Artigo - Abelhas africanizadas: vilãs ou mocinhas?
Márcia Ribeiro
Pesquisadora da Embrapa Semiárido
Existem mais de 20 mil espécies de abelhas no mundo e, entre elas, apenas dois grupos são sociais e produzem mel: são as abelhas nativas sem ferrão e as abelhas melíferas ou africanizadas, ou abelhas “europa”, como também são conhecidas.
As abelhas africanizadas produzem a maior parte do mel que consumimos e, além disso, usamos vários de seus produtos: a cera, o pólen, a geleia real, a própolis, o veneno (apitoxina). E mais importante do que isto é o papel que fazem como polinizadoras de diversas culturas: melão, melancia, manga, goiaba, e tantas outras. Sem elas, teríamos sérios problemas com o número e qualidade de inúmeros frutos que consumimos. Além disso, elas também são importantes polinizadoras de plantas que produzem fibras e outros produtos que os seres humanos utilizam.
Nos últimos dias, entretanto, as abelhas africanizadas têm sido apontadas como “vilãs”, devido aos ataques às pessoas no centro da cidade de Petrolina, no sertão de Pernambuco. Mas precisamos analisar seu comportamento e biologia, antes de condená-las.
Nesta época do ano, em que a seca impera e há falta de alimento na natureza, as abelhas costumam enxamear. Com altas temperaturas e escassez de néctar e pólen nas flores, elas abandonam seus ninhos e migram em busca de novas possibilidades. Este tipo de comportamento é chamado de “enxameagem de abandono”. Antes de deixarem seus ninhos, elas enchem seus papos de mel (como uma reserva), pois precisam de energia para voar por quilômetros, até encontrarem um novo local, adequado para estabelecer seu novo ninho. Com isso, elas não conseguem expor o seu ferrão e, assim, não conseguem ferroar. Por isso, dificilmente acontecem acidentes com enxames que estão em “trânsito”, e ainda não estão estabelecidos.
Outro tipo de enxameagem é a reprodutiva, que ocorre em situação oposta: o ninho cresceu muito, tem muito alimento estocado e não há mais espaço para abrigar todas as abelhas: uma parte delas migrará e fundará um novo ninho, em outro local. Uma vez que este novo enxame se estabeleceu e começa a produzir e estocar mel, possui cria e está se desenvolvendo, o comportamento das abelhas é mais defensivo. Ao se sentirem ameaçadas (por ruídos altos, ou qualquer outra perturbação), atacarão para defender seu tesouro: alimento e cria. Nestas condições, as abelhas podem atacar em grande número, ferroando qualquer “potencial ameaça”. Portanto, as abelhas que “atacam” estão apenas se defendendo.
E ao ferroarem, elas perdem o ferrão juntamente com parte do intestino, e morrem. Quando isto ocorre, elas liberam odores que funcionam como um atrativo para outras abelhas, induzindo que elas se comportem da mesma forma. Dessa forma, o comportamento se multiplica e milhares de abelhas podem atacar para se defender.... Por isso, a recomendação ao identificar um enxame e/ou ataque de abelhas é afastar-se o mais rapidamente possível do local, buscando abrigo e proteção em local fechado.
Vale lembrar que, neste momento, os enxames podem estar ocorrendo em maior número, inclusive em ambiente urbano, talvez pelo excessivo desmatamento da nossa Caatinga e falta de alimento e de locais para nidificação. Sem outra opção, elas podem invadir as áreas urbanas para tentar sobreviver.
Por esta razão, a criação de abelhas deve ocorrer em apiários localizados sempre em áreas rurais, longe de ambientes urbanos, justamente devido aos riscos eminentes. Por outro lado, ao serem bem manejadas e mantidas em locais apropriados, as abelhas só podem nos beneficiar.
Agora, sabendo de tudo isso, você pode responder à pergunta: afinal, as abelhas são vilãs ou mocinhas??
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