Manejo integrado de pragas reduz aplicações de defensivos em quase 50%
Na
safra 2013-2014, o Brasil utilizou aproximadamente 140 milhões de
litros de inseticidas ao custo de cerca de US$ 2,5 bilhões para o
controle de pragas apenas da soja. Pesquisas da Embrapa mostram que
poderíamos gastar muito menos com a adoção do Manejo Integrado de Pragas
da Soja (MIP-Soja). Testes realizados em propriedades particulares
mostram que reduzir o uso de agroquímicos pode não apenas diminuir o
impacto no ambiente como aumentar a eficiência do controle de pragas e
aumentar a renda do produtor.
Os
benefícios da tecnologia foram demonstrados em áreas experimentais
mantidas pela parceria Embrapa Soja (PR) e Instituto Emater-PR. As duas
instituições instalaram, na safra 2013/2014, cerca de 50 unidades de
referência em propriedades do norte e do oeste do Paraná para avaliar a
eficiência do MIP. Nessas áreas, com tamanhos entre quatro e 270
hectares, as pulverizações foram reduzidas de cinco (média do estado)
para 2,6 aplicações,. "Os resultados mostram ser possível diminuir o uso
de agroquímicos no controle de pragas da soja, o que propicia melhorias
na renda do produtor, e minimizar o impacto ao ambiente", diz o
extensionista da Emater Nelson Harger. O sucesso dos testes fez com que,
na safra 2014/2015, fossem instaladas mais de 220 unidades de
referência em todas as regiões sojícolas do Paraná.
Outro resultado obtido nas unidades de referência foi o baixo custo
para a realização do controle de pragas e a estabilidade na
produtividade. Considerando o custo de utilização de inseticida por
hectare (R$ 54,10) e o serviço de pulverização (R$ 24,79), o custo total
para o manejo de pragas com a prática do MIP foi de R$144,57, contra R$
302,06 em áreas que fizeram o manejo convencional. "Isso significa que
nas áreas de MIP, o investimento foi reduzido pela metade", comemora o
pesquisador Osmar Conte, da Embrapa Soja. Segundo ele, a produtividade
entre as duas áreas foi bastante similar, com pequena vantagem produtiva
nas áreas em que se praticou o MIP.
O Manejo
Integrado de Pragas é uma tecnologia que busca manter o ecossistema da
soja o mais próximo possível do equilíbrio. Esse manejo colabora com a
sustentabilidade da lavoura e a preservação do meio ambiente a longo
prazo, evitando o uso abusivo de inseticidas. O MIP promove o controle
racional das pragas, por meio da associação de diferentes táticas, como
uso de cultivares mais resistentes às pragas, controle biológico,
prioridade a agrotóxicos mais seletivos aos insetos benéficos e mais
seguros ao homem e ao meio ambiente. Ocorre, principalmente, o uso
racional dos químicos.
Média de Aplicações | Custo total (R$/ha) | Produtividade (SAC/ha) | |
MIP | 2,60 | 144,57 | 50,07 |
Manejo Convencional | 4,99 | 302,06 | 48,67 |
Fonte: Embrapa/ Emater-PR
Preços médios: saca de soja: R$ 60,00
Serviços de pulverização/ha: R$ 24,79
Valor de inseticida/ha: R$ 54,10
Também foi observado nas unidades que adotaram o MIP um prolongamento
no tempo decorrido do plantio até a primeira aplicação de inseticidas.
Nas áreas em que se praticou o MIP, os produtores fizeram a primeira
aplicação depois de 50 dias de semeadura da soja, enquanto a média
paranaense foi de 25 dias para a primeira aplicação. "É muito importante
conseguir retardar a primeira aplicação, pelo fato de ela manter por
mais tempo o equilíbrio entre as populações de insetos benéficos e
insetos-praga, resultando em menor número de intervenções," diz Conte.
A ampliação para 220 unidades de referência em todas as regiões
sojícolas do Paraná é considerada positiva porque significa que "as
informações geradas pela pesquisa atingem cada vez mais produtores",
explica o técnico da Emater Fernando Teixeira de Oliveira. "Essas
unidades de referência são uma grande vitrine onde conseguimos fazer com
que a informação técnica, de fato, chegue ao campo", diz. "Mais que
isso, é o momento de confrontação entre a realidade do agricultor e o
universo da pesquisa científica", avalia. É a oportunidade de demonstrar
o quanto e como a pesquisa científica pode ajudar o agricultor a
produzir cada vez mais e melhor.
MIP na prática
O entomologista Samuel Roggia, da Embrapa Soja, explica que o MIP-Soja
começa com o monitoramento semanal da lavoura, por meio da utilização de
um pano de batida que consegue indicar o número e o tamanho das pragas
presentes na lavoura. O monitoramento também mostra o nível de ataque já
ocasionado pelas pragas como o desfolhamento e a quantidade de plantas
atacadas, por exemplo. "A aplicação de agrotóxicos só é recomendada
quando o número de pragas detectadas na lavoura ultrapassa o nível de
ação já estabelecido pela pesquisa. Caso contrário não há necessidade de
fazer o controle", enfatiza. O nível de ação corresponde ao nível
populacional ou nível de dano que a planta de soja suporta, sem perdas
de produtividade da lavoura.
Quando a
pulverização é necessária, dados científicos comprovam a eficiência dos
inseticidas seletivos (biológicos ou grupos químicos - reguladores de
crescimento e diamidas). "Esses produtos têm alta eficiência de controle
das pragas-alvo e, ao mesmo tempo, apresentam baixo impacto sobre os
agentes de controle biológico presentes na lavoura", diz Roggia.
Entre os inseticidas biológicos disponíveis no mercado estão aqueles
que agem provocando uma doença nos insetos (entomopatógenos): os
baculovírus e o Bacillus thuringiensis (Bt). Também há estudos
da Embrapa para a utilização de parasitoides no controle de ovos de
lagartas e percevejos. Os produtos biológicos têm eficiência comprovada
pela pesquisa, mas precisam de cuidados especiais para utilização.
O que parece simples nem sempre é adotado no campo. Em muitas lavouras
brasileiras, os inseticidas são usados sem que seja considerada a
presença efetiva das pragas ou o nível de dano que elas causam. Isso
ocorre em função da utilização de um calendário de aplicação de produtos
químicos onde os inseticidas são usados junto com outros produtos.
"Procedendo dessa maneira, o agricultor tende a realizar aplicações de
inseticidas muito antes do momento adequado e gastar mais inseticidas do
que o necessário. O maior número de aplicações tem por consequência o
aumento do custo de produção, eliminação de agentes de controle
biológico e aumento do risco de desenvolvimento de pragas resistentes",
ressalta Roggia.
Experiência que vem do campo
O produtor rural Daniel Rosenthal cultiva soja, milho e trigo em uma
propriedade de 270 hectares em Rolândia, no norte do Paraná, e reconhece
a importância da agricultura sustentável. Entre as ações que ele adota
para garantir menor custo de produção e preservação dos inimigos
naturais está o MIP. "Acho muito importante a vistoria, porque tomo a
decisão de aplicar ou não o inseticida a partir desse monitoramento",
defende.
Segundo Rosenthal, ao utilizar
produtos químicos somente quando realmente necessário se consegue
reduzir custos de produção e ainda preservar os inimigos naturais.
"Temos que ser criteriosos na utilização de inseticidas, caso contrário,
poderemos favorecer a resistência de pragas e doenças aos agrotóxicos",
ressalta. Há dois anos, Rosenthal decidiu fazer também o manejo das
doenças, o que já traz resultados positivos.
Manejo de percevejos e de lagartas
Das pragas que atacam a soja, os percevejos sugadores de vagens e grãos
têm uma importância cada vez maior. De acordo com Roggia, a ocorrência
de elevadas densidades populacionais de percevejos, a resistência dessa
praga a inseticidas, o reduzido número de grupos químicos disponíveis no
mercado, as falhas de controle e o desequilíbrio ambiental são fatores
que potencializam o ataque desses insetos.
Apesar de existirem várias marcas comerciais de inseticidas para
controle de percevejos, é reduzido o número de grupos químicos
disponíveis para o controle da praga, o que dificulta a rotação de
produtos para evitar que os insetos se tornem resistentes. "Por isso, o
uso racional de inseticidas, como estratégia de manejo de resistência,
tornou-se uma necessidade e uma exigência crescente para a produção
brasileira de soja", destaca Roggia.
Com
relação ao controle de algumas lagartas, atualmente há a opção no
mercado de cultivares de soja Bt, portadoras de genes da bactéria Bacillus thuringiensis
(Bt) que produzem toxinas que controlam insetos. "Essa é uma estratégia
que, se bem utilizada, pode reduzir a utilização de inseticidas e
contribuir para a preservação de agentes de controle biológico", indica o
pesquisador.
No entanto, ao mesmo tempo em
que as lagartas são controladas, também pode haver, a longo prazo, a
seleção de insetos resistentes. Entre as diversas medidas para reduzir a
seleção de indivíduos resistentes e de preservação dessa tecnologia, é
recomendado o cultivo de área de refúgio. O refúgio é o cultivo de uma
percentagem da área (no mesmo talhão) com soja não Bt. O objetivo é
manter a população de insetos suscetíveis à toxina para que haja o
acasalamento com os indivíduos potencialmente resistentes − provenientes
das áreas com plantas Bt − retardando, assim, a seleção de insetos
resistentes à tecnologia.
MIP tem história
O MIP-Soja vem sendo aperfeiçoado desde a década de 1970 por diversas
instituições e obteve grande sucesso na redução do uso abusivo de
defensivos. No início da década de 1980, por exemplo, foi possível
reduzir o número médio de aplicações por safra para o controle de pragas
de mais de cinco para menos de duas no Estado do Paraná.
Porém, em anos recentes, houve uma redução substancial na adoção do
MIP-Soja. Em consequência, o número de aplicações voltou a atingir uma
média de quatro a seis aplicações por safra. Associado a este aumento do
número de aplicações, Roggia diz que tem ocorrido surtos de diversas
espécies de pragas secundárias, que até recentemente não apresentavam
importância econômica como: a lagarta-falsa-medideira (Chrysodeixis includens), lagartas das vagens (Spodoptera spp.), ácaros e Helicoverpa.
Também se elevou a resistência de pragas a inseticidas, como é o caso
dos percevejos. "Para obter resultados mais efetivos, é fundamental
tanto o manejo das culturas que antecedem a soja quanto as que a
sucedem, considerando também o seu entorno", diz.
Caravana Embrapa faz treinamento em MIP
A primeira fase da Caravana Embrapa, iniciada em 2013, percorreu 18
estados e regiões produtoras, mobilizando mais de seis mil técnicos de
extensão rural, cooperativas, associações de produtores. Nessa primeira
fase, a abordagem estava diretamente relacionada com a presença da
lagarta Helicoverpa armigera e o desequilíbrio provocado nos mais diversos sistemas de produção do País.
A segunda fase da Caravana Embrapa foi lançada em dezembro de 2014, em
Passo Fundo (RS). Em 2015, o primeiro treinamento reuniu aproximadamente
150 profissionais da assistência técnica do Paraná. O objetivo da
Caravana é percorrer nove polos de produção de grãos e fibras do País,
para monitorar de perto o impacto das pragas no resultado da safra
2014-2015. Os nove polos escolhidos para participar da segunda fase da
Caravana Embrapa são: Amapá, Roraima e centro-norte do Pará; Tocantins e
o sul do Pará; sudoeste da Bahia; Alagoas e Sergipe; Mato Grosso; Mato
Grosso do Sul; Minas Gerais; São Paulo e Paraná; e Rio Grande do Sul e
Santa Catarina.
A estratégia passa pela
capacitação de representantes da assistência técnica e extensão rural em
dois focos: a identificação correta de pragas e de inimigos naturais,
técnicas de monitoramento e níveis de controle. "O objetivo da Caravana é
dar segurança aos técnicos e produtores na tomada de decisão sobre
quais táticas de controle eles deverão utilizar para reduzir a população
de insetos-praga abaixo do nível de dano econômico", afirma Sergio
Abud, um dos coordenadores da ação da Embrapa. "Com a utilização do MIP é
possível restabelecer o equilíbrio agroecológico e dar maior
sustentabilidade para o agronegócio".
Lebna Landgraf (MTb 2903 PR)
Embrapa Soja
Embrapa Soja
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