domingo, 27 de setembro de 2020

Microminhocas no Cerrado

 

Microminhocas ajudam a manter o solo no Cerrado fértil

 

 Pesquisa realizada em solos do Distrito Federal e de Goiás revela que o Cerrado abriga 20 potenciais novas espécies e um novo gênero de enquitreídeos (Oligochaeta, Annelida), também conhecidos como microminhocas, organismos que ocorrem em quase todos os solos do mundo.

Os exemplares foram coletados em solo de vegetação natural e em áreas agrícolas e pertencem a seis gêneros diferentes. Este é o primeiro levantamento quantitativo e qualitativo da população de enquitreídeos no Cerrado realizado com metodologia padronizada e recebeu apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Distrito Federal (FAP-DF).

Os levantamentos mostraram que o Cerrado é tão rico nesses organismos quanto florestas de outros biomas brasileiros com temperaturas mais amenas e maiores índices pluviométricos. A pesquisadora da Embrapa Cerrados (DF) Cintia Niva, coordenadora do estudo, diz que os resultados são surpreendentes: “A ideia geral era que havia poucas microminhocas no Cerrado devido ao prolongado período de seca, já que esses invertebrados precisam de solos úmidos para sobreviver. No entanto, os dados obtidos mostram que temos aqui uma população tão abundante e rica quanto à da Mata Atlântica e à da Amazônia, e composta por várias espécies possivelmente endêmicas, ou seja, restritas ao Cerrado”.

As microminhocas, os enquitreídeos, são parentes próximos das conhecidas minhocas, mas com tamanho bem menor e praticamente sem pigmentação, deixando transparecer seus órgãos internos quando observados no microscópio. No Cerrado, a maioria deles têm até um centímetro de comprimento e dois milímetros de diâmetro corporal. Na Mata Atlântica, já foram encontrados exemplares de até quatro centímetros de comprimento.

A importância do estudo das microminhocas está relacionada às funções que elas desempenham no ecossistema, uma vez que contribuem para a decomposição de matéria orgânica, ciclagem de nutrientes, formação do solo e cadeia alimentar. Apenas 62 espécies terrestres ou semiaquáticas são conhecidas até hoje na América Latina (dessas, 47 existem no Brasil), e 710 válidas em todo o mundo. A pesquisadora conta que há uma hipótese que considera a América do Sul como o centro de origem das microminhocas, o que eleva a expectativa de uma alta diversidade no continente à medida que mais áreas são estudadas.

Os dados servirão de base para o uso desse grupo de organismos como indicadores da conservação da diversidade e da qualidade do solo como habitat no Cerrado em diferentes sistemas de produção. “Ainda existe uma carência de métricas que possam auxiliar no diagnóstico de qualidade do solo, especialmente com base na biodiversidade. Por isso, os trabalhos com bioindicadores são importantes para estimar a sustentabilidade dos ambientes”, explica Niva.

Os seres que habitam o solo são os responsáveis por mantê-lo em saudável funcionamento. Mas nem sempre eles recebem a devida atenção. Apesar disso, alguém pode se perguntar por que não estudar apenas as minhocas como referência da saúde do solo. “Apesar de os enquitreídeos e as minhocas contribuírem para os mesmos serviços ecossistêmicos, como a ciclagem de nutrientes e a estrutura do solo, eles os fazem de forma diferente em função de seu tamanho corporal e de sua posição na cadeia alimentar”, responde Cintia Niva:

Os enquitreídeos também têm susceptibilidades diferentes à qualidade do solo e seu habitat, e por isso, muitas vezes, ocorrem em locais onde as minhocas são pouco abundantes. Portanto, a relevância ecológica, sua ampla distribuição geográfica e sensibilidade a mudanças no meio ambiente tornam as microminhocas potenciais candidatas para o monitoramento de sistemas.

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