sábado, 12 de outubro de 2019

Criação de suínos em família reduz uso de antibióticos

Monalisa Pereira -
Um modelo desenvolvido pela Embrapa Suínos e Aves (SC) comprovou que a criação de suínos em família – desde o nascimento até o abate – é capaz de reduzir significativamente o uso de antibiótico nos animais, por não misturar leitões de diferentes procedências, evitando o estresse e a disseminação de agentes infecciosos. Desde que começou a ser implantado na Unidade em 2009, o novo sistema poupou 85% dos animais do uso de medicamentos. Trata-se de um resultado pronto para o mercado, que impacta diretamente a segurança alimentar do produto final, oferecendo ao consumidor uma carne de alto valor agregado, que alia qualidade e sanidade.
A Embrapa Suínos e Aves investe em sistemas de produção que privilegiam o bem-estar animal há pelo menos dez anos em resposta às exigências da sociedade atual por produtos mais seguros do ponto de vista alimentar. “A partir dos anos 2000, cresceu a preocupação mundial com relação ao uso de antibióticos na produção animal, tanto para a questão da resistência dos próprios agentes que causam doenças nos animais quanto em função da saúde humana”, explica o pesquisador da Embrapa Suínos e Aves Nelson Morés, líder do projeto que tem como base a produção de suínos em família.
Resultado de um trabalho de pesquisa e prática, que também contou com parcerias e assistência técnica, o sistema de produção de suínos em família é ideal para granjas com até 60 matrizes. Porém, de acordo com o pesquisador, essa prática pode ser adotada para até 210 matrizes, respeitando os princípios do sistema e mantendo cuidados especiais no transporte.
O modelo alternativo dispensa tratamentos preventivos porque os animais da mesma família permanecem juntos desde o nascimento até a terminação.  A convivência reduz o nível de estresse e não expõe os animais aos riscos normais da produção em larga escala, diminuindo a incidência e proliferação de doenças.
Desde que os pesquisadores iniciaram os estudos da produção de suínos em família, os dados são muito positivos. “A necessidade de medicação injetável individual em animais que adoeceram ocorreu em apenas 3% do plantel na fase de creche e em 8,3% na fase de crescimento e terminação. É um número extremamente baixo em relação ao total. Nesse período nenhum tratamento foi realizado de maneira coletiva, por meio da água ou da ração”, complementa Morés.

Suinocultura brasileira é a quarta maior do mundo

A produção de suínos mudou muito no Brasil nas últimas décadas. Foi nesse período, e com a evolução em pesquisa, genética e mercado, que o País alcançou a marca de quarta maior suinocultura do mundo. Esse reconhecimento internacional se baseia nas conquistas da suinocultura intensiva ou industrial, praticada pelas agroindústrias e responsável pelo processamento de alimentos que encontramos nos supermercados, como presunto, salame, salsicha, entre outros. 
Para atender a esse mercado, a suinocultura precisa conquistar melhores resultados em produtividade, e a alternativa é apostar na escala de produção, o que significa dispor o máximo de animais dentro de uma propriedade. Isso aumenta a possibilidade de ocorrência de problemas sanitários. Por isso é preciso utilizar tratamentos preventivos estratégicos para garantir a saúde dos animais, além de evitar perdas na produção.
Dados de literatura apontam que o desempenho e a saúde dos animais criados no sistema em família são melhores ou iguais aos de rebanhos convencionais.

Cuidados na nutrição também são exigidos

De acordo com o pesquisador Nelson Morés, outro fator importante para que a produção fique livre do uso coletivo de antibióticos está ligado à questão nutricional. O fornecimento da ração nesse sistema é como o de qualquer outro, que leva em conta as necessidades nutricionais indicadas. Porém, o diferencial é a adição de um probiótico e de óxido de zinco para controle de problemas entéricos no desmame, além do uso de um plasma seco de suíno para a melhora da digestibilidade dos animais. 
Mesmo em uma produção de escala menor, como nesse sistema, é preciso estar atento ao manejo e aos procedimentos de sanidade. A qualidade da produção deve ser a mesma, independentemente do tipo de sistema escolhido pelo suinocultor. “Muitas vezes os produtores pensam que, por ser em pequena escala, a produção volta ao passado. Ao contrário, é um modelo de sistema de produção com alta tecnologia e o primeiro princípio é a questão de biosseguridade, extremamente importante para proteger o rebanho da entrada de agentes infecciosos”, reforça Morés.
As medidas de biosseguridade são as mesmas utilizadas em sistemas maiores. O pesquisador destaca algumas que são essenciais: cerca de isolamento, vestiário ou escritório para troca de roupa, combate de moscas e ratos, além de reposição de animais com procedência, de preferência de origem única. 
Além disso, no modelo de produção em família, o bem estar animal é uma grande prioridade.  Nesse sistema, a castração dos leitões, por exemplo, é feita por meio de vacina, a imunocastração. Também não há necessidade do corte de rabo e dos dentes dos suínos, pois as brigas e disputas são menores do que em um sistema intensivo com mistura de leitões. As fêmeas são mantidas soltas, tanto na fase de gestação quanto de maternidade.
O sistema de produção em família é simples e consiste na manutenção da ninhada na mesma baia, do início ao fim da produção. Os galpões são divididos em salas, separando as etapas da produção: gestação, maternidade, creche, crescimento e terminação, da mesma forma que nos sistemas intensivos. O importante na produção de suínos em família é respeitar a manutenção dos animais e estar ciente de que os procedimentos e cuidados são os mesmos de qualquer outro sistema.

Modelo agrega valor ao produto final

A produção de suínos em família é perfeitamente viável para os pequenos produtores como alternativa para agregar valor, ofertando ao mercado um produto diferenciado. Em comparação com o sistema de criação intensiva, o modelo oferece maior economia, além de possibilitar o atendimento a nichos de mercado.
“Do ponto de vista de acesso a mercado e agregação de valor, o sistema apresenta atributos que são muito valorizados em alguns segmentos do mercado consumidor, especialmente o de maior renda”, enfatiza o pesquisador e chefe de Transferência de Tecnologia da Embrapa Suínos e Aves, Marcelo Miele.


Alguns dos atributos destacados por ele são a possibilidade de uso em pequena escala e agricultura familiar, bem-estar animal, retirada dos antibióticos e a aplicação de genéticas para carne de qualidade, como é o caso da MO25C, genética da Embrapa e usada nesse sistema juntamente com o macho MS115.

O sistema de produção em família está validado pela Embrapa e pode sim chegar até o suinocultor. De acordo com o pesquisador Marcelo Miele, a sua adoção envolve diversas práticas, processos e algumas mudanças nas instalações das propriedades. A recomendação da Embrapa é que não seja feita de forma isolada, mas sim por intermédio de uma cooperativa ou de associação ao qual o produtor é ligado.

Outras duas recomendações devem ser seguidas para garantir o sucesso do empreendimento: “A primeira é se aliar a um ponto de venda, ou seja, uma empresa de varejo que já atua com produtos de valor agregado, como é o caso de uma das empresas parceiras no projeto”, explica. A segunda é ter uma assistência técnica de qualidade, que entenda os preceitos do sistema e ajude na implementação das boas práticas na propriedade. 
Miele destaca as parcerias com diferentes áreas e segmentos como fundamentais para a validação do sistema. “Hoje não basta apenas produzir com a qualidade necessária, temos que convencer o mercado consumidor que os atributos estão naquele produto a ser consumido. E para convencer não é mais como antigamente. Agora o consumidor está longe das propriedades e quer garantias de que o produto consumido corresponde de fato ao que está sendo dito. Assim, firmar parcerias é fundamental para que a confiança seja estabelecida”, finaliza.
O projeto de Sistema de Produção de Suínos em Família sem uso de antimicrobianos contou com parcerias em diversas áreas, da produção ao abate e comercialização. A cooperativa Majestade, do Rio Grande do Sul, é a responsável pelo abate e cortes das carnes, além de estar envolvendo seus produtores na busca de interessados em desenvolver o sistema para ampliar a oferta.
A empresa Korin Agropecuária, pioneira na produção de frangos sem uso de antibióticos e de produtos de valor agregado, comercializa os cortes e produtos em suas lojas de varejo em São Paulo. Outras parceiras são a empresa Vitamix e a Agriness.

Embrapa Suínos e Aves

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