quinta-feira, 8 de março de 2018

ARTIGO - O Bem que o leite faz


     

Por Roberta Züge; membro do Conselho Científico Agro Sustentável (CCAS); Vice-Presidente do Sindicato dos Médicos Veterinários do Paraná (SINDIVET); Médica Veterinária Doutora pela Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo (FMVZ/USP); Sócia da Ceres Qualidade.

O desenvolvimento humano, em especial o incremento da capacidade cognitiva, ou seja, a capacidade de adquirir conhecimento, está intimamente ligado aos fatores nutricionais. Os humanos, para deixarem de serem nômades, precisaram desenvolver técnicas de domesticação dos animais e da agricultura. Um dos grandes destaques para facilitar a vida destes humanos, foi a utilização, como alimento, do leite de bovinos. Este, de alto valor nutricional, de fácil ingestão e que poderia ser retirado nas proximidades de suas moradias.
O leite, além de conter significativas concentrações de proteína, gordura e carboidrato, possui também sais minerais e vitaminas lipossolúveis e hidrossolúveis. É considerado um dos alimentos mais completos.

Uma pesquisa publicada no periódico científico Practical Neurology, intitulada “Milk, chocolate and Nobel prizes”, em tradução livre “Leite, chocolate e prêmios Nobel”, realizada pelo Gloucester Royal Hospital, do Reino Unido, identificou que os países que consomem mais leite, per capita, venceram mais prêmios Nobel, em relação ao proporcional total da população.
Foram estudados 22 países ganhadores de prêmios e os dados de consumo de lácteos per capita. A Suécia é o país com o maior número de premiações em relação ao número de habitantes, e, também, o país que consome a maior quantidade de leite por indivíduo, chegando a 340 quilos por ano. Em último lugar, entre os 22 países estudados, está a China, com o menor número de premiados em relação à população, e, apresenta o menor consumo de leite entre os avaliados, não ultrapassando os 25 quilos ao ano, por pessoa (artigo completo http://pn.bmj.com/content/13/1/63). Umas das explicações seria a alta concentração de vitamina D no leite. A vitamina D tem alta correlação com cognição. Sendo grande parte desses países com baixa incidência solar, a ingestão de vitamina D se torna mais importante ainda.

Quando se restringe a ingestão de lácteos, há uma dificuldade em atingir o valor de necessidade diária. De acordo com o National Institutes of Health, 1994, a recomendação é que adultos consumam diariamente, ao menos, 5g de vitamina D. Consumir três copos (de 200 ml) de leite supre quase 50% da necessidade diária de vitamina D. Substituir o leite por outros extratos vegetais deve ser uma recomendação muito restrita e sob intensa orientação médica.
A Sociedade Europeia de Hepatologia e Nutrição (ESOGHAN), em 2006, recomendou que a fórmula a base de soja fosse utilizada apenas em situações específicas, devido às possíveis desvantagens nutricionais e pelo alto conteúdo de fitatos, alumínio e fitoestrógenos.
Estudo da Unifesp identificou que a “telarca precoce” (desenvolvimento das mamas antes da puberdade) em uma criança de menos de 5 anos estava associada a ingestão de fitoestrógenos. Além do desenvolvimento de mamas, outros exames, como níveis hormonais e ultrassom pélvico, eram compatíveis com puberdade precoce periférica. A criança ingeria muitos alimentos baseados em soja (> 40 mg fitoestrógenos/dia). Entre os diversos componentes da soja, há o fitoestrógenos, com destaque da genisteína e daidzeína. A concentração destes pode ser 13.000 a 22.000 vezes maior em crianças alimentadas somente com fórmulas baseadas em soja, que as demais alimentadas com leite. Após a mudança da alimentação da criança, cessou o desenvolvimento puberal, e, posteriormente, a paciente, então com oito anos de idade, continuou a se desenvolver com idades óssea e cronológica compatíveis. Os pesquisadores enfatizaram que, neste caso, a puberdade precoce esteve fortemente relacionada à ingestão excessiva de soja e de outros alimentos ricos em fitoestrógenos, que atuaram como desreguladores endócrinos.

Sistematicamente são criados modismos na alimentação. Hoje, inclusive pela abundância e facilidade de aquisição, o consumidor pode exigir novos critérios ou refugar alimentos consagrados. O ovo por muito tempo foi o vilão e tinha como sua parceira a manteiga. Estudos atuais demostraram que substituir a manteiga por margarina duplica as chances de problemas cardíacos. Artigos recentes demonstraram que o alto consumo de ovos, quando comparado com baixo consumo, resultou em discreta redução do risco de doença cardiovascular e mortalidade cardíaca. Os dois vilões foram alçados a mocinhos.
Diversas tentativas foram e, continuam sendo realizadas, com o intuito de substituir o leite como a bebida mais nutritiva. Os extratos vegetais – que sonham em ser leite um dia –, precisam receber diversos aditivos para conter parte dos ingredientes do leite. Ou seja, passam por processos industriais de enriquecimento, que nem sempre conseguem ter a absorção dos nutrientes como o do leite no organismo. Tudo isto encarece o produto e ainda pode ser deletéria ao organismo. Substituir o leite, um alimento de alto valor nutricional e de preço muito acessível, é uma missão praticamente impossível, assim, utilizar ações de marketing difamando o leite, infelizmente, tem acontecido.
No entanto, já existem muitos estudos científicos que demonstram que a substituição do leite, por extratos vegetais, não devem ser apenas escolhas pessoais ou modismos, somente sob recomendação médica, caso contrário, mais cedo ou mais tarde, o organismo pode cobrar esta conta.    

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