Carne Fraca põe em alerta fronteira agrícola por temor de queda dos preços de grãos
Com uma maior oferta de grãos -- matéria-prima das rações para aves, suínos e bovinos--, os preços da soja e do milho devem ser pressionados
A operação Carne 
Fraca da Polícia Federal deixou em alerta agricultores das principais 
áreas produtoras do Brasil, com expectativas de que o saldo exportável e
 os estoques de soja e milho do país possam aumentar com uma queda nos 
embarques de carnes devido a embargos internacionais aos produtos 
brasileiros. Com uma maior oferta de grãos -- matéria-prima das rações 
para aves, suínos e bovinos--, os preços da soja e do milho devem ser 
pressionados, potencialmente desestimulando investimentos e expansões de
 áreas plantadas em regiões como o Matopiba (Maranhão, Tocantins, Piauí e
 Bahia), no caso de os desdobramentos da operação da PF se prolongarem.
Regiões do Matopiba, onde os preços dos 
grãos são naturalmente mais baixos em função dos custos logísticos, 
estão entre aquelas com maior crescimento de área plantada, pela maior 
disponibilidade de terras --um ritmo de expansão que poderia ser 
colocado em xeque em um eventual cenário de preços mais baixos. "A 
agricultura vai sofrer também, os preços vão cair", disse à Reuters o 
superintendente de Desenvolvimento Econômico do governo do Estado de 
Tocantins, Vilmar Carneiro.
Na avaliação da autoridade, o Brasil vai
 demorar para recuperar sua condição exportadora anterior à operação 
Carne Fraca, uma vez que os processos de liberações de frigoríficos são 
morosos, com muitos importadores se aproveitando da situação de 
fragilidade do país. Tocantins, com pouco mais de 1 milhão de hectares 
destinados à soja e ao milho na safra atual, ampliou em quase 10 por 
cento o plantio da oleaginosa. Mas ainda teria 8 milhões de hectares de 
terras disponíveis, sendo considerado um dos Estados com maior 
disponibilidade de área, segundo dados do governo local.
Uma solução para os agricultores seria 
exportar os grãos que não forem utilizados pela indústria produtora de 
carnes do país, diante de uma esperada queda nas exportações de proteína
 animal, disse o superintendente de Desenvolvimento do Tocantins. "Vamos
 ter crescimento na forma de exportação de proteína vegetal", opinou 
ele, durante um evento no terminal ferroviário de Porto Nacional, da 
empresa de logística integrada VLI.
Até o momento neste ano as exportações 
de milho estão lentas, com produtores retraídos diante de um preço 
enfraquecido pela grande oferta esperada no Brasil e Argentina, além do 
câmbio atual, que reduz a competitividade do cereal brasileiro. "As 
exportações vão depender do mercado (preços) e câmbio. Dependendo de 
como for, vai ficar milho para o mercado interno, que paga um pouco 
melhor", afirmou à Reuters o coordenador de negócios da multinacional 
Cargill, Lucas Horst Maidana, no mesmo evento, realizado em parceria com
 o Rally da Safra, acompanhado pela Reuters nos Estados do Matopiba esta
 semana.
Segundo Maidana, se o produtor vendesse 
parte do milho para a exportação, ele valorizaria o produto que sobraria
 para o mercado interno. "Mas até o momento ele tem feito poucos 
negócios para exportação", comentou. As exportações de milho, que 
tradicionalmente ganham força no segundo semestre, poderiam crescer este
 ano para 26 milhões de toneladas, ante 18 milhões em 2016, segundo 
dados da Agroconsult, organizadora do Rally da Safra, com uma 
expectativa de safra recorde de 95 milhões de toneladas. Mas tais 
previsões foram feitas antes da eclosão da operação Carne Fraca.
Caso essas exportações não se confirmem,
 poderão elevar ainda mais os estoques de milho, já estimados pelo 
governo (Conab), ao final da temporada 2016/17, nos maiores volumes da 
história.
PRODUÇÃO PREOCUPADA
Enquanto esperam produtividade elevada 
na safra de milho este ano, alguns produtores têm o ânimo contido com a 
expectativa de preços menores do que no ano passado, quando a severa 
quebra de produção elevou fortemente as cotações. E mais recentemente 
estão ficando preocupados com os efeitos da Carne Fraca. O agricultor 
Sérgio Luis Bortolozzo Jr., da Canel, que planta em uma das melhores 
áreas de Uruçuí (PI), afirmou que muitas das consequências da operação 
Carne Fraca ainda são incertas. Mas ele vê como preocupante os efeitos 
para os preços.
"Se diminuirmos o consumo de carne, como
 vai consumir mais (milho), uma vez que 100 por cento do grão é para 
alimentação animal?", questionou Bortolozzo Jr., gerente de manejo da 
Canel, uma empresa de propriedade familiar que se instalou no Piauí em 
1988. Bortolozzo diz que a Canel, que planta cerca de 15 mil hectares, 
entre soja, milho e algodão, ainda poderia expandir a área agrícola em 
mais 5 mil hectares. "Mas não vamos abrir (na próxima safra)", afirmou 
ele, lembrando que o mercado não está favorável.
Nas áreas visitadas pela Reuters esta 
semana nas principais regiões produtoras do Tocantins, Bahia, Maranhão e
 Piauí, as produtividades devem ser elevadas, beneficiadas pelas chuvas,
 mas o agricultor não vê muito para comemorar. "Vai produzir bem mais, 
mas a questão é o preço, que vai ser ridículo", disse Bortolozzo Jr. 
Alguns produtores da região do Matopiba temem que o preço do milho possa
 cair para cerca de 20 reais a saca, quando entrar a segunda safra em 
mais alguns poucos meses. Esse valor seria menos da metade que os 
agricultores receberam na temporada passada, quando as cotações foram 
infladas pela severa quebra.
 
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