Saúde Animal
Brasil inicia operação conjunta para erradicar aftosa na Venezuela
Vacina foi aplicada no rebanho de uma comunidade indígena venezuelana, na região de fronteira com o estado de Roraima
Às 9 horas da
manhã de sexta-feira, 9 de novembro, o negro Deivis González, capataz do
sítio Las Mujeres, na comunidade indígena de Acurimã, município de Gran
Sabana, aguardava a comitiva de brasileiros e venezuelanos. O rebanho
de 18 cabeças estava pronto no curral – 2 touros, 7 vacas, 4 bezerros
machos e 5 fêmeas.
A equipe de veterinários brasileiros
adiantou-se em fazer logo a vacinação, com o apoio do venezuelano José
Gregório, auxiliar de campo. Mais três sítios estavam agendados para
vacinar nesta manhã. O trabalho precisava ser executado com precisão e
rapidez, e assim diminuir o stress dos animais que ficariam no curral o
menor tempo possível.
Marcondes preparou as agulhas com as doses
de 5 ml das vacinas armazenadas em caixas de gelo na caçamba da
pick-up. Allan, Ernani e Nilton ajustaram as cordas, orientaram
Gregório, González e os meninos do sítio na tarefa de ajudá-los a
prender as reses.
Vacinar no laço é perigoso. Uma vez
laçada, a rês precisa ser contida com firmeza por um ou mais auxiliares.
O aplicador da vacina espera o momento certo, aproxima-se a uma
distância segura, estica o braço armado com a pistola, injeta a vacina.
Ele tem que ser ágil para escapar da imprevisível reação do animal.
O veterinário Elvio Cazola, chefe da
comitiva brasileira, revezou-se com Marcondes na vacinação do pequeno
rebanho. Quinze minutos depois, missão cumprida.
O capataz sorria, os meninos sorriam ao
abrir a porteira para soltar a boiada no pasto. Os veterinários
brasileiros se apressavam em recolher o material, conferir as anotações
dos formulários de vacinação e seguir viagem, preocupados em concluir a
agenda de visitas no prazo.
A pedido da agrônoma Ismalianeth Acuña,
chefe da comitiva venezuelana, os brasileiros retardaram a viagem alguns
minutos para o registro histórico: a foto da operação binacional de
erradicação da febre aftosa na Venezuela, o único país das Américas que
ainda não é reconhecido livre da doença, em todo o seu território, pela
Organização Mundial de Saúde Animal (OIE).
Os olhos de Ismalianeth brilhavam: “Emocionante!”
Estratégia e Segurança
Guilherme Marques, diretor do Departamento
de Saúde Animal do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento
(MAPA) e delegado do Brasil na OIE, disse que a operação conjunta na
Venezuela interessa a toda a América do Sul, em especial ao Brasil.
“Não é simplesmente uma questão humanitária, mas de estratégia e segurança. Existe um plano hemisférico de combate à doença.”
A Colômbia é outro país da Região Andina
em luta contra a aftosa. O status colombiano de zona livre da doença foi
alterado pela OIE em 17 de setembro de 2018, após as confirmações
oficiais de focos no interior do país e na fronteira oeste com a
Venezuela.
A atuação conjunta está prevista na
Resolução número 1 da Comissão Sul Americana da Luta contra a Febre
Aftosa (Cosalfa), de abril de 2018, que reconheceu a “necessidade
premente dos 13 países membros apoiarem a Venezuela”, sob a coordenação
do Centro Panamericano de Febre Aftosa (Panaftosa).
O plano de erradicação na Venezuela prevê
três vacinações anuais para imunização do rebanho estimado em 15 milhões
e 450 mil cabeças, segundo dados da Cosalfa-OIE de 2017: duas
vacinações de todos os animais, de mamando a caducando, e uma vacinação
somente de animais jovens.
Todo o Brasil foi reconhecido livre com
vacinação pela OIE em maio de 2018. A exceção é Santa Catarina, livre de
aftosa sem vacinação desde 2007. Atualmente, as principais ameaças à
saúde do rebanho bovino brasileiro – o maior do mundo, com 219 milhões
de cabeças – estão ao sul da Venezuela, na fronteira seca da Região
Norte do Brasil, em Roraima, no município de Pacaraima.
Quando o Brasil encaminhou à OIE, em
setembro de 2017, o pleito de reconhecimento de livre de febre aftosa
com vacinação, apresentou a proposta de criação da zona de proteção em
Pacaraima. Em 8 de outubro de 2018, a Instrução Normativa 52 do
Ministério da Agricultura instituiu a zona de proteção na área de 180
quilômetros quadrados.
Ao longo da linha de fronteira de 33
quilômetros, Pacaraima faz divisa com Gran Sabana, o maior município de
Bolívar, que é o maior estado da Venezuela: 240.528 quilômetros
quadrados, 26% da área total do país.
"Nessa zona de proteção”, explica Guilherme Marques, “estabelecemos medidas de controle mais severas. As ações são mais fortes, mais incisivas do que no restante do estado de Roraima”.
"Nessa zona de proteção”, explica Guilherme Marques, “estabelecemos medidas de controle mais severas. As ações são mais fortes, mais incisivas do que no restante do estado de Roraima”.
A vacinação de todos os bovinos em
Pacaraima é feita pelo Serviço Veterinário Oficial (SVO), na ação
chamada de agulha oficial. O SVO nessa área é representado pelos
veterinários e auxiliares de campo da Superintendência Federal de
Agricultura de Roraima (SFA-Roraima) e da Agência de Defesa Agropecuária
de Roraima (ADERR).
Os animais são identificados individualmente com brincos numerados e os embarques acompanhados pelo SVO em caminhões lacrados.
Os animais são identificados individualmente com brincos numerados e os embarques acompanhados pelo SVO em caminhões lacrados.
O diretor do Ministério da Agricultura
prevê um longo período de existência da zona de proteção que será
mantida enquanto Venezuela e Colômbia avançam na erradicação e controle
da doença. Segundo Guilherme Marques, a estimativa para alteração
significativa do cenário epidemiológico na Região Andina é de dois a
quatro anos.
“Estamos contribuindo para que a Venezuela
alcance a condição de livre da aftosa. Até chegarmos lá precisamos da
zona de proteção como uma medida adicional a todo o trabalho que já é
realizado nessa região de fronteira”.
Operação Pacaraima
A parceria Brasil-Venezuela começou a ser
construída em Pirenópolis, Goiás, em abril de 2017, quando as
autoridades veterinárias dos dois países decidiram pela vacinação com
agulha oficial dos rebanhos bovinos e bubalinos no raio de 15 km,
traçado de ambos os lados, em paralelo à linha de fronteira.
Em setembro de 2018, brasileiros e
venezuelanos reuniram-se novamente em Pacaraima e firmaram o compromisso
de realizar a ação conjunta em todo o território da Venezuela.
O setor privado brasileiro doou 21 milhões
de doses de vacinas, que estão sendo administradas pelo Brasil e
Venezuela, sob a custódia e coordenação do Panaftosa.
Na linha de frente da Operação Pacaraima
atuam 8 médicos veterinários, sob a orientação, desde Brasília, do
coordenador de Animais Terrestres, Plínio Leite Lopes, e do chefe da
Divisão de Aftosa, Diego Viali dos Santos.
Na primeira semana de novembro, cinco
veterinários designados pelo Departamento de Saúde Animal do MAPA
desembarcaram em Boa Vista, capital de Roraima, para executar a etapa
inicial do plano de vacinação.
Os experientes veterinários Elvio Cazola,
da SFA de Mato Grosso do Sul, e Roberto Carlos Arruda, da SFA do
Maranhão, planejam e coordenam a realização das tarefas. Tudo é feito em
parceria e de acordo com a equipe do Instituto Nacional de Saúde Animal
Integral (INSAI), liderada pela agrônoma Ismalianeth Acuña,
coordenadora regional para o estado de Bolívar.
Cazola e Arruda organizaram a logística,
negociaram com os militares, autoridades civis e lideranças indígenas o
trabalho de campo de quatro grupos de veterinários. O esforço foi
premiado com o fornecimento de gelo gratuito para refrigerar as vacinas,
presente de um comerciante de Santa Elena de Uairen, a cidade
venezuelana mais próxima da fronteira brasileira.
Cada grupo terá uma pick up Chevrolet S10
ou Mitsubishi Triton, com as placas anotadas pelo Exército e permissão
de trânsito livre; poderá transportar toneis de óleo diesel nas caçambas
com autorização especial, pois há racionamento na Venezuela; e deverá
colar no párabrisa a frase: “A Servicio del INSAI”. Para circular com
mais facilidade pelas aldeias do município de Gran Sabana, o cacique e
capitão-geral Juan González determinou que os veterinários contarão com a
ajuda de guias indígenas.
A missão é vacinar, a partir da fronteira
do Brasil para o interior da Venezuela, todo o gado em Gran Sabana (560
cabeças, estimativa não-oficial) e no munícipio vizinho de Sifontes
(6.700 cabeças, não-oficial), fazer as inspeções clínicas, registrar os
rebanhos e as propriedades. As vacinações são precedidas de agendamento
autorizado pelo proprietário ou responsável da propriedade.
A equipe está baseada em Pacaraima, mas
conta com o apoio de mais dois veterinários sediados em Boa Vista:
Terezinha Brandão, chefe de Saúde Animal da SFA-Roraima e Marcos Duarte,
da ADERR, responsável em Roraima pelo Plano Nacional de Erradicação da
Febre Aftosa (PNEFA).
Cazola e Arruda farão o trabalho de
sorologia, controlando a remessa para o Laboratório Nacional
Agropecuário -Lanagro de Pedro Leopoldo, em Minas Gerais, as eventuais
amostras de animais com sintomas de febre aftosa coletadas nas
propriedades venezuelanas.
No último domingo, 11 de novembro,
chegaram à fronteira três venezuelanos para completar as equipes com os
veterinários brasileiros: Maria Velasquez, veterinária; Sérgio Ruiz e
Kenny Parra, auxiliares de campo. Eles começam a trabalhar nesta
segunda-feira, 12.
O veterinário Marcondes Dias Tavares,
lotado na ADERR, já trabalhava na zona de proteção de Pacaraima desde 6
de novembro, terça-feira, acompanhado de José Gregório, auxiliar de
campo venezuelano. O trabalho de Marcondes foi reforçado pelos
veterinários Allan Cristian Mesacasa e Ernani Machado de Lima – cedidos
pelo Instituto de Defesa Agropecuária de Mato Grosso (Indea-MT) – e
Nilton Mesquita Júnior, cedido pela Associação dos Criadores de Mato
Grosso (Acrimat).
O gaúcho Elvio Cazola orgulha-se do
trabalho realizado pelos veterinários brasileiros em apenas quatro dias.
“Os guris arregaçaram”, disse Cazola. “Eles vacinaram 357 animais nas
comunidades indígenas de Gran Sabana. E para os próximos três dias, de
segunda, 12, a quarta-feira, 14, já estão agendadas as vacinações em
mais 9 propriedades.”
Nota do Blog: O Brasil tem que se preocupar com a vacinação do rebanho nas áreas de fronteira. Não adianta vacinar os nossos animais aqui no pais e deixar o transito livre dos rebanhos pelas fronteiras. Excelente ideia do governo de proceder desta forma.
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