terça-feira, 10 de dezembro de 2019


BOVINOCULTURA

Pesquisa aponta deficiência no manejo vacinal em bezerras

Assim como para a saúde humana, a vacinação bovina é fundamental
     
A eficiência da vacina contra clostridioses, aplicada nos primeiros meses de vida das bezerras, está sendo prejudicada devido a uma prática de manejo comum entre os produtores de leite: a aplicação de várias vacinas ao mesmo tempo. É o que prova uma dissertação de mestrado em Zootecnia, pela Escola de Veterinária da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), realizada no campo experimental da Embrapa Gado de Leite (MG).

O mestrando Hilton Diniz e a equipe de pesquisadores verificaram interferência na resposta vacinal dos animais imunizados contra brucelose e clostridioses, quando vacinados simultaneamente. De acordo com Diniz, “a vacinação simultânea resulta em decréscimo significativo nos títulos de anticorpos contra doenças causadas por bactérias do gênero Clostridium”. Isso pode culminar em bovinos não protegidos contra essas afecções nas propriedades leiteiras. O mesmo estudo demonstra que a vacina contra brucelose não sofreu qualquer interferência na resposta imunológica, permanecendo eficaz.
Hipótese surgiu de relatos dos produtores
Segundo a professora da UFMG Sandra Gesteira Coelho, orientadora de Diniz nas pesquisas, a iniciativa para realização desse trabalho se deu a partir de alguns relatos de produtores de leite. “Quando visitamos fazendas, em várias regiões do Brasil, os produtores questionam a vacinação dos animais”, diz Coelho. De acordo com os pecuaristas, a vacinação costuma impactar negativamente no desempenho e saúde dos bovinos. “Isso tem feito com que algumas fazendas não realizem a vacinação.”
Para a professora, situações como essa contribuem para “desacreditar” as vacinas. Algo semelhante tem acontecido na saúde humana. “Levados por notícias falsas e falta de informação, muitas pessoas têm deixado de vacinar as crianças, fazendo com que doenças que antes estavam controladas voltem a preocupar a população”, diz a especialista.

A pesquisadora da Embrapa Gado de Leite Wanessa Araújo Carvalho destaca que o que foi observado acerca da vacinação concomitante contra brucelose e clostridioses contribui para reforçar a necessidade de informar e conscientizar os produtores rurais sobre o impacto da sanidade na maximização de ganhos a longo prazo. “Manter o rebanho vacinado, de acordo com o calendário do Ministério da Agricultura e órgãos regionais especializados, significa diminuir o risco de perdas produtivas, além de reduzir a disseminação de doenças entre o rebanho e as pessoas responsáveis pelo manejo, contribuindo para um ambiente mais saudável”, afirma a pesquisadora.
As duas vacinas devem ser aplicadas separadamente
Sandra Coelho e a pesquisadora da Embrapa Gado de Leite Mariana Magalhães Campos coordenam o projeto “Efeitos da vacinação na resposta imune, parâmetros hematológicos, desempenho e comportamento de bezerras leiteiras”, no qual os experimentos para a dissertação de mestrado estavam inseridos. O trabalho foi aprovado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig).
Campos diz que a prática de aplicar vacinas com diferentes antígenos de uma só vez é algo comum na pecuária: “A administração conjunta das vacinas facilita o manejo, diminui o estresse dos animais e economiza tempo e mão de obra. As campanhas de vacinação em crianças também seguem modelo semelhante”, compara Mariana.

Duas doenças perigosas para o rebanho bovino
A brucelose bovina é uma doença infectocontagiosa causada por uma bactéria, também conhecida como “aborto contagioso”. “Na fêmea bovina, causa abortos, repetições de cio, nascimentos prematuros e queda na produção do leite, sendo responsável por grandes prejuízos no rebanho de bovino. Nos machos é responsável por ocasionar orquite e infertilidade”, diz o professor da UFMG Andrey Pereira Lage.
Segundo a professora da Ufla Elaine Dornelas, o principal meio de introdução da brucelose em um rebanho sadio é pela aquisição de bovinos infectados. A transmissão ocorre pelo contato direto com a bactéria por via oral, principalmente após o contato de animais com restos de placenta, corrimento uterino, líquidos e restos fetais. A principal forma de prevenção é a vacinação de bezerras de três a oito meses de idade. A professora do Departamento de Medicina Veterinária da Ufla Elaine Dorneles diz que é importante fazer exames anuais em todo o rebanho para que as medidas de controle e prevenção sejam intensificadas.
As clostridioses também causam importantes prejuízos ao rebanho, incluindo a morte de animais. “O termo ‘clostridioses’ refere-se a um grupo de doenças causadas por bactérias anaeróbicas do gênero Clostridium, uma das principais causas de mortalidade de bovinos”, explica o professor da UFMG Rodrigo Otávio Silveira Silva. Essas bactérias encontram-se amplamente difundidas no ambiente e no intestino de animais saudáveis. A sua proliferação é de difícil controle. Destacam-se entre as principais clostridioses o botulismo, o tétano, o carbúnculo sintomático (também conhecido como “manqueira”), a gangrena gasosa e a enterotoxemia.

Os surtos estão relacionados a não aplicação de vacinas, vacinação com agulhas contaminadas e acesso dos animais a fontes de água ou alimentos impróprios para o consumo. “De erradicação virtualmente impossível, a principal estratégia de prevenção das clostridioses é a vacinação do rebanho”, conclui Silva.

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