ARTIGO - O Bem que o leite faz
Por
Roberta Züge; membro do Conselho Científico Agro Sustentável (CCAS);
Vice-Presidente do Sindicato dos Médicos Veterinários do Paraná
(SINDIVET); Médica Veterinária Doutora pela Faculdade de Medicina
Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo (FMVZ/USP); Sócia
da Ceres Qualidade.
O desenvolvimento humano, em especial o
incremento da capacidade cognitiva, ou seja, a capacidade de adquirir
conhecimento, está intimamente ligado aos fatores nutricionais. Os
humanos, para deixarem de serem nômades, precisaram desenvolver técnicas
de domesticação dos animais e da agricultura. Um dos grandes destaques
para facilitar a vida destes humanos, foi a utilização, como alimento,
do leite de bovinos. Este, de alto valor nutricional, de fácil ingestão e
que poderia ser retirado nas proximidades de suas moradias.
O leite, além de conter significativas
concentrações de proteína, gordura e carboidrato, possui também sais
minerais e vitaminas lipossolúveis e hidrossolúveis. É considerado um
dos alimentos mais completos.
Uma pesquisa publicada no periódico
científico Practical Neurology, intitulada “Milk, chocolate and Nobel
prizes”, em tradução livre “Leite, chocolate e prêmios Nobel”, realizada
pelo Gloucester Royal Hospital, do Reino Unido, identificou que os
países que consomem mais leite, per capita, venceram mais prêmios Nobel,
em relação ao proporcional total da população.
Foram estudados 22 países ganhadores de
prêmios e os dados de consumo de lácteos per capita. A Suécia é o país
com o maior número de premiações em relação ao número de habitantes, e,
também, o país que consome a maior quantidade de leite por indivíduo,
chegando a 340 quilos por ano. Em último lugar, entre os 22 países
estudados, está a China, com o menor número de premiados em relação à
população, e, apresenta o menor consumo de leite entre os avaliados, não
ultrapassando os 25 quilos ao ano, por pessoa (artigo completo
http://pn.bmj.com/content/13/1/63). Umas das explicações seria a alta
concentração de vitamina D no leite. A vitamina D tem alta correlação
com cognição. Sendo grande parte desses países com baixa incidência
solar, a ingestão de vitamina D se torna mais importante ainda.
Quando se restringe a ingestão de
lácteos, há uma dificuldade em atingir o valor de necessidade diária. De
acordo com o National Institutes of Health, 1994, a recomendação é que
adultos consumam diariamente, ao menos, 5g de vitamina D. Consumir três
copos (de 200 ml) de leite supre quase 50% da necessidade diária de
vitamina D. Substituir o leite por outros extratos vegetais deve ser uma
recomendação muito restrita e sob intensa orientação médica.
A Sociedade Europeia de Hepatologia e
Nutrição (ESOGHAN), em 2006, recomendou que a fórmula a base de soja
fosse utilizada apenas em situações específicas, devido às possíveis
desvantagens nutricionais e pelo alto conteúdo de fitatos, alumínio e
fitoestrógenos.
Estudo da Unifesp identificou que a
“telarca precoce” (desenvolvimento das mamas antes da puberdade) em uma
criança de menos de 5 anos estava associada a ingestão de
fitoestrógenos. Além do desenvolvimento de mamas, outros exames, como
níveis hormonais e ultrassom pélvico, eram compatíveis com puberdade
precoce periférica. A criança ingeria muitos alimentos baseados em soja
(> 40 mg fitoestrógenos/dia). Entre os diversos componentes da soja,
há o fitoestrógenos, com destaque da genisteína e daidzeína. A
concentração destes pode ser 13.000 a 22.000 vezes maior em crianças
alimentadas somente com fórmulas baseadas em soja, que as demais
alimentadas com leite. Após a mudança da alimentação da criança, cessou o
desenvolvimento puberal, e, posteriormente, a paciente, então com oito
anos de idade, continuou a se desenvolver com idades óssea e cronológica
compatíveis. Os pesquisadores enfatizaram que, neste caso, a puberdade
precoce esteve fortemente relacionada à ingestão excessiva de soja e de
outros alimentos ricos em fitoestrógenos, que atuaram como
desreguladores endócrinos.
Sistematicamente são criados modismos na
alimentação. Hoje, inclusive pela abundância e facilidade de aquisição,
o consumidor pode exigir novos critérios ou refugar alimentos
consagrados. O ovo por muito tempo foi o vilão e tinha como sua parceira
a manteiga. Estudos atuais demostraram que substituir a manteiga por
margarina duplica as chances de problemas cardíacos. Artigos recentes
demonstraram que o alto consumo de ovos, quando comparado com baixo
consumo, resultou em discreta redução do risco de doença cardiovascular e
mortalidade cardíaca. Os dois vilões foram alçados a mocinhos.
Diversas tentativas foram e, continuam
sendo realizadas, com o intuito de substituir o leite como a bebida mais
nutritiva. Os extratos vegetais – que sonham em ser leite um dia –,
precisam receber diversos aditivos para conter parte dos ingredientes do
leite. Ou seja, passam por processos industriais de enriquecimento, que
nem sempre conseguem ter a absorção dos nutrientes como o do leite no
organismo. Tudo isto encarece o produto e ainda pode ser deletéria ao
organismo. Substituir o leite, um alimento de alto valor nutricional e
de preço muito acessível, é uma missão praticamente impossível, assim,
utilizar ações de marketing difamando o leite, infelizmente, tem
acontecido.
No entanto, já existem muitos estudos
científicos que demonstram que a substituição do leite, por extratos
vegetais, não devem ser apenas escolhas pessoais ou modismos, somente
sob recomendação médica, caso contrário, mais cedo ou mais tarde, o
organismo pode cobrar esta conta.
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