O PAPEL DA ORGANIZAÇÃO
SOCIAL E AMBIENTAL NOS ASSENTAMENTOS RURAIS O presente artigo tem o objetivo de dissertar
sobre a importância da organização social e ambiental nos assentamentos rurais.
Sua relação com o homem e o espaço; as definições de organização social com
enfoque na agricultura, e os principais problemas ambientais serão alguns dos
temas analisados.
Ao longo da sua existência, o homem passou a
desenvolver atividades econômicas sem a devida preocupação ambiental - o
importante era gerar recursos financeiros. Nos últimos anos, a
preocupação com o meio ambiente passou a fazer parte de discussões em todo o
mundo, pois os impactos causados pelo homem vêm tomando proporções
irreparáveis. O grande desafio da humanidade, assim, passou a ser conciliar as
atividades econômicas com a preservação ambiental. A convivência harmônica
entre elas vem sendo considerada essencial para a sobrevivência humana.
Os
assentamentos rurais representam uma possibilidade de melhoria nas condições de
vida de agricultores que, ao longo de décadas no Brasil, sofreram com os
processos de exclusão no campo e demais injustiças sociais. Com o acesso à
terra, surgem novas unidades de produção agrícolas e a oportunidade da
manutenção, com dignidade, dos estilos de vida desses agricultores.
A
preocupação com os modos de produção e o meio ambiente também fazem parte da
realidade dos assentamentos. A busca por um equilíbrio entre o aumento da
produtividade e a redução dos impactos à natureza pode ser alcançada por meio
de estratégias de trabalho em conjunto e da organização dos processos
produtivos.
Assim,
o presente artigo tem o objetivo de dissertar sobre a importância da
organização social e ambiental nos assentamentos rurais. Sua relação entre
o homem e o espaço; as definições de organização social com enfoque na
agricultura, e os principais problemas ambientais serão alguns dos temas
analisados.
Assentamentos
rurais
O
espaço é um sistema formado pelo relacionamento entre o homem e a natureza. Os
processos de produção econômica são frutos dessa relação, na medida em que a
natureza oferece matérias-primas e o homem, utilizando do seu trabalho,
transforma essa matéria em objetos úteis que facilitam suas atividades.
Os
projetos de assentamentos são modificações no espaço, a partir de um novo
relacionamento entre homem e a natureza, de acordo com o modo de ocupação
diferenciada dos espaços rurais. Os assentamentos consolidam a luta pela terra,
uma vez que são implantados em terras ociosos ou improdutivas, modificando a
realidade territorial e sua paisagem, com a criação de casas, cercas,
plantações e os equipamentos coletivos, escolas, creches e posto de saúde,
entre outros.
A
conquista dos assentamentos representa algo para além da simples concessão de
terras. Os assentamentos rurais representam uma oportunidade para a reprodução
de modos de vida e de produção de agricultores.
Organização
social
Organização
social pode ser entendida como uma atividade em conjunto na busca de alcançar
interesses em comum. A origem dos assentamentos rurais é um exemplo de
organização social. Agricultores sem terra se organizam em busca de um objetivo
comum: o acesso à terra.
A
grande maioria dos assentamentos rurais no Brasil é subdividida por lotes
individuais. Essa lógica de estruturação cria certo isolamento entre as
famílias, ficando cada uma delas vinculada apenas às atividades produtivas
referentes a seus lotes. A falta de articulação entre os assentados é um dos
entraves para soluções de problemas, como ausência de casas, falta energia
elétrica e de água, entre outros. O trabalho organizado e em conjunto pode
atuar como facilitador de soluções para esses problemas.
De toda forma, o processo de organização social e
econômica das famílias assentadas deve partir da identificação de interesses e
oportunidades demandadas pelas próprias famílias,possibilitando à comunidade,
dentro de um processo de reflexão, cunhar o destino daquele novo espaço.
Desta forma, é de extrema importância oferecer
suporte organizacional para famílias que se encontram em fase inicial do
processo de implantação dos assentamentos. É necessário oferecer condições para
o desenvolvimento dos diferentes grupos de interesses pré-identificados, bem
como apoiar, caso seja da vontade das famílias, a formalização de associações e
cooperativas.
As ações voltadas para o desenvolvimento do
associativismo e cooperativismo são elementos necessários para a construção de
formas articuladas, no que tange à organização da cadeia produtiva das
famílias assentadas. Nessa perspectiva, acredita-se que seja
importante mobilizar ou iniciar um processo de capacitação vinculado aos
princípios teóricos do cooperativismo e do associativismo, valorizando o
processo de comercialização de produtos agrícolas - dentre outros produzidos no
projeto - e a relação entre produção e meios de comercialização, considerando
ainda as questões ambientais.
A
organização coletiva deve ser trabalhada como princípio e meio para uma melhor
convivência social, além de ser um importante facilitador na viabilidade social
e econômica nos projetos de reforma agrária. Nesse sentido, a constituição
da associação faz-se necessária até mesmo para facilitar o processo de
negociação juntos a órgãos, como o Incra, tendo em vista toda a infraestrutura
que deverá ser construída na área.
Nesse
sentido, a ação cooperativa e associativa envolve primeiramente a mobilização e
a organização das pessoas para agirem coletivamente. Estas mobilização e
organização requerem, primeiramente, a formação das pessoas como cooperadas.
Vale ressaltar que a formação de cooperadores e a sua organização numa
associação é um processo educativo que se dá muitas vezes de
forma lenta.
O que é
uma associação?
A
associação é uma sociedade civil, sem fins lucrativos, na qual vários
indivíduos se organizam de forma democrática em defesa dos seus interesses.
O
que é uma cooperativa?
A cooperativa é uma associação de pessoas que se
unem voluntariamente, baseada em valores de ajuda mútua,
solidariedade, democracia e participação para satisfazer as
necessidades econômicas, sociais e culturais comuns dos seus membros.
PROCESSO
DE CONSTITUIÇÃO DA ASSOCIAÇÃO EM ASSENTAMENTOS DE REFORMA AGRÁRIA
Procedimentos
iniciais¹
A
criação de uma organização começa da iniciativa de um grupo de pessoas que
resolve associar-se para determinado propósito. No caso dos assentamentos, a
constituição da associação faz-se necessária até mesmo para facilitar o
processo de negociação com os públicos, tendo em vista toda a infraestrutura
que deverá ser construída na área.
Para criar e formalizar a associação, é
necessário:
- Elaborar de forma participativa junto às famílias reassentadas o texto do estatuto social da associação e do regimento
- Realizar uma assembleia geral de constituição, para que as famílias reassentadas possam decidir as características da organização e aprovar o texto do estatuto social e regimento
- Registrar a associação do reassentamento no Cartório de Registro de Títulos e Documentos da sede da associação.
- Regularizar os registros fiscais, trabalhistas e locais da organização.
- Realizar assembleia para aprovação do estatuto social e das principais características da organização
- Eleger os seus dirigentes (segundo a estrutura de gestão estabelecida no estatuto), os quais deverão tomar posse de seus cargos mediante assinatura de documento próprio (chamado termo de posse). O Termo de posse em assembleia deverá ser assinado por todos os presentes e submetido para registro em cartório.
A
importância de se criar as associações e as cooperativas de forma que envolva
todos os assentados é que as famílias podem participar de forma mais consciente
nas decisões que envolvam o projeto de assentamento. Além disso, essas
organizações são de grande importância na comercialização da produção das
famílias, que, conjuntamente, podem conseguir um retorno maior da venda de seus
produtos.
Impactos
ambientais nos processos produtivos
De forma geral, as atividades agrícolas realizadas
por pequenos produtores caracterizam-se pelo baixo uso de tecnologias e
insumos, ocasionando baixas produtividades. Por sua vez, para aumentar a
produtividade, os recursos naturais, ao longo dos anos, vêm sendo cada vez mais explorados sem a devida
precaução, gerando graves impactos ambientais, tais como: desmatamentos,
degradação dos solos; assoreamento de rios, riachos e lagoas; diminuição e
poluição dos recursos hídricos, entre outros - todos gerados pelo manejo
inadequado utilizado por alguns produtores.
Os desmatamentos para implantação das atividades
agropastoris causam a destruição dos ecossistemas naturais. São comuns os
desmatamentos em áreas proibidas, sejam áreas de nascentes, de encostas, mata
ciliar, topos de morro, etc. Vários são os casos de nascentes que secam, de
rios que deixam de correr ou têm sua vazão diminuída devido aos desmatamentos
irregulares.
O uso intensivo das queimadas para implantação das
roças provoca enfraquecimento dos solos e contribui para a emissão de gases do
efeito estufa, além de algumas vezes infringir a legislação ambiental vigente
no país. As baixas produtividades incentivam os produtores ao aumento da área
utilizada, gerando novos desmatamentos sobre a vegetação nativa, assim,
destroem e/ou reduzem o número de várias
espécies da fauna e da flora.
Vale salientar o assoreamento de fontes d’água
causado pela erosão dos solos. Estima-se que, a cada ano, seis milhões de
hectares tornam-se improdutivos em decorrência da degradação do solo. No
Brasil, foram calculadas em 822,7 milhões de toneladas de solo erodido (IBAMA,
2002).
O processo erosivo provoca a degradação dos solos,
principalmente da sua camada superficial, que
é mais fértil, aumentando, assim, a necessidade da utilização de adubos
químicos, que pode vir a poluir os lençóis freáticos. Segundo Almeida (2006), a
contaminação por agroquímicos é uma constante nas propriedades agrícolas e
produzem impactos sobre a saúde humana, poluindo as águas, o solo e o ar,
prejudicando a flora e fauna.
O controle da erosão do solo deve ser feito visando
à conservação ambiental e o aumento da produtividade das pastagens e culturas.
Segundo Panachuki et al. (2003), o sucesso de uma exploração agropecuária
equilibrada depende, em grande parte, da investigação e controle dos aspectos
referentes aos agentes causadores da erosão, como as chuvas e certos atributos
do solo que, pela ação antrópica, podem favorecer ou dificultar o processo
erosivo, já que as atividades humanas se constituem como principais agentes
catalisadores desses processos.
As queimadas fazem parte do processo rudimentar
para a formação de novas áreas a serem cultivadas. O fogo é utilizado para
limpeza e preparo do terreno e para controlar o desenvolvimento de plantas
invasoras, no caso de pastagens.
Geralmente, as queimadas são realizadas no final da
estação seca, exatamente quando a vegetação está mais vulnerável ao fogo. Com
isso, as cinzas produzidas podem funcionar como fertilizantes, mas na realidade
produzem grande impacto, pois os micro-organismos existentes no solo podem não
suportar o aumento da temperatura. A sua morte pode empobrecer o solo,
tornando-o improdutivo.
Esse procedimento traz ainda consequências no clima
e no ciclo das águas. Os pastos e as lavouras absorvem menos energia solar do
que a vegetação original e podem contribuir para uma redução de chuvas e
aumento de temperatura da região, conforme revela Nepstad et al. (1999).
O mais comentado de todos os impactos causados
pelas queimadas é a emissão de gases do efeito estufa, principalmente do gás
carbônico. Segundo Marcio dos Santos Pedreira e Odo Primavesi et al, (2008)
quando é decomposta em condições de presença de oxigênio, a matéria seca
vegetal libera energia, gás carbônico, minerais e água, na proporção média de
dois quilogramas de gás carbônico para cada quilograma de matéria seca.
A pecuária, em especial, contribui para a emissão
de gases que intensificam o efeito estufa, principalmente o metano. Segundo o
relatório da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação
(FAO) As Repercussões do Gado no Meio Ambiente, emitido
no final de novembro de 2006, a criação de animais é mais danosa ao clima do
que os automóveis. Esse setor de criação de animais tem uma geração de gases de
efeito estufa da ordem de 18%, uma porcentagem maior do que a dos transportes.
O gás metano é o segundo gás mais influente no
efeito estufa e tem um potencial de aquecimento vinte vezes maior que o dióxido
de carbono. Sua permanência na atmosfera está estimada em torno de dez anos.
O metano é produzido pelos bovinos por meio do seu
processo de digestão. Segundo cientistas da Universidade de Nebraska (EUA), sua
emissão pelos ruminantes bovinos pode contribuir com quase 20% do total
liberado na atmosfera. Já a FAO alerta que a criação de animais contribui com
37% de todas as emissões de metano de origem antrópica.
Merece destaque também a degradação das pastagens,
uma vez que sua recuperação exige a realização de adubação do solo ou foliar, e
esta geralmente é feita utilizando adubos químicos que causam impactos à
natureza. De acordo com Macedo; Kichel; Zimmer (2000), a degradação das
pastagens:
É um
processo evolutivo de perda de vigor e produtividade forrageira, sem
possibilidade de recuperação natural, que afeta a produção e o desempenho
animal e culmina com a degradação do solo e dos recursos naturais em função dos
manejos inadequados.
A produção do esterco também traz problemas ambientais.
No relatório da FAO de 2006, afirma-se que 65% do óxido nitroso gerado pelas
ações humanas provêm, em sua grande maioria, do esterco.
Conforme o relatório do Ministério da Ciência e
Tecnologia, em 1994, as emissões de óxido nitroso por animais em pastagem foram
de 218 Gg, ou seja, 0,218 milhões de toneladas e, desta quantia, 39% (ou 0,184
milhões de toneladas) foram emitidos pelo gado bovino de corte e
leiteiro.
O óxido nitroso é um dos gases que influenciam no
efeito estufa. Ele tem como uma das suas características a maior permanência na
atmosfera, podendo chegar a 150 anos e a um poder aquecedor 296 vezes maior que
o gás carbônico.
As
atividades agropecuárias são responsáveis pelas maiores modificações causadas
ao meio ambiente, que, quando realizadas de forma inadequada, causam impactos
ambientais quase irreversíveis. De acordo com Oldeman (1994) apud Araújo;
Almeida; Guerras (2005), por volta de 1990, práticas agrícolas inadequadas
contribuíram para a degradação de 562 milhões de hectares, aproximadamente 36%
dos 1,5 bilhão de hectare agricultável do mundo.
Na visão do Direito Ambiental, Custódio (1993) nos
traz o conceito de dano ambiental:
O
conceito de dano ambiental, decorrente de poluição ambiental pelo uso nocivo da
propriedade e por condutas ou atividades lesivas ao meio ambiente, compreende
todas as lesões ou ameaças de lesões prejudiciais à propriedade (privada ou
pública) e ao patrimônio ambiental, com todos os recursos naturais ou culturais
integrantes, degradados, descaracterizados ou destruídos, individualmente ou em
conjunto.
Seguindo uma
abordagem distinta, a noção de meio ambiente de Branco & O’Neil (1993) pode
ser entendida como o palco das relações entre o homem e a natureza, no curso do
processo produtivo. A dinâmica do desenvolvimento das forças produtivas e da
relação de produção provocará conflitos sociais e impactos ambientais,
determinados na apropriação da natureza pela sociedade.
Considerações
finais
A luta pela terra atua como
transformadora da realidade agrária brasileira. Como principal resultado dessa
luta, os assentamentos rurais significam a reivindicação de uma demanda histórica
da sociedade brasileira. A implantação e desenvolvimento de assentamentos
representam um processo dinâmico na produção de novos agentes e novas formas
com as quais esses agentes se relacionam com o espaço, na busca de melhorar
suas condições de vida.
Faz-se necessário despertar a população do campo
envolvida nas atividades agropecuárias para as questões ambientais, buscando
conscientizá-las. Juntos com extensionistas locais, ela deve buscar formas para
que a atividade e a exploração dos recursos naturais sejam geridas de forma
menos impactante, além de alternativas que possibilitem a recuperação das áreas
já degradadas. É preciso que o aumento da produtividade se dê de forma menos
impactante, com o melhor aproveitamento das áreas já cultivadas e não apenas
com o incremento de novas áreas, gerando, assim, mais impactos na natureza.
Outro fator importante às famílias assentadas é o
fortalecimento da sua organização social. Nesse sentido, as associações e as
cooperativas são de extrema importância já que possibilitam às
famílias, de forma conjunta, buscar o apoio de entidades
e facilitar o escoamento da produção, dentre muitas outras alternativas.
BIBLIOGRAFIA
Formas de
garantir água nas secas/ Embrapa Informação Tecnológica; Embrapa Semi-Árido. –
Brasilia, DF: Embrapa Informação Tecnológica, 2006. 49p.: Il. – (ABC da
Agricultura Familiar, 13).
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