EQUILIBRIO
Quando colocar os animais no pasto?
Estudos desenvolvidos no departamento de Zootecnia da Esalq aumentam a produtividade do gado leiteiro
Estudos desenvolvidos no departamento
de Zootecnia da Esalq aumentam a produtividade do gado leiteiro e
minimizam as emissões de gases causadores do efeito estufa
Encontrar o equilíbrio entre uma produção
rentável e sustentável. Nessa tênue divisa caminha a produção
agropecuária que tem, em seu escopo, auxiliar no desafio de alimentar
uma população crescente, preservando as reservas ambientais. No Brasil,
onde concentra-se um dos maiores rebanhos de gado do mundo, encontrar
alternativas que possibilitem essa estabilidade entre as esferas social,
ambiental e econômica é tarefa que envolve o setor produtivo e a
comunidade científica.
A Escola Superior de Agricultura de Luiz
de Queiroz (Esalq/USP) tem, em sua trajetória, importantes contribuições
para o desenvolvimento da pecuária nacional. O departamento de
Zootecnia traz em sua essência estudos que sempre ocuparam a vanguarda
desse ramo da ciência, com destacadas linhas de pesquisas que vão da
nutrição ao melhoramento genético animal, da reprodução à conservação de
forragens e pastagens.
Uma dessas pesquisas foi o tema do
pós-doutoramento da engenheira agrônoma Marília Barbosa Chiavegato.
Supervisionada pelo professor Sila Carneiro da Silva, ela analisou a
qualidade da forragem, o desempenho animal e emissões de gases de efeito
estufa em capim-elefante Cameroon submetido a estratégias de pastejo
rotativo. “Foram testadas maneiras de manejar os animais nas pastagens
buscando minimizar as emissões de gases de efeito estufa - metano
entérico CH4 – e aumentar a produtividade de leite”.
Segundo a agrônoma, o capim-elefante é
bastante utilizado no setor, mas usualmente o foco do produtor está no
período fixo de descanso antes de colocar o animal no pasto. “Nosso
objetivo foi determinar o momento certo de disponibilizar o pasto para
os animais para que as emissões fossem diminuídas e a produtividade de
leite aumentada”.
Na Esalq, Marília conduziu experimento com
vacas leiteiras e alterou o foco para altura do capim, desconsiderando o
período de descanso fixo. “Ocorre que seguindo um período fixado em
dias de descanso, o produtor pode não ter a melhor forragem dependendo
de condições de clima e solo. O pasto vai crescendo e pode passar do
ponto. Por exemplo, pode ficar fibroso e o animal ter problemas na
digestão, o que interfere na produção de leite e nas emissões de gases
do efeito estufa, especificamente do metano entérico, que é o mais
produzido pelos animais ruminantes”, detalha Marília. Assim, buscando
ajustar a dieta, os pesquisadores conduziram um experimento com dois
rebanhos, monitorando 24 vacas leiteiras. “Foi um projeto bem grande,
realizado em parceria com a Embrapa Pecuária Sudeste e Embrapa Meio
Ambiente. E concluímos que é possível obter um equilíbrio entre produção
de leite e emissão de gases”.
A pesquisadora relata que o melhor
resultado foi obtido ao colocar os animais nos pastos de capim-elefante
Cameroon quando eles atingem altura de 100 cm (correspondente à
interceptação de 95% da luz incidente). “Isso resultou em forragem de
melhor qualidade e o resultado foi um aumento de 30% no número de
animais por unidade de área, ganho de 3 kg/dia de leite por animal e
diminuição em 20% das emissões de CH4 entérico por kg de leite
produzido”. Desse trabalho resultaram ainda duas teses. Uma delas
conduzida por Camila Delveaux Araujo Batalha, com orientação do
professor Flavio Augusto Portela Santos, e outra de autoria de Guilhermo
Francklin de Souza Congio que, assim como Marilia, foi orientado pelo
professor Sila.
No caso da tese da Camila, o manejo
baseado com interceptação luminosa (IL) de 95% permitiu que as vacas
acessassem pastos com maior relação folha/colmo, resultando em uma
forragem com melhor composição química.
“Os animais pastejando forragem colhida
aos 95%IL, ou altura de entrada nos piquetes de 100 cm, tiveram maior
consumo de matéria seca e energia, com maior produção de leite por vaca e
taxa de lotação, resultando em maior produção de leite por unidade de
área. Além disso, a estratégia permite a diminuição das emissões de
metano por consumo de energia líquida quando comparado à entrada dos
animais nos piquetes com máxima IL, ou altura de entrada de 135 cm”,
descreve a pesquisadora, que ainda avaliou os efeitos do período de
início pastejo (a.m. ou. p.m.) na produção de leite, variáveis ruminais e
eficiência de uso de N de vacas leiteiras no terço médio da lactação.
Segundo Camila, o maior teor de
carboidratos não fibrosos da forragem ao final do dia possibilitou o
aumento da síntese de proteína microbiana, redução do nitrogênio uréico
no leite e apresentou tendência para aumento da produção de proteína e
caseína do leite em comparação às vacas que iniciaram o pastejo no
período da manhã. “Ao longo dos estudos desta tese houve uma melhora no
valor nutritivo da forragem adotando o critério de entrada nos piquetes
com 95%IL (ou 100 cm de altura) e a troca de piquetes no período da
tarde. Assim, o pastejo no período da tarde deve ser adotado juntamente
com a altura de 100 cm para entrada dos animais nos piquetes como ajuste
fino em sistemas intensivos de produção de leite à base de
capim-elefante Cameroon”, aponta.
Guilhermo Congio corrobora os resultados
obtidos por Marília e Camila. “O manejo do pastejo com base na meta de
95%IL é uma prática ambientalmente segura que melhora a eficiência de
uso dos recursos alocados por meio da otimização de processos envolvendo
plantas, ruminantes e sua interface, e aumenta a eficiência da produção
de leite”.
De acordo com o professor Sila, o uso do
critério de IL para manejar pastos permite que uma série de processos
fisiológicos importantes e determinantes das respostas de plantas e
animais em pastagens sejam integrados em uma simples e única variável de
campo, a altura em que os pastos são mantidos e ou manejados. “Dessa
forma, é possível transferir conhecimento e tecnologia ao produtor de
forma simples, transformando ciência em prática. O bom manejo do pastejo
aumenta a produção e a produtividade animal e reduz a intensidade de
emissão de gases causadores do efeito estufa, contribuindo para uma
pecuária cada vez mais produtiva, eficiente e sustentável”, considera o
docente.
Congio teve ainda como objetivo descrever e
medir a influência de dois horários de alocação de novos piquetes aos
animais sobre a composição química da forragem, consumo de matéria seca
(CMS), produção e composição do leite, e emissões de CH4 entérico de
vacas HPB × Jersey. “Os resultados indicaram que a alocação de novos
piquetes à tarde pode ser uma estratégia de manejo simples e útil que
resulta em maior partição de N para produção de proteína e menor
excreção de nitrogênio ureico no leite. A associação da meta pré-pastejo
de 95%IL (ou altura de 100 cm) e a alocação do rebanho para um novo
piquete à tarde poderia trazer benefícios econômicos, produtivos e
ambientais para a intensificação sustentável de sistemas baseados em
pastagens tropicais”.
Seguindo na linha para continuar obtendo
melhores índices de produtividade de leite, com baixo impacto ambiental,
Marilia Chiavegato antecipa futuras pesquisas. “Os próximos estudos
envolverão outras pastagens, a questão da dieta, e também iremos olhar
para as pastagens degradadas, que é um grave empecilho na produção.
Testaremos uma estratégia de recuperação de pastagens degradadas também
buscando aumentar a produtividade e diminuindo o impacto ambiental”,
finaliza.
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