Premiado pela ONU, Programa Cisternas pode ter corte de 92% no orçamento para 2018
Em Alagoinhas, uma das comunidades rurais de Jeremoabo, a lata d´água ainda não desapareceu.
Na China, durante a 13ª Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas para o Combate à Desertificação (COP 13), o Programa Cisternas é premiado como uma das mais efetivas políticas públicas para áreas em processo de desertificação do mundo.
Em Brasília, essa mesma política é ameaçada de perder 92% dos recursos
públicos destinados à sua execução em 2018. Esse percentual tem como
referência o orçamento de 2017 que, por sua vez, representa um pouco
mais de 1/4 do volume de recursos que esta política teve em 2012. O
Programa Cisternas possibilitou que cinco milhões de pessoas da região
mais árida do Brasil tenham, ao lado de casa, água potável para consumo
humano.
Um dia depois da cerimônia de entrega do Prêmio Política para o Futuro, Valquíria Lima, da coordenação executiva nacional da Articulação Semiárido (ASA) pelo estado de Minas Gerais, falou sobre a situação de incertezas políticas, econômicas e, sobretudo, sociais que o país vivencia, no evento paralelo à COP 13, em Ordos, na China. “As ações da ASA e também as políticas públicas, como o Programa Cisternas, estão ameaçadas de parar devido ao corte no orçamento público. A ASA continuará lutando para que as famílias do Semiárido não sejam penalizadas e possam cada vez mais ampliar seus direitos à água, aos alimentos de qualidade e sem veneno, preservando suas sementes locais e a biodiversidade. Acreditamos que só assim é possível mudar os efeitos da desertificação e das mudanças climáticas.”
A previsão orçamentária proposta pelo Governo Temer para 2018 para a implementação de tecnologias de captação de água da chuva para consumo humano e produção de alimentos é de R$ 20 milhões. No documento enviado pelo Executivo para o Congresso Federal, chamado de Proposta de Lei Orçamentária Anual (PLOA) - volume IV, tomo II, página 733 - esses R$ 20 mi serão destinados à construção de apenas 5.453 tecnologias em todo o território nacional.
O que são 5.453 tecnologias diante da necessidade, só no Semiárido, de 350 mil famílias pela cisterna que armazena água para matar a sede e cozinhar? Isto representa um milhão e 750 mil pessoas sem água potável disponível perto de casa para seu consumo. Nesta região, há também a necessidade de guardar água para produzir alimentos e criar animais. Uma demanda de 600 mil famílias se considerarmos apenas as que dispõem de espaços nas propriedades para a instalação das tecnologias como a cisterna-calçadão e a barragem subterrânea.
Estamos falando das famílias que vivem na região mais árida do país, do tamanho da França e Alemanha juntas, com metade dos brasileiros em situação de miséria e que passou e ainda passa por uma seca de cinco anos, considerada a mais intensa dos últimos 50 anos. As famílias que esperam pelas cisternas vivem na zona rural, em comunidades distantes da sede do município, sem abastecimento de água encanada e com fontes de água contaminadas pelo uso de agrotóxicos nas lavouras.
Só num município da Bahia, Jeremoabo, estima-se que entre 1,5 mil a 2 mil famílias aguardam por suas cisternas de placa de cimento de 16 mil litros. A população rural há 100 anos tomava a água do rio Vermelho, que agora só tem água quando chove. Nos dias atuais, precisam recorrer à prefeitura para pedir carro-pipa. Quando não dá mais para esperar pelo poder público, para não morrer de sede, o jeito é comprar 8 mil litros de água num valor que varia de R$ 70,00 a 300,00, a depender da distância da comunidade da sede da cidade. E quem não tem dinheiro, vai pegar a água onde tem, muitas vezes em fontes contaminadas e barrentas, disputando o líquido com os animais. Nestes casos ainda muito comuns, a água continua sendo transportada pela população em latas. Um trabalho pesado que demanda muitas horas do dia, especialmente, para as mulheres.
“Quando a seca pega, o primeiro lugar que afeta é o bolso. Costumo dizer que quem salvou o município de Jeremoabo da seca foram as cisternas”, assegura Abílio de Jesus, que faz parte da Comissão Municipal da ASA e do Conselho Municipal de Comunidades Quilombolas. Abílio conta que esse ano, depois de 10 anos com inverno ruim de chuva, chegou a chover 700 ml de maio a julho passados. “As tecnologias estão com água e quem ainda não tem a cisterna, pega água com o vizinho”, conta ele.
No município de Nossa Senhora da Glória, no Sertão de Sergipe, há 33 comunidades rurais com mais de mil famílias à espera das cisternas. “Em 2012, fizemos um levantamento no município e a demanda era de 1,5 mil famílias. De lá pra cá, conseguimos atender 500”, conta Silvestre Marques da Silva, conhecido como Gercílio, membro da Comissão Municipal da ASA e presidente da Associação de Produtores Rurais da Comunidade Augustinho.
Desde o início do P1MC, em 2001, até hoje, contam-se um milhão de cisternas de placas proporcionando a cinco milhões de brasileiros e brasileiras condições mais favoráveis para beber água apropriada para consumo, livre de agrotóxicos e outros tipos de contaminações. A ASA Brasil implementou mais de 60% destas tecnologias através da gestão de recursos públicos repassados pelo Ministério de Desenvolvimento Social, através de convênio.
De 2015 para 2017, só queda – Os recursos públicos para a execução do Programa Cisternas são repassados tanto à sociedade civil, como para os estados. Desde 2010 a 2014, houve um crescimento contínuo das verbas destinadas à ASA, através da Associação Programa Um Milhão de Cisternas (AP1MC), uma Organização Social de Interesse Público que faz a gestão física e financeira dos programas da ASA. Saiu de R$ 95,5 milhões para R$ 324,7 milhões. De 2015 até 2017, o fluxo foi o inverso: uma acentuada queda. Este ano, os recursos públicos transformados pela ASA em tecnologias de acesso à água foram apenas R$ 19,3 milhões. Um corte de 94% se comparado com o valor acessado pela ASA em 2014. Os dados são do Portal da Transparência.
Para gerir os recursos públicos, a AP1MC se organizou política e administrativamente, mostrando que a sociedade civil organizada, além de propor políticas públicas, pode executá-las de forma diferenciada: respeitando e estimulando o protagonismo das famílias e zelando pela transparência e eficiência no uso dos recursos. “Foi através da transparência, com nosso sistema integrado de gastos, com todas as nossas tecnologias georreferenciadas que comprovamos, de fato, que os recursos chegam na base. E isso nos respaldou para executar, ao longo destes anos, um orçamento significativo para a sociedade civil de mais de R$ 2 bilhões”, acrescenta Valquíria Lima.
Um dia depois da cerimônia de entrega do Prêmio Política para o Futuro, Valquíria Lima, da coordenação executiva nacional da Articulação Semiárido (ASA) pelo estado de Minas Gerais, falou sobre a situação de incertezas políticas, econômicas e, sobretudo, sociais que o país vivencia, no evento paralelo à COP 13, em Ordos, na China. “As ações da ASA e também as políticas públicas, como o Programa Cisternas, estão ameaçadas de parar devido ao corte no orçamento público. A ASA continuará lutando para que as famílias do Semiárido não sejam penalizadas e possam cada vez mais ampliar seus direitos à água, aos alimentos de qualidade e sem veneno, preservando suas sementes locais e a biodiversidade. Acreditamos que só assim é possível mudar os efeitos da desertificação e das mudanças climáticas.”
A previsão orçamentária proposta pelo Governo Temer para 2018 para a implementação de tecnologias de captação de água da chuva para consumo humano e produção de alimentos é de R$ 20 milhões. No documento enviado pelo Executivo para o Congresso Federal, chamado de Proposta de Lei Orçamentária Anual (PLOA) - volume IV, tomo II, página 733 - esses R$ 20 mi serão destinados à construção de apenas 5.453 tecnologias em todo o território nacional.
O que são 5.453 tecnologias diante da necessidade, só no Semiárido, de 350 mil famílias pela cisterna que armazena água para matar a sede e cozinhar? Isto representa um milhão e 750 mil pessoas sem água potável disponível perto de casa para seu consumo. Nesta região, há também a necessidade de guardar água para produzir alimentos e criar animais. Uma demanda de 600 mil famílias se considerarmos apenas as que dispõem de espaços nas propriedades para a instalação das tecnologias como a cisterna-calçadão e a barragem subterrânea.
Estamos falando das famílias que vivem na região mais árida do país, do tamanho da França e Alemanha juntas, com metade dos brasileiros em situação de miséria e que passou e ainda passa por uma seca de cinco anos, considerada a mais intensa dos últimos 50 anos. As famílias que esperam pelas cisternas vivem na zona rural, em comunidades distantes da sede do município, sem abastecimento de água encanada e com fontes de água contaminadas pelo uso de agrotóxicos nas lavouras.
Só num município da Bahia, Jeremoabo, estima-se que entre 1,5 mil a 2 mil famílias aguardam por suas cisternas de placa de cimento de 16 mil litros. A população rural há 100 anos tomava a água do rio Vermelho, que agora só tem água quando chove. Nos dias atuais, precisam recorrer à prefeitura para pedir carro-pipa. Quando não dá mais para esperar pelo poder público, para não morrer de sede, o jeito é comprar 8 mil litros de água num valor que varia de R$ 70,00 a 300,00, a depender da distância da comunidade da sede da cidade. E quem não tem dinheiro, vai pegar a água onde tem, muitas vezes em fontes contaminadas e barrentas, disputando o líquido com os animais. Nestes casos ainda muito comuns, a água continua sendo transportada pela população em latas. Um trabalho pesado que demanda muitas horas do dia, especialmente, para as mulheres.
“Quando a seca pega, o primeiro lugar que afeta é o bolso. Costumo dizer que quem salvou o município de Jeremoabo da seca foram as cisternas”, assegura Abílio de Jesus, que faz parte da Comissão Municipal da ASA e do Conselho Municipal de Comunidades Quilombolas. Abílio conta que esse ano, depois de 10 anos com inverno ruim de chuva, chegou a chover 700 ml de maio a julho passados. “As tecnologias estão com água e quem ainda não tem a cisterna, pega água com o vizinho”, conta ele.
No município de Nossa Senhora da Glória, no Sertão de Sergipe, há 33 comunidades rurais com mais de mil famílias à espera das cisternas. “Em 2012, fizemos um levantamento no município e a demanda era de 1,5 mil famílias. De lá pra cá, conseguimos atender 500”, conta Silvestre Marques da Silva, conhecido como Gercílio, membro da Comissão Municipal da ASA e presidente da Associação de Produtores Rurais da Comunidade Augustinho.
Desde o início do P1MC, em 2001, até hoje, contam-se um milhão de cisternas de placas proporcionando a cinco milhões de brasileiros e brasileiras condições mais favoráveis para beber água apropriada para consumo, livre de agrotóxicos e outros tipos de contaminações. A ASA Brasil implementou mais de 60% destas tecnologias através da gestão de recursos públicos repassados pelo Ministério de Desenvolvimento Social, através de convênio.
De 2015 para 2017, só queda – Os recursos públicos para a execução do Programa Cisternas são repassados tanto à sociedade civil, como para os estados. Desde 2010 a 2014, houve um crescimento contínuo das verbas destinadas à ASA, através da Associação Programa Um Milhão de Cisternas (AP1MC), uma Organização Social de Interesse Público que faz a gestão física e financeira dos programas da ASA. Saiu de R$ 95,5 milhões para R$ 324,7 milhões. De 2015 até 2017, o fluxo foi o inverso: uma acentuada queda. Este ano, os recursos públicos transformados pela ASA em tecnologias de acesso à água foram apenas R$ 19,3 milhões. Um corte de 94% se comparado com o valor acessado pela ASA em 2014. Os dados são do Portal da Transparência.
Para gerir os recursos públicos, a AP1MC se organizou política e administrativamente, mostrando que a sociedade civil organizada, além de propor políticas públicas, pode executá-las de forma diferenciada: respeitando e estimulando o protagonismo das famílias e zelando pela transparência e eficiência no uso dos recursos. “Foi através da transparência, com nosso sistema integrado de gastos, com todas as nossas tecnologias georreferenciadas que comprovamos, de fato, que os recursos chegam na base. E isso nos respaldou para executar, ao longo destes anos, um orçamento significativo para a sociedade civil de mais de R$ 2 bilhões”, acrescenta Valquíria Lima.
Aza Brasil
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