BOVINOCULTURA
Pesquisa aponta deficiência no manejo vacinal em bezerras
Assim como para a saúde humana, a vacinação bovina é fundamental
A eficiência
da vacina contra clostridioses, aplicada nos primeiros meses de vida das
bezerras, está sendo prejudicada devido a uma prática de manejo comum
entre os produtores de leite: a aplicação de várias vacinas ao mesmo
tempo. É o que prova uma dissertação de mestrado em Zootecnia, pela
Escola de Veterinária da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG),
realizada no campo experimental da Embrapa Gado de Leite (MG).
O mestrando Hilton Diniz e a equipe de
pesquisadores verificaram interferência na resposta vacinal dos animais
imunizados contra brucelose e clostridioses, quando vacinados
simultaneamente. De acordo com Diniz, “a vacinação simultânea resulta em
decréscimo significativo nos títulos de anticorpos contra doenças
causadas por bactérias do gênero Clostridium”. Isso pode culminar em
bovinos não protegidos contra essas afecções nas propriedades leiteiras.
O mesmo estudo demonstra que a vacina contra brucelose não sofreu
qualquer interferência na resposta imunológica, permanecendo eficaz.
Hipótese surgiu de relatos dos produtores
Segundo a professora da UFMG Sandra
Gesteira Coelho, orientadora de Diniz nas pesquisas, a iniciativa para
realização desse trabalho se deu a partir de alguns relatos de
produtores de leite. “Quando visitamos fazendas, em várias regiões do
Brasil, os produtores questionam a vacinação dos animais”, diz Coelho.
De acordo com os pecuaristas, a vacinação costuma impactar negativamente
no desempenho e saúde dos bovinos. “Isso tem feito com que algumas
fazendas não realizem a vacinação.”
Para a professora, situações como essa
contribuem para “desacreditar” as vacinas. Algo semelhante tem
acontecido na saúde humana. “Levados por notícias falsas e falta de
informação, muitas pessoas têm deixado de vacinar as crianças, fazendo
com que doenças que antes estavam controladas voltem a preocupar a
população”, diz a especialista.
A pesquisadora da Embrapa Gado de Leite
Wanessa Araújo Carvalho destaca que o que foi observado acerca da
vacinação concomitante contra brucelose e clostridioses contribui para
reforçar a necessidade de informar e conscientizar os produtores rurais
sobre o impacto da sanidade na maximização de ganhos a longo prazo.
“Manter o rebanho vacinado, de acordo com o calendário do Ministério da
Agricultura e órgãos regionais especializados, significa diminuir o
risco de perdas produtivas, além de reduzir a disseminação de doenças
entre o rebanho e as pessoas responsáveis pelo manejo, contribuindo para
um ambiente mais saudável”, afirma a pesquisadora.
As duas vacinas devem ser aplicadas separadamente
Sandra Coelho e a pesquisadora da Embrapa
Gado de Leite Mariana Magalhães Campos coordenam o projeto “Efeitos da
vacinação na resposta imune, parâmetros hematológicos, desempenho e
comportamento de bezerras leiteiras”, no qual os experimentos para a
dissertação de mestrado estavam inseridos. O trabalho foi aprovado pela
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig).
Campos diz que a prática de aplicar
vacinas com diferentes antígenos de uma só vez é algo comum na pecuária:
“A administração conjunta das vacinas facilita o manejo, diminui o
estresse dos animais e economiza tempo e mão de obra. As campanhas de
vacinação em crianças também seguem modelo semelhante”, compara Mariana.
Duas doenças perigosas para o rebanho bovino
A brucelose bovina é uma doença
infectocontagiosa causada por uma bactéria, também conhecida como
“aborto contagioso”. “Na fêmea bovina, causa abortos, repetições de cio,
nascimentos prematuros e queda na produção do leite, sendo responsável
por grandes prejuízos no rebanho de bovino. Nos machos é responsável por
ocasionar orquite e infertilidade”, diz o professor da UFMG Andrey
Pereira Lage.
Segundo a professora da Ufla Elaine
Dornelas, o principal meio de introdução da brucelose em um rebanho
sadio é pela aquisição de bovinos infectados. A transmissão ocorre pelo
contato direto com a bactéria por via oral, principalmente após o
contato de animais com restos de placenta, corrimento uterino, líquidos e
restos fetais. A principal forma de prevenção é a vacinação de bezerras
de três a oito meses de idade. A professora do Departamento de Medicina
Veterinária da Ufla Elaine Dorneles diz que é importante fazer exames
anuais em todo o rebanho para que as medidas de controle e prevenção
sejam intensificadas.
As clostridioses também causam importantes
prejuízos ao rebanho, incluindo a morte de animais. “O termo
‘clostridioses’ refere-se a um grupo de doenças causadas por bactérias
anaeróbicas do gênero Clostridium, uma das principais causas de
mortalidade de bovinos”, explica o professor da UFMG Rodrigo Otávio
Silveira Silva. Essas bactérias encontram-se amplamente difundidas no
ambiente e no intestino de animais saudáveis. A sua proliferação é de
difícil controle. Destacam-se entre as principais clostridioses o
botulismo, o tétano, o carbúnculo sintomático (também conhecido como
“manqueira”), a gangrena gasosa e a enterotoxemia.
Os surtos estão relacionados a não
aplicação de vacinas, vacinação com agulhas contaminadas e acesso dos
animais a fontes de água ou alimentos impróprios para o consumo. “De
erradicação virtualmente impossível, a principal estratégia de prevenção
das clostridioses é a vacinação do rebanho”, conclui Silva.
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