sexta-feira, 28 de agosto de 2015

Brasil já utiliza técnicas para tornar a água salgada em água potável-Artigo


Na última reportagem da série ‘Água – Planeta em Crise’, o repórter Tonico Ferreira mostra como a agricultura está sobrevivendo à falta de água e como técnicas para tornar a água salgada em água potável já estão sendo utilizadas no Brasil.

Para produzir quase tudo o que consumimos usamos grande quantidade de água, não tanto a água que sai da torneira, mas a água invisível, virtual, aquela que foi gasta, em quantidade impressionante, na produção de um bem ou de serviço.

Por exemplo, para produzir apenas uma banana são gastos 160 litros de água. Um ovo, 200 litros. Uma pizza (marguerita), 1.260 litros. Um litro de etanol (de cana de açúcar), 2.100 litros. Uma camisa de algodão, 2.500 litros e um único quilo de carne, 15.400 litros.

É por isso que de toda a água consumida no mundo, 70% vai para a agricultura. A indústria fica com 20% e, no uso doméstico, gastamos apenas 10%. Se as cidades sofrem com a seca, o que não dizer do campo?

Uma fazenda em Quixeré, CE, hoje pode-se dizer que virou fazenda fantasma. Dois anos atrás era uma empresa agrícola modelo na produção de frutas, mas tudo foi desativado por falta de água e o que hoje é um campo tomado por mato, já foi uma grande plantação de melões. As mangueiras de irrigação abandonadas ainda estão no local e o que sobrou do sistema de canalização de água e da plantação de bananeiras representa um prejuízo irrecuperável.

Califórnia – Na Califórnia, nos Estados Unidos, que entrou no quarto ano seguido de seca, o corte de água para irrigação é o maior da história do estado.

A Califórnia tem 78 mil fazendas e é o maior celeiro de alimentos dos Estados Unidos. Neste ano, metade das fazendas irrigadas vai receber só 20% ou menos do suprimento normal de água que vem pelos canais.

O sistema de barragens e transposição de águas construído nos últimos 100 anos, que conta com um aqueduto com mais de 700 km, entrou em colapso. A neve acumulada nas serras, que ao derreter contribui com 1/3 do abastecimento de água do estado, baixou neste ano para apenas 5% do volume histórico.

Felícia Marcus, do Conselho de Recursos Hídricos do estado, diz que a saída agora é economizar, reusar, capturar água de chuva e dessalinizar água do mar. Felícia reconhece que a situação é desesperadora e diz que as obras grandiosas de engenharia deram uma falsa segurança hídrica aos californianos. “O nosso sucesso em ser capaz de levar água com segurança através de longas distâncias é agora nosso ‘calcanhar de Aquiles’ na tentativa de como convencer as pessoas a intensificar a economia de água durante a seca”, diz.

Austrália – A Austrália acaba de sair de uma seca que durou 10 anos e conseguiu preservar sua posição de grande exportadora de produtos agrícolas.

Os fazendeiros passaram a usar plantas geneticamente modificadas, irrigar com mais controle e aperfeiçoaram o sistema de recolhimento de água de chuva de cada gota que cai. Os fazendeiros têm direito a retirar uma determinada quantidade de água da natureza e essa água pode ser comercializada. Quem tem sobrando vende para quem precisa.

No auge da crise, Margot vendeu parte da água a que tinha direito para o próprio governo, que queria ajudar os rios que estavam secando. “Agora nós somos muito mais eficientes e o governo tem muito mais água para cuidar dos pântanos e dos rios. Isso foi uma bela troca”, explica a fazendeira Margot Henty.

Mesmo assim, Margot paga cada litro de água que usa. A entrada é controlada pelo governo via rádio e é cara: cerca de R$ 160 mil por ano.

Brasil – No Brasil, a cobrança pela retirada de água dos rios está apenas começando. É efetiva em algumas bacias de rios do Nordeste e do Sudeste.

Nas bacias em São Paulo, dos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí, onde a cobrança é pioneira, a água custa R$ 0,01 por metro cúbico captado, R$ 0,02 quando não volta para a natureza e outros R$ 0,10 por quilo de poluição jogado no rio.

“Através da cobrança nós caracterizamos a água como um bem de valor econômico e finito. E, através da cobrança, ou seja, de um controle pelo bolso, nós reduzimos os consumos”, conta Francisco Lahoz, secretário-executivo do Consórcio PCJ.

O Ceará é o estado que melhor cobra: arrecadou R$ 77 milhões no ano passado. Para enfrentar os períodos de seca, o estado fez obras de engenharia importantes, por exemplo, enquanto embaixo passa o canal do trabalhador, por uma ponte acima passa o Eixão das Águas. São duas obras construídas para alcançar um objetivo que é fundamental: interligar o sistema de abastecimento de água do estado.

Os projetos começaram em 1993, com a criação da companhia que gerencia os recursos hídricos do Ceará e tiveram continuidade independentemente das mudanças de governo, o que é raro no Brasil.

Dessalinização – Além de usar melhor os recursos de água existentes, está na hora do Brasil olhar para a dessalinização.

“Não é uma solução de curto prazo, mas eu acho que é uma solução que tem que ter, o botão está disponível para ser apertado, usando um termo mais fácil de entender, quando você tiver uma necessidade urgente porque é um processo que demora para ser concebido, para ser implementado”, explica Newton Azevedo, representante do Brasil no Conselho Mundial da Água.

No Nordeste brasileiro até existem cerca de 3,5 mil pequenas unidades de dessalinização em poços de água salobra, mas como não há manutenção preventiva, pelo menos 60% delas estão paradas por falta de filtro, bombas quebradas e equipamentos entupidos.

Cingapura – Cingapura tem duas enormes usinas de dessalinização que atendem até 25% da demanda de água da ilha. É uma parceria do governo com uma empresa privada. “Para dar certo, é preciso ter eficiência energética, manutenção, empréstimos de longo prazo e garantia de compra da água pelo governo”, diz Winnifred Heap, vice-presidente executiva da Hyflux.

Governo ativo, parcerias com a iniciativa privada, controle do uso e do preço de um lado, de outro, o uso consciente, a despoluição, o reuso e a dessalinização. Tudo isso já está sendo feito junto ou separado em algum lugar deste planeta.

O tempo de água farta acabou e não há como escapar. O destino da nossa espécie no planeta depende agora da nossa capacidade de proteger essa fonte da vida, que é a água. 
 
(Fonte: G1)

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