BRASÍLIA (Reuters) -
Depois de finalmente virar a página em relação aos casos de espionagem
que prejudicaram as tentativas de estreitar os laços comerciais, Brasil e
Estados Unidos podem estar rumando para mais um desentendimento, dessa
vez por causa dos subsídios dos EUA à agricultura.
O governo brasileiro está
reunindo evidências para mostrar que os Estados Unidos estão aumentando
os subsídios destinados a produtores de soja e milho, o que ameaça
levar a uma redução ainda maior dos preços de produtos que são cruciais
para o Brasil, afetando ainda mais uma economia já em dificuldades,
disseram quatro autoridades brasileiras à Reuters.
Embora seja muito cedo
para se engajar em uma ampla disputa comercial, o Brasil planeja
pressionar Washington ao questionar os programas agrícolas
norte-americanos na comissão de agricultura da Organização Mundial do
Comércio, segundo as autoridades.
As preocupações do Brasil
em relação aos subsídios dos EUA se intensificam no momento em que a
presidente Dilma Rousseff prepara sua visita a Washington, a ser
realizada em junho. Um dos principais objetivos da viagem é impulsionar
as trocas comerciais entre as duas maiores economias das Américas.
Foram necessárias
intensas negociações por mais de um ano para Dilma remarcar a visita,
que estava prevista para ocorrer originalmente em 2013, mas acabou
adiada após ser revelado que Washington havia espionado as comunicações
da presidente.
Embora Dilma não pretenda
mencionar os subsídios agrícolas diretamente ao presidente dos EUA,
Barack Obama, seus assessores planejam levantar a questão em reuniões
com representantes norte-americanos antes da visita, disse uma das
autoridades brasileiras, que falaram sob condição de anonimato.
"Temos certeza que os
subsídios dos EUA vão aumentar, mas precisamos reunir provas durante a
próxima safra para montar nosso caso", disse uma outra autoridade
envolvida na elaboração de políticas comerciais. "Não descartamos uma
disputa comercial, mas estamos nos primeiros estágios."
O governo dos EUA afirma
que seus programas destinados à agricultura são transparentes e justos, e
não distorcem os mercados de commodities.
"Os novos programas da
lei de cultivo têm mínimo efeito sobre a produção e o comércio, e, sendo
assim, estamos confiantes de que os programas atendem a nossos
compromissos junto à OMC", disse o porta-voz do Departamento de
Agricultura dos EUA, Cullen Schwarz, em resposta por email a perguntas
enviadas pela Reuters. Ele se referiu à lei de cultivo dos EUA aprovada
em 2014.
Uma potência agrária, o
Brasil possui larga experiência em disputas agrícolas, tendo vencido, em
2004, um caso emblemático na OMC, relacionado aos subsídios dos EUA ao
algodão, disputa que teve seu desfecho somente em setembro do ano
passado, com um acordo pelo pagamento de 300 milhões de dólares a
produtores brasileiros.
As autoridades
brasileiras temem que a queda nos preços mundiais de grãos possa levar
os EUA a liberar subsídios ainda maiores para seus fazendeiros, se
valendo para isso de mecanismos de seguro previstos na lei de cultivo de
2014.
Em uma apresentação feita
no ano passado, quando era presidente da Confederação Nacional da
Agricultura (CNA), a atual ministra da Agricultura, Kátia Abreu, alertou
que o Brasil pode perder até 500 milhões de dólares por ano em
rendimentos com a exportação de soja, em decorrência das distorções
causadas pelos subsídios dos EUA.
As estimativas são
provenientes de um estudo feito pela consultoria Agroicone, que estima
que tais subsídios sejam responsáveis por reduzir os preços mundiais do
milho e da soja em 4 por cento e 3 por cento, respectivamente.
"Se os preços
permanecerem nesse nível, vão desencadear mais subsídios aos
agricultores norte-americanos, deixando os produtores brasileiros em
desvantagem", disse a chefe de assuntos internacionais da CNA, Alinne
Oliveira, que criou um grupo para monitorar os subsídios.
Os preços da soja nos
mercados mundiais caíram cerca de 35 por cento ao longo do último ano,
enquanto o preço do milho caiu quase 60 por cento desde uma alta recorde
no final de 2012, de acordo com o índice de futuros CME.
As autoridades
brasileiras esperam reunir mais provas sobre as distorções no início do
ano que vem para desafiar os EUA. Enquanto isso, representantes do
governo dizem que o Planalto pretende pressionar os EUA a ser mais
transparente sobre seus subsídios.
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