CONTOS DO SERTÃO
O CORNO QUE TROCOU A MULHER POR UM RÁDIO
Radio Semp Pt 76 (1940) – o par de chifre é acessório opcional
- Seu Joaquim, a tua muié ta te butando chifre! Te alui, fidumaégua!
- Conversa é essa, macho! A minha Dasdô é muié dereita, trabaiadora. Essa hora ela tá lá em casa fazendo tricô, tadinha.
- Tá fazendo tricô, mas é com os zóvos do teu vizinho, o Zégeraldo!
- Aí dento! O Zégeraldo é meu cumpade. Caba bom e é meu amigo de muito anos!
- Deixa de ser abestado e vai lá pegar os dois se abufelando! Corno féladaputa!
O seu Joaquim trabalhava no
mercado consertando todo tipo de eletrodoméstico. Mas ele gostava mesmo
era de ajeitar rádio. Entendia era de tudo. Era formado por
correspondência pelo Instituto Rádio Técnico Monitor, quando ainda era
um menino de calças curtas. Tinha uma enorme coleção de rádios antigos:
Blaupunkt, Wsw Barítono, Emerson, Frahm PL-500, Zenith, entre outros,
sua verdadeira paixão.
O povo falava que logo que ele
saía de casa, a mulher dele caía nos braços do fogoso Zégeraldo, o
vizinho e compadre do seu Joaquim. O povo falava, falava e falava, mas o
seu Joaquim não dava ouvido ao falatório. Continuava ali na sua humilde
banquinha no mercado.
- Seu Joaquim, deixa de ser corno! Avemaria do véi corno!
O seu Joaquim olhava por cima
dos óculos e sorria. Não tava nem aí para o que os fofoqueiros diziam a
respeito da dona Maria das Dores. Aliás, ele botava a mão no fogo por
ela.
- Esse é o famoso “corno-churrasco”!
Todo dia era a mesma ladainha. O
povo avisava que a mulher dele tava metendo chifre nele, mas seu
Joaquim não acreditava nem a pau.
- No dia que me trouxerem uma foto, eu acredito.
Aí trouxeram a dita foto. Êita,
mas que foi um desmantelo da peste, foi. Quem conheceu o seu Joaquim ali
na banquinha no mercado, branquinho, baixinho, caladinho, humilde e
tímido, ficou até com medo. O chifrudo quando viu a foto da mulher dele
abufelada com o Zégeraldo, se transformou. Ficou vermelho como um
pimentão e se armou de um facão Canindé, cuja lâmina é tão afiada que
corta até a alma do infeliz. Partiu pra casa dele feito um raio,
soltando fumaça, mais suado do que tampa de cuscuzeira.
- Hoje vai ter morte! – o povo gritava atrás dele.
O seu Joaquim entrou porta
adentro e flagrou os dois amantes enganchados em cima da cama. O
compadre Zégeraldo quando viu o facão Canindé com a lâmina tinindo, deu
um pulo pra trás, choramingando.
- Num me mate não, cumpade Joaquim! Num me mate não, meu cumpade! Pelamordedeus!
A mulher, enrolada no lençol, se
tremia que nem vara verde. Os zói arregalados, mais parecendo um
caburé. Não tinha explicação para aquela cena. O cheiro de chifre
queimado infestou o quarto. O seu Joaquim de repente parou. Soltou o
facão no chão. Os amantes se entreolharam assustados. Em cima da mesa
tinha um rádio Philco TRANSGLOBE nove faixas, ano 1973, o conhecido
B-481, uma relíquia para colecionadores.
Seu Joaquim não se fez de
rogado. Botou o rádio debaixo do braço, olhou com calma e
desdenhosamente para o seu compadre Zégeraldo, que estava completamente
nu, de pau mole, encostado na parede, olhando sem nada entender o que
estava acontecendo.
- Cumpade Zé, pode ficar com essa muié. Agora, esse rádio, eu vou levar.
Até hoje não se sabe o que
aconteceu depois. O fato é que, no dia seguinte, o seu Joaquim voltou a
trabalhar normalmente em sua banquinha no mercado, ajeitando rádios,
como se nada tivesse acontecido. Também não se sabe o que aconteceu com o
compadre Zégeraldo e nem com a dona Maria das Dores.
A única coisa que se sabe é que o rádio está funcionando perfeitamente.
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