Marcelo Miná Dias - Professor do Departamento de Economia Rural da Universidade Federal de Viçosa (DER/UFV), o autor é doutor em Ciências Sociais. Contribuições, comentários e críticas são bem-vindos: minad@ufv.br.
A extensão rural no Brasil passa por um momento de redefinições. Em sua trajetória histórica não é a primeira vez que isto acontece. Desde sua origem oficial, no final dos anos 1940, este serviço, predominantemente público, já passou por crises, reorientações teóricas e institucionais e reposicionamentos políticos diversos. O que há de específico ou original nas mudanças atualmente propostas? Qual papel vem sendo imaginado para a extensão rural nos processos de promoção do desenvolvimento? Qual a importância da existência de serviços públicos de extensão rural para a agricultura brasileira? A busca de respostas a estas questões nos projeta em campos de disputa sobre os significados, os papéis, os atributos e sobre a própria relevância da extensão rural em suas relações com a promoção do desenvolvimento. Não há, portanto, respostas definitivas. Ao contrário, vivenciamos um rico momento no qual inúmeros agentes intervêm em realidades concretas a partir de uma diversidade de concepções e práticas de extensão rural. Estas concepções e práticas se reelaboram, de modo tenso e conflituoso, dialogando, por um lado, com novas orientações propostas pelas políticas públicas de promoção do desenvolvimento rural e, por outro, com os antigos ritos institucionais e valores corporativos das práticas extensionistas. Baseado em parte da literatura acadêmica recente sobre o tema e nos textos oficiais dos documentos das políticas públicas, o artigo pretende enumerar e apresentar algumas questões que ajudem a analisar e compreender o momento atual. O foco da análise será as mudanças recentes nas percepções sobre a promoção do desenvolvimento e suas relações com os papéis sociais atribuídos aos extensionistas e às organizações que prestam estes serviços. Esta análise nos conduzirá a inovações e permanências institucionais da extensão rural brasileira e a inferências sobre a formação profissional de extensionistas.
A extensão rural no Brasil hoje é caracterizada por uma enorme diversidade de agentes que a praticam, por sua vez, a partir de uma miríade de concepções, métodos, formatos organizativos, lugares sociais, objetivos e interesses.
Esta pluralidade contrasta com o quadro predominante até meados dos anos 1980, quando os serviços de extensão rural eram quase que exclusivamente fornecidos pelo Estado. E eram bastante coerentes com missões institucionais estabelecidas pelos planos de desenvolvimento. Esta coerência extrapolava, inclusive, o Sistema Brasileiro de Assistência Técnica e Extensão Rural (Sibrater) então responsável pela coordenação das atividades extensionistas no Brasil compondo um sistema de promoção do desenvolvimento para o qual as instituições de ensino de ciências agrárias e as de pesquisa agropecuária, principalmente nos anos 1970, contribuíam fornecendo profissionais treinados e informações, conhecimentos e tecnologias voltados ao projeto modernizador do rural brasileiro (Neves, 1987). Esta diversidade é captada pelo estudo coordenado em 2002 por Márcia Muchagata para o Ministério do Desenvolvimento Agrário, em parceria com a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO). O objetivo foi traçar o perfil dos serviços de assistência técnica e extensão rural (ATER) no Brasil. Os autores constatam a existência de 5.700 instituições (governamentais e privadas) prestadoras de ATER, classificadas em 11 categorias distintas (BRASIL, 2003). Antes de analisarmos a conjuntura atual, é necessário tecer algumas considerações a respeito da trajetória histórica da extensão rural no Brasil.
Ao contar esta história, os autores geralmente elaboram periodizações que procuram dar conta das diversas fases da extensão rural no Brasil. Rodrigues (1997), por exemplo, propõe três fases distintas. A primeira abrange o período de 1948 a 1962, denominado de período do humanismo assistencialista, muito bem caracterizado em Fonseca (1985). É o momento de afirmação da extensão rural como profissão, prática e serviço público de educação informal. A segunda fase, denominada pelo autor de difusionismo produtivista, delimitada entre 1963-1984, é, a meu ver, o período em que a extensão rural estatal se institucionaliza de fato, compromete-se como uma corporação de servidores públicos com um projeto de desenvolvimento, passa a integrar um sistema público voltado a um fim claro (modernizar o campo) e torna coerente e institucional um
perfil profissional que é adotado de norte a sul na formação de estudantes de ciências agrárias: um agente moldado para o controle e para a intervenção instrumental sobre a natureza e a sociedade.
O momento seguinte, na periodização de Rodrigues (1997), é por ele denominado de humanismo crítico (1985-1989) e reflete as mudanças geradas pelo fim do regime militar, pela expressão pública das organizações de agricultores e pela percepção generalizada das consequências da modernização. Neste momento, para um considerável número de extensionistas, as idéias do educador Paulo Freire, principalmente as divulgadas em seu livro Extensão ou comunicação? (Freire, 1988), exerceram forte influência no questionamento do ethos extensionista (Masselli, 1998).
3 A história da extensão rural brasileira é tema de variada literatura. Em Oliveira (1999) temos uma importante análise das circunstâncias de surgimento da extensão rural no Brasil. Maria Teresa Lousa da Fonseca, em seu livro, ocupou-se dos primeiros tempos da extensão rural, destacando o papel educativo do serviço naquele momento histórico (Fonseca, 1985). A abordagem histórica de José Paulo Ribeiro (Ribeiro, 2000) recupera sua experiência na Emater-MG desde que ela ainda era a Associação de Crédito e Assistência Rural (ACAR-MG) no início dos anos 1950. Recomendo também dois textos mais recentes que procuram dar conta das mudanças atuais pelas quais passam a extensão rural. O primeiro deles é o resultado da pesquisa realizada por Maria Cecília Masselli, fruto de suas inquietações com práticas extensionistas que lhes pareciam deslocadas das demandas de seu trabalho com agricultores sem terra e assentados (Masselli, 1998). Por fim, o livro que reúne textos de Francisco Roberto Caporal e José Antônio Costabeber é fundamental para compreendermos as mudanças em curso nas políticas públicas de extensão rural (Caporal & Costabeber, 2004).
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Temos que considerar também que o processo de democratização marca o início do processo de diversificação dos agentes prestadores de ATER. Outros atores entram em cena, renovando concepções e práticas de extensão rural. O Estado deixa, paulatinamente, de ter o monopólio da prestação de serviços de ATER. Nas palavras de Brandenburg (1993), a extensão rural pública teria cumprido sua missão na modernização do agro brasileiro. Seu novo papel na promoção do desenvolvimento tornava-se aberto ou indefinido. Crise fiscal, escassez de financiamentos externos e reorientações políticas das agências internacionais de desenvolvimento (FAO e Banco Mundial) completam o cenário do período do repensar da extensão rural.
Este período marca uma fase de tentativa de aproximação entre os serviços públicos de extensão rural e as organizações de movimentos sociais.
Em 1985, à frente da Empresa Brasileira de Assistência Técnica e Extensão Rural (Embrater) Romeu Padilha de Figueiredo, aproveitando os ares democratizantes da Nova República, propôs ampla reorientação da ação extensionista, buscando aproximá-la dos pequenos produtores (hoje chamados de agricultores familiares), para apoiá-los em seus cultivos (pouco pesquisados) para os mercados internos. Sua proposta também defendia que as práticas extensionistas fossem orientadas pela pedagogia de Paulo Freire (Caporal, 2003). Era uma proposta de mudança radical que, obviamente, encontrou oposição na corporação extensionista das Emater. Estas reações conservadoras demonstram o poder do ethos estabelecido durante o período do difusionismo produtivista. Foi naquele período que a ação extensionista construiu e estabeleceu seu sentido de ser. Na trajetória histórica deste serviço, vários serão os momentos em que este ethos demonstrará sua persistência. Embora o comportamento corporativo e conservador tenha inviabilizado a proposta de mudança, ela, inegavelmente, abriu espaço para questionamentos e para práticas alternativas de extensionistas que acreditavam em
outra missão para a extensão rural. Uma missão que a aproximasse dos agricultores excluídos e/ou empobrecidos pelo processo de modernização.
Começam a aparecer práticas e experiências alternativas por todo o país (Masselli, 1998). Mas, institucionalmente falando, o final dos anos 1980 e o início da década seguinte marcam um período de profunda crise da extensão rural pública no Brasil. Em 1990, em um ato simbólico da percepção governamental sobre a sua irrelevância (sob ares neoliberais que orientavam a diminuição da intervenção estatal em todos os setores), é extinta a Embrater e o Sibrater. O fim da Embrater vem acompanhado de expressiva diminuição dos recursos públicos e a quase que inexistência de renovação dos quadros profissionais das Emater a partir daquele momento.
As Emater passaram a depender dos governos estaduais e das prefeituras. A antiga coesão sistêmica, motivo de orgulho da corporação extensionista, esfacelou-se. Para sustentar-se e sobreviver como serviço público, os aparatos públicos de extensão rural foram pedir auxílio aos governos estaduais, fizeram convênios com prefeituras, com sindicatos, cooperativas.
Em Minas Gerais, a Emater-MG, para garantir sua sobrevivência (e vislumbrando outro tipo de papel social de sua intervenção), passou a cobrar aos agricultores pelos serviços.
A perda da coesão sistêmica e o início de experiências locais de reestruturação ainda pouco estudadas e conhecidas não significaram, para as agências estatais de ATER, ruptura com o passado assistencialista, difusionista e produtivista. Ao contrário, este passado firmou-se como uma tradição, uma referência e um saber-fazer que pode até ter se tornado questionável e menos relevante diante da crise instalada e dos desafios colocados às práticas, mas não um passado superado nas competências e habilidades de milhares de extensionista formados para este tipo de intervenção.
Esta é uma afirmação polêmica, mas a pesquisa do Perfil dos Serviços de ATER (BRASIL, 2003), embora reconheçamos seus limites, chega à conclusão de que as inovações metodológicas nas práticas de ATER ocorrem nas organizações não governamentais (ONG) e nas instituições de ensino, não nas agências governamentais. Em meio às permanências do agir extensionista, da crise da extensão rural pública e da proliferação de outros agentes que declaram prestar serviços de assistência técnica e extensão rural, eis que surge o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) em 1996. Os recursos oriundos do Pronaf para prestação de assistência técnica foram fundamentais para muitas empresas estaduais, aproximando definitivamente a extensão rural pública da agricultura familiar. Obviamente esta aproximação foi muito mais uma necessidade de sobrevivência institucional do que afinidade ideológica da extensão rural com este público. A relação entre o Pronaf e a extensão rural governamental foi simbiótica nos estados onde as empresas estaduais tinham condições de prestar os serviços. A concessão do crédito dependia da elaboração de um projeto técnico e a empresa estadual de ATER dependia dos recursos para a assistência técnica. Este vínculo entre o Pronaf e a extensão rural pública afirmava, no entanto, velhas práticas extensionistas.
Estes limites são assinalados pelos próprios executores do trabalho. Para uma avaliação crítica dos resultados alcançados pela pesquisa Cf. Neumann & Froelich (2004).
(...) a noção de assistência técnica parece coerente ao papel atribuído aos projetos técnicos e ao tipo de trabalho desempenhado pelos extensionistas junto aos agricultores. Os projetos, quando muito, contemplam a dimensão produtiva ou agrícola da promoção do desenvolvimento ou fortalecimento da agricultura familiar pretendido pelo Pronaf, reduzindo-o à disseminação de novas técnicas ou práticas de cultivo. Essa especialização da ação extensionista no caso do Pronaf A, além de disseminar práticas geralmente incoerentes com aquelas tradicionalmente conduzidas pelos agricultores, deixa de lado as características e condicionantes mais amplos e sistêmicos de uma intervenção que pretende provocar mudanças substanciais nas condições de vida das famílias de agricultores (Bruno & Dias, 2004).
No Pronaf não havia diretrizes ou objetivos claros sobre os projetos (seu conteúdo, seus princípios, a matriz tecnológica orientadora etc.). Eles se tornaram meras peças técnicas para liberação de recursos. Na ausência de um projeto político mais amplo de desenvolvimento para o rural brasileiro, outra modernização, mais lenta e silenciosa, ocorria de forma molecular, a depender da vontade de quem a empreendia, com apoio do Pronaf.
Vários estudos indicam o vínculo entre o Pronaf e (...) o aumento da erosão e o aumento da freqüência de uso de agrotóxicos (FECAMP, 2002, p.124). Em outra pesquisa, Ferreira & Garcia (2002, p.29) identificaram que, entre seus entrevistados, há uma crítica generalizada ao conteúdo da assistência técnica, que não vislumbrava alternativas ao antigo padrão da modernização agrícola. Como argumentam Romano & Buarque (2002, p.25), estudando o crédito para agricultores nordestinos, os técnicos não levavam em conta as especificidades nem o potencial real das unidades produtivas. Mudam os tempos, a conjuntura política, as demandas sociais, a estrutura disponível para a intervenção, mas permanece o ethos extensionista enraizado no difusionismo produtivista.
Em 2003 mais uma mudança radical. Com o início do governo Lula, vários projetos políticos começam a serem postos em prática pelo Estado. Para o desenvolvimento rural, o governo pretendeu concretizar o projeto Vida digna no campo, com forte ênfase na agricultura familiar, na necessidade da reforma agrária, no combate à fome e à pobreza. Para a extensão rural foram delineados novos horizontes. A primeira ação, em junho de 2003, foi à transferência da competência da ATER pública do Ministério da Agricultura e Abastecimento (MAPA), onde estava sob guarda da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) desde o fim da Embrater, para o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA). A seguir foi criado o Departamento de Assistência Técnica e Extensão Rural (Dater) vinculado à Secretaria de Agricultura Familiar do MDA. E, mais importante, passam a compor o Dater vários extensionistas da Emater do Rio Grande do Sul, que durante o governo de Olívio Dutra havia empreendido ampla reformulação de sua missão institucional e intervenção pública. A experiência da Emater gaúcha torna-se espelho para a construção de uma nova política pública de ATER. Esta experiência, em sua revisão institucional, tinha como proposta a transição agroecológica uma crítica aos preceitos e instrumentos da revolução verde e a afirmação do projeto político: a extensão rural agroecológica. De acordo com seus idealizadores: (...) trata-se de uma intervenção de caráter educativo e transformador, baseado em metodologias de investigação - ação participante que permitam o desenvolvimento de uma prática social mediante a qual os sujeitos do processo buscam a construção e sistematização de conhecimentos que os leve a incidir conscientemente sobre a realidade. Ela tem o objetivo de alcançar um modelo de desenvolvimento socialmente eqüitativo e ambientalmente sustentável, adotando os princípios teóricos da Agroecologia como critério para o desenvolvimento e seleção das soluções mais adequadas e compatíveis com as condições específicas de cada agroecossistema e do sistema cultural das pessoas envolvidas no seu manejo. (Caporal & Costabeber, 2004, p.64). Embora a nova política nacional de assistência técnica e extensão rural referida pela sigla PNATER tenha sido fruto de um amplo processo de consulta a extensionistas, organizações dos agricultores e demais envolvidos com o tema, prevaleceu em seu texto final o foco na promoção da transição agroecológica. Os cinco princípios da PNATER deixam claras as intenções políticas da mudança proposta. Primeiro, define-se como público prioritário (e quase exclusivo) da política pública a agricultura familiar e coloca-se como princípio a garantia do acesso à ATER.6 Está implícito neste princípio o diagnóstico sobre a importância da existência de serviços públicos de ATER e a necessidade de democratizar o acesso. No caso da PNATER, estes serviços são qualificados como públicos, gratuitos, de qualidade e em quantidade suficiente. Segundo, há clara opção política pelo discurso da sustentabilidade do desenvolvimento, qualificado também de endógeno e vinculado ao paradigma tecnológico baseado nos princípios da Agroecologia (BRASIL, 2004, p.7). Esta opção também é relacionada à busca da segurança alimentar e ao uso sustentável dos recursos naturais.
Trata-se do conceito amplo de agricultura familiar, incorporando assentados por programas de reforma agrária, extrativistas, ribeirinhos, indígenas, quilombolas, pescadores artesanais e aqüiculturas, povos da floresta, seringueiros, e outros públicos definidos como beneficiários dos programas do MDA/SAF (BRASIL, 2004, p.7).
6 O acesso aos serviços torna-se importante para garantir a execução de programas de políticas públicas. De acordo com dados oficiais (do Censo Agropecuário de 1995/1996), apenas 16,7% dos agricultores familiares brasileiros teriam acesso a algum serviço de assistência técnica. No Nordeste Brasileiro este percentual cairia para 2,7% (Incra/FAO, 2000).
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Chama à atenção no documento da PNATER o reconhecimento da pluralidade dos agentes que trabalham com ATER, convocados a compor um sistema nacional descentralizado de ATER pública, coordenado pelo Dater/ SAF/MDA e articulado por mecanismos de gestão social e financiamento misto (várias instâncias governamentais, parcerias, fontes internacionais etc.). Isto representa ao mesmo tempo o reconhecimento da incapacidade do Estado prover exclusivamente os serviços e a diversidade que hoje caracteriza a extensão rural no país. Este reconhecimento aponta para dois objetivos distintos: reestruturar o aparato estatal e apoiar a iniciativa não governamental.
Por fim, a preocupação com o estímulo a métodos de intervenção coerentes com as diretrizes defendidas (diagnósticos participativos, perfil educativo e construtivista da intervenção etc.) e com a capacitação (processos educativos permanentes e continuados) dos atuais agentes extensionistas, visando à formação de competências, mudanças de atitudes e procedimentos dos atores sociais, que potencializem os objetivos de melhoria da qualidade de vida e de promoção do desenvolvimento rural sustentável
(BRASIL, 2004, p.7). Evidencia-se, ao enunciar estes princípios, o diagnóstico da inadequação entre a proposta de mudança e o quadro técnico disponível para executá-la.
Considerações Finais
Parece evidente que não há intenção do governo federal de estabelecer uma orientação política para a extensão rural que resgate a coerência institucionalmente verticalizada (e garantida pela ausência de democracia) dos tempos da modernização conservadora. Neste sentido, as instituições públicas e privadas de ATER tenderão a se comportar de modo diverso e pouco regulado em relação à PNATER, procurando influenciá-la de acordo
com interesses particulares a cada organização. O documento da PNATER é extremamente avançado em termos da proposta de mudança que coloca em cena. A seu modo, resgata um leque variado de críticas à extensão convencional. Estas críticas, por sua vez, vêm sendo construídas a partir de experiências bastante diversas e quase todas não são referidas às dimensões continentais de intervenção, como é o caso brasileiro e como exigem as políticas de caráter universal.
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Apesar de seu caráter inovador, a PNATER também representa uma possibilidade do Estado exercer seu poder de enquadramento, regulação e controle.
As empresas públicas que não se adequarem imagina-se poderão ser punidas com a limitação de recursos. As não governamentais que não atenderem aos requisitos dos editais públicos serão excluídas do processo. As que acessarem recursos e não cumprirem metas seria punido.
É um cenário possível, desde que o Estado desenvolva mecanismos de avaliação e monitoramento da ATER. Por enquanto, estes mecanismos não existem. Prevalecerá a trajetória histórica de cada instituição, a força dos habitus e o modo como cada um lidará com a inovação proposta. As políticas públicas também representam importantes referentes à ação. Elas contêm representações sociais sobre a mudança desejada; mexem
com o imaginário social e têm o potencial de deslocar posições conservadoras arraigadas. Afinal, é o Estado, com todo o simbolismo aí representado, que está defendendo este tipo de mudança. Embora de modo contraditório por também estimular permanências sinaliza que há outras concepções que merecem ser debatidas publicamente. Sustentabilidade, agroecologia, gestão social, dentre outros temas, passam a ser considerados, discutidos, debatidos, reapropriados, ressignificados, rejeitados ou aceitos como referentes à ação. Muitos se admiram ao ler editais públicos com termos que há pouquíssimo tempo atrás não eram utilizados em textos oficiais. Esta é uma mudança que não pode ser desconsiderada. Embora a idéia de mudança sempre traga consigo um diagnóstico sobre a imperfeição ou inadequação daquilo que se quer mudar, ela é ao mesmo tempo sedutora e ameaçadora. Não há como prevê o resultado das mudanças propostas. Nas organizações, a imprevisibilidade das mudanças gera incertezas e ansiedades. Ao mesmo tempo, a possibilidade de mudança gera esperança de que as coisas possam melhorar.
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