, Quixeramobim, Senador Pompeu, São
Mateus e Crato. De acordo com estatísticas oficiais, pouco mais de um
mês após a abertura dos campos, os espaços somavam 73.918 aprisionados.
Eles ficavam próximos a vias
férreas, porque os sertanejos se deslocavam de trem. Quando eles
desciam, eram encaminhados para os campos. Lá era um confinamento, eles
eram vigiados e não podiam sair sem autorização. Os que saíam, eram
considerados fugitivos e a ocorrência era registrada na delegacia. Havia
um grande número de pessoas confinadas em um espaço para duas mil, e aí
aconteceu o inevitável. Muitas doenças, epidemias e o número de mortes
diárias era grande. A alimentação, além de ser escassa, era ruim.
Entre abril de 1932 e março de 1933
foram registrados mais de 1.000 mortos somente no Campo de Concentração
de Ipu. Os homens tinham os cabelos raspados a zero. Os campos ainda
tinham banheiros, capela e casebres divididos em pavilhões para homens
solteiros, viúvas e famílias. Havia uma espécie de cadeia para os
retirantes desordeiros e oficinas (de olaria, carpintaria, alfaiataria
etc.) para não deixar os concentrados inativos, o que era, aliás, uma
preocupação das autoridades.
Outro aspecto significativo é o nome
com o qual o flagelado batizou os campos de concentração: curral do
governo. Na sua vivência do mundo rural, o sertanejo sabe que o gado
precisa ser encurralado para não fugir. Era uma prisão que tratava os
seres humanos como bichos.
Vários dos retirantes eram
'recrutados' dos campos também para as obras de emergência do governo e
até para lutar na revolução paulista de 1932. Atraídos pelas promessas
de trabalho, alimentação e assistência médica, os sertanejos eram
privados de sua liberdade, não podendo sair sem autorização dos
inspetores dos campos. Guardas constantemente vigiavam os movimentos dos
concentrados para evitar fugas.
Vale lembrar que a criação dos
campos contou com grande apoio da sociedade, como se pode perceber nos
artigos elogiosos dos jornais da época, afinal, os flagelados estariam
isolados e bem assistidos, o que na verdade não aconteceu.
No ano seguinte, com as primeiras
chuvas de 1933, a imprensa efetivou uma forte campanha para o fim dos
campos de concentrações. As poucas chuvas que começaram a cair no sertão
já forneciam uma certa segurança para os fechamentos das concentrações.
Pensava-se que a cidade não corria mais o risco de invasão.
Os campos duraram exatamente um ano,
feitos em março de 1932 e desfeitos entre março e abril de 1933 porque
começou a chover, então o governo distribuiu passagens e sementes para
os concentrados retornarem aos seus lugares de origem. Nas concentrações
de Fortaleza (nos bairros Otávio Bonfim e Arraial Moura Brasil), os
campos deram origem ao surgimento de favelas, como é o caso do Pirambu.
Esse episódio passou muito tempo
silenciado nos livros de História do Brasil, mas os descendentes dos que
sobreviveram a esses campos estão lutando para manter viva a memória do
caso, para que nunca mais se repita.
Tribuna do Cabugí
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