“VACAS MAGRAS”
Corrupção tira R$ 2,44 bilhões da pecuária brasileira
Em 2017, em vez de buscar o crescimento esperado, setor das exportações tem se ocupado em apagar incêndios institucionais e literalmente correr atrás de prejuízos
Em apenas seis meses, o
Brasil deixou de ganhar R$ 2,44 bilhões em exportações. É o preço pago
pela pecuária nacional – incluindo as carnes bovina, suína e de frango -
devido à série de escândalos em que o setor se viu mergulhado nos
últimos meses, como a Operação Carne Fraca e as delações premiadas da
JBS, a maior empresa de proteína animal do mundo.
A perda é calculada com base nas
percepções do mercado e nas projeções feitas pelo Agronegócio Gazeta do
Povo no início de 2017, e o que efetivamente foi embarcado para o
exterior ao longo do primeiro semestre.
Ao todo, de janeiro a junho, o país
exportou 2,73 milhões de toneladas de carne, o que resultou em US$ 6,09
bilhões. Em relação a 2016, mesmo com a queda de volume, houve aumento
de receita por causa dos preços melhores praticados no mercado externo,
impulsionados pela demanda aquecida, no caso da carne bovina, e pela
gripe aviária em importantes países produtores, que trouxe escassez de
frango e maior procura pela carne suína.
O presidente da Associação Brasileira de
Proteína Animal (ABPA), Francisco Turra, destaca que isso foi
determinante para evitar um tombo maior. “Isso permitiu obter níveis
favoráveis de receita cambial, especialmente neste momento em que nossas
exportações se reorganizavam após as suspensões dos embarques”, afirma.
No entanto, considerando o que era
previsto para o primeiro semestre de 2017, a queda foi grande. Num
ambiente mais otimista, o AgroGP estimava que os embarques fechariam o
período em 3,05 milhões de toneladas e US$ 6,86 bilhões. Ou seja, uma
diferença de US$ 0,77 bilhão para o valor efetivo, o que o que equivale a
R$ 2,44 bilhões, tomando como base a cotação média do dólar em 2017,
que foi de R$ 3,18, e o valor médio pago pela proteína brasileira.
Começo da queda
Começo da queda
Quando a Operação Carne Fraca foi
deflagrada pela Polícia Federal, em março, a crise foi taxada como
escândalo sanitário, com suspeitas de que havia até papelão na carne
brasileira e outros ingredientes indigestos. O baque foi imediato, com o
fechamento de vários mercados à proteína nacional. Porém, conforme
avançaram as investigações e após a reação do segmento, o que ficou
claro é que falhas de sanidade eram pontuais. O problema foi a
corrupção, com fiscais agropecuários recebendo propina para afrouxar
inspeções.
Com uma forte campanha para contornar o
problema, o Brasil vinha reconquistando a confiança do mercado. Em maio,
porém, explodiu o escândalo das delações de Joesley Batista, um dos
donos da JBS, à Polícia Federal, como parte da Operação Lava Jato e que
colocaram até o presidente Michel Temer no olho do furacão.
Novamente, o país se via às voltas com a
desconfiança de seus principais clientes no exterior, a ponto de os
Estados Unidos terem cancelado, em junho, as importações de carne bovina
brasileira, menos de um ano após a liberação da proteína nacional.
“A suspensão dos EUA afeta mais em termos
de imagem do que em termos monetários, porque eles nunca foram grandes
importadores. Os norte-americanos são referência internacional,
inclusive para Japão, México”, avalia o assessor em Inteligência
Comercial da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA),
Pedro Henriques Pereira.
A carne bovina, por sinal, é a que mais
sente o peso dos escândalos. A redução nos embarques foi tamanha que nem
mesmo os preços melhores no cenário internacional foram suficientes
para que o segmento fechasse o primeiro semestre no azul.
“Há muita especulação, os países importam
nossa carne porque têm necessidade e, em qualquer deslize, usam isso
contra. O alarde é muito maior do que o problema”, pondera o professor
Paulo Rossi, coordenador do Laboratório de Pesquisas em Bovinocultura da
Universidade Federal do Paraná (LapBov). “E o problema maior é o
consumo, com 14 milhões de desempregados. Se nas primeiras semanas do
mês não estamos abatendo boi, imagina no final. O pessoal não está
comendo carne”, acrescenta.
Com tantas bombas explodindo
inesperadamente, mesmo prognósticos mais sóbrios para os próximos meses
parecem arriscados. “O governo tem que assegurar que todas as normas e
critérios estão sendo cumpridos. Por mais que o potencial negativo seja
grande, o Brasil continua produzindo e tem muita carne para exportar. O
preço deve continuar valorizado até o fim do ano”, pontua o assessor da
CNA.
Para Francisco Turra, o mês de junho deu
uma mostra de que o otimismo pode retornar. Segundo o presidente da
ABPA, houve aumento de 6,2% nos embarques de carne de frango na
comparação com o mês anterior. “Hoje, poucos embargos perduram. A maior
parte se refere às 21 plantas que foram suspensas, após determinação do
Ministério da Agricultura brasileiro”, completa.
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