Introdução
A caprinocultura tem elevada importância social e econômica para a população rural e para a própria estrutura econômica das regiões onde é desenvolvida. Ela constitui uma alternativa econômica viável e sustentável para diversificar a produção, principalmente para pequenos e médios produtores. A espécie caprina tem a grande capacidade de adaptação às condições ambientais adversas e aos diferentes regimes alimentares e de manejo (NOGUEIRA FILHO & KASPRZYKOWSKI, 2006).
Independente da função explorada, nos últimos anos a cadeia produtiva da caprinocultura brasileira tem experimentado mudanças significativas. A atividade vem despertando mais interesse por parte dos setores público e privado, propiciando mudanças em alguns de seus segmentos. Evidencia-se a intensificação da pesquisa voltada para a produção de animais e agregação de valor aos seus produtos além do crescimento no nível de organização dos produtores, aumento na apropriação do conhecimento e no uso da tecnologia e o incremento da demanda por produtos derivados de caprinos (ANDRÉ JÚNIOR, 2013).
O efetivo caprino na região Nordeste representa mais de 90% do total brasileiro que é de 9,3 milhões de cabeças (IBGE, 2010). Independente da região geográfica e do tipo de exploração, a caprinocultura está presente em todos os estados brasileiros (ANDRÉ JÚNIOR, 2013) e o rebanho caprino é constituído por raças exóticas, animais sem padrão racial definido (SRD) e raças tidas como nativas.
Apesar de apresentarem baixa produtividade, os caprinos naturalizados apresentam grande potencial produtivo a ser explorado, pois é possível obter-se índices produtivos muito elevados tendo em vista as condições adversas em que se encontram os animais. Assim, de acordo com Ribeiro (2006), é interessante explorar animais pouco exigentes, que tenham condições de utilizar os recursos já disponíveis, visando minimizar os custos de produção.
Além da sua importância como recurso biológico dotado de grande variabilidade genética e do seu valor histórico, os caprinos naturalizados desempenham um papel importante para a região semiárida do Brasil. Eles têm sido um dos responsáveis pela fixação do homem ao campo, por serem uma fonte de proteína animal de alto valor biológico disponível para as populações de baixa renda (RIBEIRO, 2006).
No entanto, a introdução de raças melhoradas com finalidade de aumentar a precocidade – provocando desinteresse na criação das raças naturalizadas – e cruzamento entre as raças naturalizadas ou entre elas e raças melhoradas, devido na maioria das vezes ao tipo de sistema empregado (extensivo), (McMANUS et al., 2010) têm se tornado ameaças à preservação do patrimônio genético desses animais. Dessa forma, devem-se reunir esforços e buscar formas equilibradas de exploração, através de programas de melhoramento por cruzamento e seleção, associados a trabalhos de recuperação, preservação e conservação das raças em seu estado de pureza (RIBEIRO, 2006).
Origem/histórico
Os caprinos naturalizados no Brasil são descendentes dos tipos trazidos pelos colonizadores portugueses logo após o descobrimento. Devido ao processo de seleção natural que sofreram ao longo de várias gerações, esses animais apresentam alta capacidade de sobrevivência e alta prolificidade nas condições do Nordeste (McMANUS et al., 2010), além de melhor resistência às doenças e parasitas e as condições climáticas severas, entretanto algumas características produtivas ainda podem ser afetadas, entre elas, as características relacionadas à reprodução (CHAGAS DA SILVA et al., 2010).
Apresentam características como: pequeno porte, pelo curto, orelhas eretas e baixa produção de leite. Os de padrão racial definido representam uma minoria, sendo os principais tipos o Moxotó, o Canindé, Repartida e Marota bem como os ecotipos como Gurguéia, Biritinga, Azul, Graúna, Nambi e Orelha de Onça. Os ecotipos: Cabra Azul, Graúna, Marota, Gurguéia e Repartida não têm padrão racial homologado pela Associação Brasileira de Criadores de Caprinos (ABCC), sendo o Canindé e o Moxotó reconhecidos como raças (McMANUS et al., 2010).
A raça Canindé foi reconhecida como raça pelo Ministério da Agricultura em 1999 (MCMANUS et al., 2010). Tem sua origem provavelmente ligada ao grupamento das pirenaicas, (raças trazidas pelos colonizadores) de acordo com a mais recente classificação efetuada na Espanha e Portugal. Essa raça sofreu o processo de naturalização no Nordeste brasileiro. Alguns afirmam que o nome é oriundo de “Calindé” que era a tanga branca, de algodão rústico, usada pelos escravos. Outros afirmam ter origem da região do Vale do Rio Canindé, no Piauí. O nome consolidou-se como Canindé que significa “faca pontuda”, usada principalmente no sertão cearense ou também pode significar as pedras ou lascas rochosas que serviam para afiar lâminas ou peixeiras no sertão do Piauí (NOGUEIRA FILHO & KASPRZYKOWSKI, 2006).
O rebanho estimado em mestiçagem é de 50.000 cabeças. Calcula-se que existam cerca de 25.000 cabeças classificáveis como “puras de origem” (PO). O baixo número de exemplares da raça impõe um risco de extinção. Assim, ações que objetivem a preservação destes animais são importantes para que não seja perdido este material genético de forma definitiva (AVELAR, 2009).
Características morfológicas e aspectos produtivos
A Canindé é uma raça nativa do Nordeste brasileiro, encontrada nos estados do Piauí, Bahia, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Ceará. Está atualmente ameaçada de extinção. A cabeça é de tamanho médio e harmoniosa com o corpo (figura 1). Os chifres são de coloração escura, dirigindo-se para trás, para cima e para os lados, podendo ser frequente a ausência dos mesmos. As orelhas são medianas, alertas e bem inseridas. Seu pescoço é delgado, harmônico e bem implantado. Dorso de linha de apresentação reta. Garupa inclinada e curta. Ossatura forte, mas delicada, os cascos são medianos, escuros e apresentam bons aprumos. A pelagem é preta, mas com o ventre e o lombo listrado de cor castanho claro ou escuro (SEBRAE, 2013).
Fonte: http://www.grupovoa.com/fazendavoa/negocios/raca-caninde/
Os caprinos da raça Canindé assemelham-se aos da raça Moxotó e Repartida em tamanho, forma e função, embora seja a que tem maior aptidão leiteira das três, produzindo até 800 mL de leite por dia. Como nos caprinos da raça Moxotó, apresenta em torno dos olhos manchas amarelas ou brancas, descendo duas listas dessa mesma coloração até a comissura labial. Os pelos são curtos e brilhantes. Os animais são leves e de pequeno porte. A altura é de 55 cm, aproximada. A mortalidade situa-se de 15% a 18,6% para animais de até um ano de idade. Para animais com essa idade o peso gira em torno de 15,7 kg (SEBRAE, 2013).
Em sistema de exploração tendo a pastagem da caatinga como principal fonte de alimento, suplementação alimentar durante a época seca, sal mineral e água à disposição dos animais o ano todo, adotando estação de monta e desmame das crias entre 84 e 90 dias, tem-se obtido os seguintes índices produtivos (EMPARN), conforme tabela 1.
Fonte: EMPARN informa. Raça Canindé.
Estudos e pesquisas
Inúmeros estudos foram e estão sendo realizados para avaliar a capacidade adaptativa e os aspectos produtivos da raça Canindé, isoladamente ou em comparação com outras raças caprinas em todo o Brasil. Coelho Silva et al. (2013), afirmam que, quando expostos à radiação solar direta, caprinos da raça Canindé ativam mecanismos evaporativos para dissipar o excesso de calor ganho do ambiente, observando diferenças regionais na evaporação cutânea, sendo esta mais intensa na região do pescoço.
Comparando caprinos das raças Canindé e Moxotó, Chagas da Silva et al. (2010), obtiveram resultados que comprovam que ambas as raças respondem positivamente às condições ambientais de estresse térmico que lhes foram impostas, o que se consegue pela alta resistência a climas mais severos que estes animais possuem. E embora apresentem geralmente melhores resultados, percebe-se que os animais da raça Canindé são ligeiramente mais sensíveis às variações das condições ambientais.
Quanto ao comportamento ingestivo, Barreto et al. (2011), concluíram que caprinos das raças Moxotó e Canindé são muito seletivos e preferem as menores partículas da dieta, independentemente do seu nível energético. Assim, dietas com alto nível de energia favorecem a eficiência alimentar e de ruminação em caprinos Moxotó e Canindé em confinamento.
Corroborando com o estudo referido anteriormente, Ribeiro et al. (2006) asseguram que os animais das raças Moxotó e Canindé possuem comportamento ingestivo semelhante. Os autores atribuem esse fato às semelhanças nas características corporais das duas raças, visto que caprinos Moxotó e Canindé atingem, na idade adulta, tamanho corporal muito próximo e possuem velocidade de crescimento semelhante, além de serem animais que foram submetidos às mesmas condições de ambiente no processo de adaptação ao semiárido do Nordeste do Brasil.
Utilizando a mesma justificativa e partindo do pressuposto teórico que os séculos de pressão de seleção natural promoveram elevada capacidade adaptativa em relação a ambientes de desconforto térmico para as raças Canindé e Moxotó, Lucena et al. (2013), verificam que não houve efeito de raça para nenhuma das variáveis fisiológicas estudadas, a saber: TR (temperatura retal), FR (frequência respiratória), FC (frequência cardíaca), TPELO (temperatura do pelo) e TPELE (temperatura da pele); quando provocada situação de estresse térmico.
Além disso, concluíram que temperaturas de 20,6 a 27,8 °C podem ser consideradas dentro da zona de conforto térmico para ambas as raças; em temperaturas de 31,6 °C, os animais elevaram a frequência cardíaca e respiratória e a temperatura da pele, caracterizando situação de estresse térmico e o índice de temperatura e umidade (ITU) acima de 81,3 pode ser considerado estressante para caprinos das raças Canindé e Moxotó.
Considerações finais
Os caprinos da raça Canindé são rústicos, prolíferos, pouco exigentes e resistentes às doenças, além de possuírem aptidão para produção de carne, leite e pele; A exploração caprina deve levar em consideração programas de melhoramento que visem à preservação do patrimônio genético das raças nativas; É importante o estudo do efeito das variáveis climáticas sobre o desempenho animal, a fim de amenizar o estresse imposto pelas condições ambientais e maximizar o potencial produtivo.
Referências bibliográficas
ANDRÉ JÚNIOR, J. Sistema de produção misto de caprino na região central do estado do rio Grande do Norte. Dissertação, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 2013.
AVELAR, S. R. G. Diferentes protocolos de estimulação ovariana para a produção de oócitos em cabras da raça Canindé. Dissertação, Universidade Estadual do Ceará, 2009.
BARRETO, L. M. G.; MEDEIROS, A.N.; BATISTA, A. M. V.; FURTADO, D. A.; ARAÚJO, G. G. L.; LISBOA, A. C. C.; PAULO, J. L. A.; SOUZA, C. M. S. Comportamento ingestivo de caprinos das raças Moxotó e Canindé em confinamento recebendo dois níveis de energia na dieta. Revista Brasileira de Zootecnia, v.40, n.4, p.834-842, 2011.
CHAGAS DA SILVA, M.; BRITO, I. F.; BARBOSA FILHO, J. A. D.; ANDRIOLI, A.; BRASIL, D. F.; SALES, F. A. L. Influência das variáveis ambientais sobre as características quantitativas do sêmen de caprinos das raças Canindé e Moxotó. In: Anais… VI Congresso Nordestino de Produção Animal. Mossoró, RN. 2010.
COELHO SILVA, J. J. F.; TORQUATO, J. L.; SÁ FILHO, G. F.; SOUZA JR, J. B. F.; COSTA, L. L. M. Evaporação cutânea e respostas fisiológicas de caprinos Canindé em ambiente equatorial semiárido. Journal of Animal Behaviour and Biometeorology, v.1, n.1, p.13-16, 2013.
EMPARN informa. Raça Canindé. Disponível em <http://www.emparn.rn.gov.br/contentproducao/aplicacao/emparn/arquivos/pdf/f_ra%
C3%A7a%20caninde.pdf >. Acesso em 11 de Outubro de 2013.
IBGE – Instituto Brasileiro de Geogra?a e Estatística. Produção da Pecuária Municipal – 2010. Prod. Pec. munic., Rio de Janeiro, v. 38, p.1-65, 2010.
LUCENA, L. F. A.; FURTADO, D. A.; NASCIMENTO, J. W. B.; MEDEIROS, A. N.; SOUZA, B. B. Respostas fisiológicas de caprinos nativos mantidos em temperatura termoneutra e em estresse térmico. Revista Brasileira de Engenharia Agrícola e Ambiental, v.17, n.6, p.672–679, 2013.
MCMANUS, C.; PAIVA, S.; LOUVANDINI, H. INCT: Informação Genético-Sanitária da pecuária Brasileira. Série técnica: Genética. Caprinos no Brasil. 2010.
NOGUEIRA FILHO, A.; KASPRZYKOWSKI, J. W. A. Série: Documentos do ETENE. O agronegócio da caprinovinocultura no Nordeste brasileiro, n° 09, 2006.
RIBEIRO, M. N. Estado de conservação de caprinos naturalizados no Brasil. Universidade Federal Rural de Pernambuco – Departamento de Zootecnia, 2006. Disponível em <http://www.atividaderural.com.br/artigos/4f7b4e9fd7d0d.pdf>. Acesso em 16 de Outubro de 2013.
RIBEIRO, V. L.; BATISTA, A. M. V.; CARVALHO, F. F. R.; AZEVEDO, M.; MATTOS, C. W.; ALVES, K. S. Comportamento ingestivo de caprinos Moxotó e Canindé submetidos à alimentação à vontade e restrita. Acta Scientiarum Animal Sciences. Maringá, v. 28, n. 3, p. 331-337, 2006.
SEBRAE. Ovinocaprinocultura. Raça caprina Canindé. Disponível em <http://www.sebrae.com.br/setor/ovino-e-caprino/o-setor/racascaprino/caninde/caninde-180/BIA_180 >. Acesso em 15 de Outubro de 2013.
Autores:
Bonifácio Benicio de Souza Patos – Paraiba
Professor Associado – UAMV/CSTR/UFCG, Bolsista de Produtividade do CNPq
Nayanne Lopes Batista Patos – Paraiba
Médica veterinária – UFCG, bolsista do CNPq
Nota do Blog Nossa Terra:
No município de Angicos e talvez no Estado do RN, o maior produtor da Raça Canindé, é o Agrônomo Dr. Alexandre Wanderlei. Quem quiser adquirir, um bom plantel da Raça Pura CANINDÉ, procure a Fazenda Barra da Cruz, na BR 304, próximo ao Pico do Cabugi, no município de Angicos.
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