Comportamento do mercado de leite no Brasil reflete desajuste entre oferta e demanda
Pandemia adiciona mais variáveis que influenciam o mercado de leite
Por:
Embrapa
A pandemia do
novo coronavírus tem desafiado a cadeia produtiva de lácteos que,
segundo os especialistas, passa por movimentos bruscos. Primeiro, houve
elevação nos preços dos produtos lácteos devido aos movimentos de
consumo logo após o início do isolamento social. Para o pesquisador da
Embrapa Gado de Leite Glauco Carvalho, assim que a crise teve início,
ocorreu uma elevação na demanda, aumentando os preços do leite UHT e do
leite em pó, que durou até o fim de março. Em um segundo momento, que
perdurou até meados de maio, ocorreu a regularização do consumo e a
reorganização da captação e do mix de produtos pelos laticínios,
privilegiando o leite UHT e o leite em pó, segundo Carvalho. “A
indústria agiu rapidamente e os preços se normalizaram, mas depois
começaram a cair”, conta.
Os derivados do leite seguiram caminhos
diferentes. O analista da Embrapa Denis Rocha informa que produtos como a
muçarela e diversos tipos de queijo, cujo consumo depende muito de
estabelecimentos comerciais como restaurantes, bares e pizzarias, foram
fortemente afetados pelo fechamento dos canais de alimentação fora do
lar. “A consequência foi a queda de preços desses produtos, puxando para
baixo o mercado 'spot' (comércio de leite entre laticínios) e até mesmo
o leite UHT foi afetado”, relata Rocha.
Essa dinâmica de preços se refletiu no
pagamento do leite ao produtor, que caiu 5% em maio. Para atenuar o
impacto negativo sobre a rentabilidade, naquele mês também houve uma
ligeira queda nos custos de produção (veja quadro abaixo). Já na segunda
quinzena de maio, Rocha relata que “o mercado virou novamente, com
forte valorização de preços, que vem se sustentando até este momento”.
Para o especialista, isso se deve, principalmente, à baixa
disponibilidade interna de leite e ao aquecimento da demanda,
fortalecida pela liberação do auxílio emergencial do governo,
beneficiando mais de cinquenta milhões de brasileiros, cujos recursos
recebidos foram usados basicamente para a alimentação. “Tal valorização
refletiu positivamente no pagamento de junho e nova alta deverá ocorrer
em julho,” acredita Carvalho.
Menos leite
Em meio à desorganização provocada pela
pandemia, o pesquisador alerta que alguns fatores devem ser monitorados:
“Estimativas do Banco Central apontam queda de cerca de 7% do Produto
Interno Bruto (PIB) brasileiro em 2020. Já são visíveis os reflexos
negativos sobre os empregos e a renda da população, o que pode
estabelecer um teto no preço de lácteos ao consumidor”. Rocha completa:
“Ainda há grandes incertezas quanto à retomada da atividade econômica no
País, o importante agora é manter a cautela na tomada de decisões”.
Fora a pandemia, o fato de haver menos
leite no mercado também influencia na direção em que os preços devem
seguir. A nota de conjuntura publicada em junho pelo Centro de
Inteligência do Leite (CILeite) da Embrapa aponta quatro fatores que
contribuem para a baixa disponibilidade do produto no mercado: o período
de entressafra na produção nacional; a piora na rentabilidade do
produtor (que faz com que descartem vacas e reduzam a produção);
problemas climáticos; e queda nas importações.
O primeiro fator se deve a razões
sazonais. Os meses de maio a junho são o período de menor produção de
leite no Brasil. O volume de leite produzido diariamente em maio fica em
torno de 10% menor que a média anual. Neste ano, a produção ainda está
sendo penalizada pela alta nos custos, puxados principalmente pelos
gastos com concentrado.
Quanto ao clima, o Rio Grande do Sul
sofreu com eventos de seca no início do ano, comprometendo a produção.
Já a respeito do volume das importações, os índices estão 39% mais
baixos que em 2019 e a balança comercial de lácteos representa uma queda
na oferta de quase 200 milhões de litros de leite. Portanto, o momento
econômico dificulta estabelecer horizontes mais claros, mas não é
exclusivo da cadeia produtiva do leite.
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