domingo, 31 de julho de 2011

Excelente Trabalho
CARACTERIZAÇÃO DO SISTEMA DE PRODUÇÃO CAPRINO E
OVINO NA REGIÃO SEMI-ÁRIDA DO ESTADO DA PARAÍBA. BRASIL
CHARACTERIZATION OF THE GOAT AND SHEEP PRODUCTION SYSTEM IN THE
SEMI-ARID REGION OF THE STATE OF PARAÍBA. BRAZIL
Costa, R.G.1, C.C. Almeida2, E.C. Pimenta Filho2, E.V. Holanda Junior3 e N.M. Santos4
1Universidade Federal da Paraíba. Centro de Formação de Tecnólogos. Departamento de Agropecuária.
Areia. PB. Brasil. betogermano@hotmail.com
2Universidade Federal da Paraíba. Centro de Ciências Agrárias. Departamento de Zootecnia. Areia. PB.
Brasil.
3Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMPRAPA. Caprinos). Brasil.
4Programa de Doutorado Integrado em Zootecnia. Areia. PB. Brasil.
PALAVRAS CHAVE ADICIONAIS
Análise multivariada. Bovino. Caatinga. Caprinos.
Manejo nutricional. Ovinos.
ADDITIONAL KEYWORDS
Multivariate analysis. Bovine. Caatinga. Goats.
Feeding handle. Lambs.
RESUMO
Objetivou-se caracterizar o sistema de
produção caprino e ovino na região semi-árida do
estado da Paraíba, quanto ao seu funcionamento
e abrangência. Foram utilizadas informações de
152 entrevistas realizadas em dez municípios do
Cariri Paraibano. Os dados obtidos foram agrupados,
por meio de análise multivariada (cluster), em
cinco grupos de produtores. A área das
propriedades variou de 4 a 1452 ha. Cerca de 94
a 98% do uso da terra destinava-se a pecuária. Os
rebanhos caprinos e ovinos eram predominantemente
produzidos em regime extensivo com o uso
da vegetação nativa (caatinga) como base para
a alimentação, sendo praticada por 92 a 100% dos
produtores. Não se observou um procedimento
definido de manejo alimentar para os animais no
período de seca. O sistema de produção animal
praticado nos cinco grupos baseava-se em diversas
combinações entre caprinos, ovinos e bovinos,
com destaque para exploração de caprinos
e bovinos destinados a produção de leite, e ovinos
para a produção de carne.
SUMMARY
We aimed at the characterization of goat and
sheep productive systems in the semi-arid region
of the state of Paraíba, analyzing their operation
and scope. Information from 152 interviews,
realized in ten countries of Cariri of Paraíba was
used. Obtained data were grouped, through
multivariate analysis (cluster), into five groups of
producers. The area of the properties varied from
4 to 1452 ha. About 94 to 98% of the land usage
was destined to cattle. The goat and sheep cattle
were predominantly produced under extensive
regimen, using native vegetation (caatinga) as the
base for feeding, being applied by 92 to 100% of
producers. No defined procedure was observed
in feeding handle to the animals during periods of
drought. The animal production system practiced
in the five groups was based in various
combinations between goat, sheep and bovine
cattle's, standing out the exploration of goat and
sheep cattle destined to milk production, and sheep
cattle to meat production.
INTRODUÇÃO
Ao longo de décadas, a caprinovinocultura
foi considerada uma atividade marginal
ou de subsistência na região Nordeste
do Brasil, normalmente com baixa produtividade
e realizada por produtores desprovidos
de capital financeiro e de recursos tecnolóArchivos
de zootecnia vol. 57, núm. 218, p. 196.
COSTA, ALMEIDA, PIMENTA FILHO, HOLANDA JUNIOR E SANTOS
gicos. Entretanto, atualmente, a produção
destes pequenos ruminantes vem se caracterizando
como uma atividade de grande
importância cultural, social e econômica para
a região, desempenhando um papel crucial
no desenvolvimento do Nordeste.
De acordo com Moraes Neto et al. (2003),
a caprinovinocultura representa uma boa
alternativa de trabalho e renda, visto a
produção de alimentos de alto valor biológico
(leite, carne e vísceras), bem como de
pele de excelente qualidade, além da
adaptabilidade dos animais aos ecossistemas
locais. Embora, segundo os autores,
em virtude do elevado grau de incertezas e
riscos, a pecuária nordestina torna-se
dependente de uma reformulação dos modelos
tradicionais de planejamento e
administração.
Ao iniciar as investigações partindo dos
sistemas de produção existentes se percebe
suas possibilidades de expansão, a partir da
identificação dos pontos de estrangulamento
tecnológico, dos recursos subutilizados
e das inter-relações que podem ser
melhoradas (Abramovay, 1985). Logo, torna-
se necessário, inicialmente, um conhecimento
prévio dos sistemas de produção,
atualmente utilizados no Semi-Árido nordestino,
de maneira a verificar os principais
problemas existentes, e numa etapa posterior
solucioná-los, permitindo um desenvolvimento
sustentável da atividade na
região (Castel et al., 2003).
Objetivou-se com o estudo, caracterizar
os sistemas de produção de caprinos e
ovinos na região semi-árida do estado da
Paraíba, identificando os tipos de unidades
de produção encontradas.
MATERIAL E MÉTODOS
A pesquisa foi realizada na região do
Cariri paraibano, abrangendo 10 municípios:
Boa Vista, Cabaceiras, Gurjão, Monteiro,
Prata, São Sebastião do Umbuzeiro, Santo
André, Sumé, Taperoá e Zabelê, por meio da
aplicação de questionários que objetivaram
coletar informações sobre tamanho das
propriedades, uso da terra, raças caprinas e
ovinas, estrutura dos rebanhos, estratégias
utilizadas para enfrentar a seca, sistemas de
exploração e de produção animal.
DESCRIÇÃO DA ÁREA AMOSTRADA
Localizada no centro do estado da
Paraíba, a região do Cariri ocupa uma área de
11235 km2, distribuídos em trinta municípios,
e apresenta a maior densidade de caprinos
(19,19 cabeças/km2) e ovinos (14,79 cabeças/
km2) do continente americano (FIBGE,
2000). Ressalta-se que os dez municípios
selecionados para a pesquisa concentram
em torno de 50% do rebanho caprino e ovino
da região. O Cariri está inserido no Semiárido
brasileiro, com clima quente e seco,
temperatura média acima de 26ºC à sombra
e pluviosidade irregular entre os anos e
entre os meses do ano, com valores variando
de 250 até 700 mm/ano. Os solos são em
geral, rasos, pedregosos e secos (Guimarães
Filho et al., 2000). A vegetação natural predominante
é a caatinga, rica em espécies
forrageiras nos seus três estratos, herbáceo,
arbustivo e arbóreo, com estudos revelando
que acima de 70% das espécies
botânicas da caatinga participam significativamente
da composição da dieta dos
ruminantes (Araújo Filho et al., 2002).
AMOSTRAGEM E COLETA DOS DADOS
As informações quantitativas primárias
foram obtidas a partir de questionários resultantes
de entrevistas conduzidas em 159
propriedades, escolhidas de forma aleatória
nos 10 municípios citados. Os 159 proprietários
visitados representaram 30% dos
produtores de caprinos e ovinos da região.
Após os testes de consistência e eliminação
de questionários, a amostra foi constituída
por 152 entrevistas. Embora priorizasse a
pecuária caprina, ovina e bovina, o questionário,
com 1556 questões fechadas e 13
abertas, continha informações sobre outras
atividades agropecuárias desenvolvidas nas
propriedades. O tempo das entrevistas
Archivos de zootecnia vol. 57, núm. 218, p. 197.
CARACTERIZAÇÃO DO SISTEMA DE PRODUÇÃO CAPRINO E OVINO NO BRASIL
variou de uma hora e vinte minutos a quatro
horas e cinqüenta minutos. As entrevistas
foram realizadas por uma única pessoa e
com igual sistemática, evitando, assim, erros
de interpretação. Aplicados os questionários,
uma revisão foi efetuada por técnicos
que não participaram das entrevistas,
com o intuito de direcionar normativas às
informações obtidas.
BANCO DE DADOS E ANÁLISE (FORMAÇÃO DOS
GRUPOS HOMOGÊNEOS DE PRODUTORES)
Os dados foram digitados utilizando-se
o módulo FSP do SAS (1999). O sistema
constituiu-se de 15 arquivos, relacionados
entre si através de variáveis chaves. Um
segundo programa reuniu todos os 15
arquivos em um único arquivo, contendo
1569 variáveis (com 1556 questões fechadas
e 13 abertas), que possibilitaram a
elaboração de variáveis não obtidas
diretamente do questionário (tabela I).
Utilizou-se a análise de agrupamento
(Duran e Odell, 1974) para proceder à
formação dos grupos homogêneos. Foram
selecionadas para a formação dos grupos,
as variáveis; número de caprinos, ovinos e
bovinos, em unidade animal (UA), e área da
propriedade destinada à pecuária, em
hectares.
Para a formação dos grupos utilizou-se
um método multivariado não hierárquico
com base no método k-means (proc fastclus).
A partir das variáveis selecionadas, realizouse
a análise de cluster, tomando por base o
exposto por Khattree e Naik (2000). Após o
agrupamento, foi realizada uma análise discriminante
canônica visando caracterizar
os grupos obtidos. Foi utilizado o Pacote
Estatístico SAS System for Windows V8.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
CARACTERIZAÇÃO DOS AGRUPAMENTOS E
USO DA TERRA
Foram identificados cinco grupos
homogêneos representativos das atividades
agropecuárias desenvolvidas na região
(tabela II). A metodologia adotada permitiu
explicar que a variável, número de ovinos
teve 79,24% de sua variância explicada, a
variável, número de caprinos teve 68,52%, a
variável área com pecuária 67,83% e a
variável, número de bovinos 34,52%.
A análise discriminante indica que os
grupos formados se diferenciam quanto ao
Tabela I. Estrutura do questionário de campo. (Structure of the field questionnaire).
Respostas
Nº fechadas abertas
Tipos de perguntas
1. Indicadores físicos da propriedade rural 197 194 3
2. Indicadores sociais do proprietário e família 34 27 7
3. Indicadores do financiamento rural 12 11 1
4. Lavouras praticadas 10 10 -
5. Atividades de pecuária
5.1. Manejo alimentar 697 695 2
5.2. Manejo reprodutivo 116 116 -
5.3. Manejo produtivo 81 81 -
5.4. Manejo sanitário 154 154 -
5.5. Manejo genético 37 37 -
5.6. Rentabilidade da exploração 220 220 -
6. Fatores mais importantes 11 11 -
Total 1569 1556 13
Archivos de zootecnia vol. 57, núm. 218, p. 198.
COSTA, ALMEIDA, PIMENTA FILHO, HOLANDA JUNIOR E SANTOS
tamanho da exploração, crescendo do grupo
I ao V, e quanto a relação número de
caprinos/número de ovinos, sendo maior
nos grupos V e III e menor nos grupos II e,
principalmente, IV. As propriedades foram
plotadas em função dos dois primeiros
vetores canônicos. O primeiro vetor (CAN1)
representa o tamanho da exploração e o
segundo (CAN2), a relação caprinos/ovinos
(figura 1). Quanto maior o valor de CAN1,
maior é o tamanho da exploração. Já em
termos de relação caprinos/ovinos, quanto
maior o valor de CAN2 maior o número de
caprinos em relação ao de ovinos. Valores
inferiores a zero indicam que o rebanho
ovino é maior que o caprino.
A área média das propriedades variou de
57 (grupo I) a 1141 hectares (grupo V), sendo
esta ultima semelhante a área média de
exploração de caprinos no Norte e Leste da
Espanha (Acero de la Cruz et al., 2003).
Sabe-se que o tamanho das propriedades
representa um fator importante quanto a
decisão do que e como explorar, além de ser
um limitante que precisa ser adequadamente
estudado, sobretudo no que tange a peculiar
zona semi-árida nordestina.
Constataram-se nos cinco grupos a
utilização de lavoura entre dois e seis por
cento, com a pecuária entre 94 a 98% da área
total. A lavoura praticada compreendeu o
plantio de feijão (Phaseolus vulgaris L.),
milho (Zea mays L.) e algodão (Gossypium
barbadense L.), caracterizando-se como de
subsistência, com índices de comercialização
muito baixos (0-11%), normalmente em período
de chuvas e quando produzido excedentes.
A área composta pela caatinga bruta
predominou nos cinco grupos, variando de
Tabela II. Características gerais dos grupos pesquisados. (General characteristics of the
searched groups).
Grupos I II III IV V
Porcentagem de produtores 47 22 18 9 4
Área média das propriedades (ha) 57 116 314 407 1141
Proprietário das terras (% de produtores) 90 94 93 100 100
Recebeu assistência técnica (% de produtores) 39 41 43 62 60
Disponibilidade de água nas propriedades (meses) 9 9 11 12 20
Disponibilidade de energia elétrica
Monofásica (% de produtores) 72 62 46 31 20
Trifásica (% de produtores) 18 38 50 69 60
Mão-de-obra familiar (%) 84 65 64 51 34
Mão-de-obra permanente contratada (homens) 0 1 1 1 2
Número de caprinos (cabeças) 59 88 208 202 432
Número de ovinos (cabeças) 26 64 50 216 86
Renda bruta anualdos produtores (R$)
Caprinos 2060 3657 7335 7117 12234
Ovinos 369 1496 679 5979 1370
Bovinos 2699 3037 5607 5821 5610
Outras atividades
Dentro* 14 7 0 800 2740
Fora** 3650 3955 11300 6777 22080
Total 8792 12152 24921 26494 44034
*Outras atividades dentro da propriedade (venda de esterco e lenha); **Outras atividades fora da
propriedade (prestação de serviços com pecuária, prestação de serviço em outras atividades,
aposentadoria e outras).
Archivos de zootecnia vol. 57, núm. 218, p. 199.
CARACTERIZAÇÃO DO SISTEMA DE PRODUÇÃO CAPRINO E OVINO NO BRASIL
63 a 77%; seguida pelas áreas de capoeira,
7 a 19%; palma (Opuntia sp.), 2 a 10%; caatinga
trabalhada, 3 a 10%; e pastagens artificiais
de buffel (Cenchrus ciliaris L.) e brachiaria
(Brachiaria decumbens), de 0 a 5%.
Para o capim de corte a área foi de 0 a 2%
em todos os grupos, sendo que as variedades
mais usuais foram o capim elefante
(variedade Napier, Penisetum purpureum
Schum.) e o capim andrequiçé ou marrequinha
(Paspalum conjugatum), com
ausência de pastejo direto pelos animais.
No grupo I, 2% da área se destinava ao
plantio de capim elefante e sorgo (Sorghum
vulgare), objetivando a confecção de
silagem. Nos demais grupos aproveitam-se
outras plantas nativas para tal finalidade ou
simplesmente não se utiliza procedimento
de ensilagem.
Procede-se no grupo IV o plantio de
algaroba (Prosopis juliflora) em 6% da área.
Nos demais grupos a presença dessa planta,
decorre de plantios não planejados, por
invasão de sementes de propriedades
vizinhas ou de sementes presentes nas fezes
dos próprios animais.
ESTRUTURA DOS REBANHOS
O sistema associativo, com produção de
caprinos, ovinos e bovinos, caracterizou-
Figura 1. Gráfico dos grupos plotados segundo os coeficientes das propriedades para os dois
primeiros vetores canônicos: CAN1 - tamanho da exploração e CAN2 - relação caprinos -
ovinos. (Graph of the located groups according to coefficients of the properties for the two first canonic
vectors: CAN1 - size of the exploration and CAN2 - relation goats lambs).
Tabela III. Efetivos médios dos rebanhos. (Average cash of the flocks).
Grupos I II III IV V
Total de caprinos, ovinos e bovinos (nº) 78 161 290 439 560
Propriedades sem caprinos (%) 8 6 0 0 0
Propriedades sem ovinos (%) 19 0 18 0 0
Propriedades sem bovinos (%) 25 24 14 15 40
Relação caprina/ovina 3,32 1,28 4,18 0,94 5
Relação caprino + ovino/ bovino 10 11,31 7,87 19,92 12,34
Archivos de zootecnia vol. 57, núm. 218, p. 200.
COSTA, ALMEIDA, PIMENTA FILHO, HOLANDA JUNIOR E SANTOS
se como o esquema mais utilizado pelos
produtores. Considera-se este tipo de
pecuária integrada uma vantagem, visto que
representa uma diversificação positiva para
efeito de oportunidades de mercado.
Os efetivos médios dos rebanhos
consistiram de valores crescentes em relação
a área total das propriedades, observadas
pela variação do grupo I ao grupo V (tabela
III). A variação de 78 (grupo I) a 560 animais
(grupo V) se deve, possivelmente, a
diferença encontrada na área média das
propriedades, que variou de 57 a 1141 ha.
A maioria dos rebanhos apresentou uma
quantidade de reprodutores inferior a
necessária para cobrir o número de fêmeas.
Quanto as matrizes, observou-se que a sua
reposição praticamente não era feita, com
animais ultrapassando o momento de serem
descartados (seja por idade, baixa produção,
etc.), talvez em decorrência da elevada taxa
de mortalidade dos animais jovens.
MANEJO REPRODUTIVO DOS ANIMAIS
Foi observada uma grande variedade de
raças caprinas e ovinas, como também uma
miscigenação entre estas raças, principalmente
em caprinos.
Verificou-se uma falta de direcionamento
produtivo, não havendo distinção quanto
às aptidões de cada raça (leite, carne, ou
leite e carne), nem qual a mais indicada para
a referida produção, confirmando as
observações de Arias e Alonso (2002). Podese
citar como exemplo, um rebanho formado
por fêmeas com padrão racial bem caracterizado
como Alpino e utilizado por três
reprodutores: um Saanen, um Pardo Alpino
e um Boer.
Não foi observado em nenhum dos grupos,
métodos de seleção e de manejo
reprodutivo visando a melhoria da produção
ou mesmo no sentido de padronização do
rebanho. De acordo com as afirmações de
Camacho Vallejo et al. (2002), sistemas de
manejo inadequados ou deficientes representam
uma das principias razões da baixa
produtividade.
Os únicos rebanhos formados exclusivamente
com raças puras foram a Parda
Alpina (1%) e Anglonubiana (8%), com
muitos dos criadores realizando, inclusive,
registro genealógico na Associação Brasileira
dos Criadores de Caprinos.
O uso de reprodutores e fêmeas de origem
Alpina predominou nos rebanhos onde se
queria renovar a função leiteira, uma vez que
ao longo de séculos, estes animais passaram
por um processo de seleção natural,
possivelmente negativo do ponto de vista
produtivo. Além disso, dos dez municípios
pesquisados apenas Taperoá não estava
ligado a algum programa do leite, quer seja
de âmbito municipal, estadual ou federal.
A utilização de reprodutores e fêmeas
Anglo-Nubianos ocorreu com maior
intensidade onde os rebanhos eram mais
voltados para a produção de carne, embora,
alguns produtores também os utilizem visando
um incremento na produção leiteira,
tendo em vista que a raça é considerada
como de dupla aptidão, carne e leite.
Steinbach (1987) afirma que, em geral,
importam-se raças em decorrência do
desconhecimento do potencial produtivo
dos animais autóctones e que na maioria
dos casos, as raças nativas têm seu desempenho
produtivo mascarado por práticas
inadequadas de manejo, sendo prejudicadas
pela ausência de uma análise econômica
global. Segundo Camacho Vallejo et al.
(2002), o bom nível de formação dos
produtores de leite de cabra no norte de
Córdoba, Espanha, em geral decorre do
conhecimento adquirido com a produção
bovina, porém informações específicas sobre
o manejo caprino seriam necessárias
para que os produtores pudessem superar
as deficiências existentes no setor.
Embora com menor expressão, os métodos
de seleção e de manejo reprodutivo com
raças ovinas, também não representam
práticas comuns na região. A raça ovina
predominante foi a Santa Inês (51%), inclusive,
sendo utilizada no cruzamento com as
demais raças. Ficou evidenciado o prevaArchivos
de zootecnia vol. 57, núm. 218, p. 201.
CARACTERIZAÇÃO DO SISTEMA DE PRODUÇÃO CAPRINO E OVINO NO BRASIL
lecimento das raças deslanadas, provavelmente
em decorrência de sua rusticidade,
prolificidade, adaptabilidade aos ecossistemas
e excelente qualidade de carne e peles.
MANEJO NUTRICIONAL DOS REBANHOS CAPRINO
E OVINO
De um modo geral, o manejo alimentar
das espécies caprina e ovina foram
semelhantes. No inverno, com a incidência
de chuvas e abundância de pasto, os animais
são normalmente produzidos em regime exclusivamente
extensivo.
Constatou-se que a base alimentar dos
animais era a caatinga (em seus estados:
bruta, trabalhada e capoeira), utilizada por
92-100% dos produtores, e em regime de
pastoreio conjunto para todos os ruminantes,
sendo em algumas propriedades
praticamente a única fonte alimentar ao
longo de todo o ano. No período de estiagem,
como afirmaram Mesquita et al. (1988), a
produção de fitomassa é reduzida a valores
muito baixos, com perdas que podem
alcançar os 60% da produção da área. Neste
período, as folhas secas que caem das
árvores, disponíveis para os animais no
solo, representam importante componente,
tanto na proteção do solo quando ocorrem
as primeiras chuvas, como também na
alimentação dos animais, quando oriundas
de plantas forrageiras.
Associada ao uso da caatinga, a palma,
representa um recurso forrageiro largamente
utilizado no período seco. A cultura do
milho, feijão e algodão como suplemento
alimentar para o rebanho, embora citado
pela maioria dos produtores (50-79% para
caprinos e 41-78% para ovinos) é totalmente
dependente das chuvas, e quando
produzidas, normalmente são utilizados
primeiramente para bovinos (basicamente
as vacas em lactação), chegando apenas
para os caprinos e ovinos quando normalmente
existe capacidade para absorver todas
as espécies animais produzidas.
O bagaço de cana hidrolisado foi utilizado
por apenas 2% dos produtores do grupo
I para caprinos e ovinos, provavelmente em
decorrência da falta de conhecimento técnico
e da baixa condição financeira dos
produtores.
Os produtores utilizaram feno para os
caprinos entre 8-20% e ovinos entre 9-20%,
embora não tenha sido utilizada por
produtores do grupo IV. A silagem, não
usada nos grupos IV e V, apresentou um uso
máximo de 11% no grupo III para caprinos e
de 4% para ovinos. Silva et al. (2004)
afirmaram que as técnicas de conservação
de forragem apresentam um baixo índice de
adoção na região, sendo a fenação mais
utilizada que a ensilagem, talvez pela aparente
simplicidade do processo.
O sistema de produção extensivo voltado
à exploração da caatinga se fundamenta em
processos meramente extrativistas, embora
a manipulação desse ecossistema, baseado
em práticas de conservação dos recursos
naturais, pode aumentar a disponibilidade
de forragem.
O concentrado utilizado pelos produtores
para caprinos e ovinos na realidade
consistiu no fornecimento de concentrados
prontos e de farelos de milho, trigo, soja,
algodão e torta de algodão, sendo, geralmente,
cada ingrediente desses fornecido
isoladamente, sem maiores preocupações
com o atendimento das exigências nutricionais
por categoria (animais em fases de
crescimento, lactação, reprodução, etc.).
Ocorre o fornecimento de concentrado pronto
apenas nos grupos I e II (ambos com 3%
para caprinos), e apenas no grupo I (2% para
ovinos). O uso de concentrado nas
produções de caprinos e ovinos ocorre
normalmente quando os animais estão em
fase de lactação ou nos períodos de
estiagem, numa tentativa de salvar os
rebanhos da morte por desnutrição.
O fornecimento de vagens de algaroba
para a produção de caprinos, variou de 15 a
60% em todos os grupos, enquanto para
ovinos foi de 15 a 40%, caracterizando como
uma importante fonte nutricional para os
animais na época seca (período de frutiArchivos
de zootecnia vol. 57, núm. 218, p. 202.
COSTA, ALMEIDA, PIMENTA FILHO, HOLANDA JUNIOR E SANTOS
ficação das algarobeiras).
Em virtude da baixa produção de grãos
na região Nordeste (Ferreira et al., 2004) o
uso de subprodutos da agroindústria,
constitui uma importante alternativa para
alimentação dos rebanhos em sistemas intensivos
e semi-intensivos. Representando
uma fonte alternativa de nutrientes, o uso
de subprodutos industriais na alimentação
animal também promove à redução da
contaminação ambiental e barateia os custos
de produção, devido ao seu preço ser, normalmente,
inferior aos suplementos convencionais.
ESTRATÉGIAS PARA ENFRENTAR A SECA
As estratégias utilizadas para enfrentar
a seca na realidade consistem em práticas
realizadas de forma não técnica e sem
procedimento definido (28%), com venda
de animais na maioria das vezes (21 a 25% em
todos os grupos), aquisição de alimentos,
uso do mandacaru (Cereus jamacaru P.
DC.) ou associação entre dois ou mais métodos
citados anteriormente. Deve-se
ressaltar que todas as estratégias postas em
prática são iniciativas dos produtores, sem
nenhuma participação ou esforço de
racionalização por parte de instituições de
política agrícola, ensino e pesquisa, e de
fomento. De acordo com as observações de
Acero de la Cruz et al. (2003) o principal
problema das explorações caprinas analisadas
no Norte e Este da Espanha consistia
na gestão deficiência que os produtores
desenvolviam em suas propriedades. Normalmente
uma gestão inadequada decorre
do baixo nível educacional dos produtores
(Bedotti et al., 2005).
Queiroz et al. (1986), em trabalho sobre
ecologia e manejo do sistema de produção
de pequenos ruminantes no Sertão do Ceará
no Nordeste do Brasil, encontraram que no
período de seca, os produtores administravam
seus estoques de forragens reduzindo
o número de animais e mudando a composição
das espécies na propriedade, ocorrendo
assim principalmente a redução dos bovinos
e aumento no número de caprinos, com
o rebanho ovino praticamente não se alterando.
Embora os bovinos pareçam importantes
para a renda e produção global da fazenda
na região, a produção de ovinos e principalmente
de caprinos provavelmente garantem
a renda e a sobrevivência dos produtores.
SISTEMAS DE EXPLORAÇÃO
Verificou-se predominância das explorações
extensivas, sem uso de técnicas de
manejo e praticamente sem nenhuma
escrituração zootécnica. Hernández (2000),
afirma que os sistemas de exploração caprina
no México são baseados predominantemente
no pastoreio extensivo, tendo como principal
finalidade a produção de carne. Na
Espanha, a produção de ovinos de corte
baseia-se no sistema de exploração puramente
extensivo, principalmente em virtude
das características de rusticidade e adaptabilidade
dos animais nativos as condições
climáticas características da região (Martín
Bellido et al., 2001). Os autores também
afirmaram que esse sistema tradicional de
produção a pasto promove a obtenção de
produtos de melhor qualidade quando comparados
com os produtos obtidos com a
produção intensiva.
Os sistemas de exploração com caprinos
leiteiros na área analisada foram muito variados,
incluindo desde sistemas intensivos
(não muito freqüentes) até os extensivos,
sem suplementação alimentar, levando
a produções estacionais que se limitam ao
período de inverno. Para os caprinos e ovinos
de corte prevalecem os sistemas extensivos.
O sistema intensivo é utilizado apenas
nos grupos I (3%) e III (8%), o que retrata a
sua baixa utilização pelos caprinocultores.
No caso do grupo I, provavelmente em
decorrência do tamanho das propriedades
(área máxima de 57 ha). O sistema semiintensivo
com 33% decorre da necessidade
de suplementação dos rebanhos no período
de seca. Por fim, o sistema extensivo (65%)
Archivos de zootecnia vol. 57, núm. 218, p. 203.
CARACTERIZAÇÃO DO SISTEMA DE PRODUÇÃO CAPRINO E OVINO NO BRASIL
caracterizando-se como o método de
produção mais usual na região, evidenciando,
um direcionamento para a exploração da
carne e pele. Monroy et al. (2003), avaliando
a situação da produção de cabras na
Califórnia do Sul, encontraram que 93% dos
seus produtores utilizaram também o sistema
de exploração extensivo.
Embora muito semelhantes aos dos
caprinos, os sistemas de exploração dos
ovinos apresentam pequenas variações, com
uma média total de 29% no sistema semiintensivo
e 69% no extensivo. Pode-se inferir
de tal informação, que mesmo os ovinos
manejados a maior parte do tempo juntamente
com os caprinos, o fato de se explorar
nas cabras também o leite, faz com que estas
sejam privilegiadas no momento da racionalização
do manejo.
CARACTERIZAÇÃO DOS SISTEMAS DE
PRODUÇÃO
Verificou-se um sistema de produção
associativo; com caprinos, ovinos e bovinos,
produzidos em 65% das propriedades
pesquisadas. A criação de caprinos estava
presente em 96% das propriedades, onde
47% dos animais eram destinados a produção
de leite e 49% para carne. Os ovinos
estavam presentes em 81% das propriedades
e os bovinos em 79%, com 61% para a
produção de leite e 18% para o corte.
Propriedades com produção apenas de
caprinos representaram 10% e apenas
ovinos 1%. A criação exclusiva de bovinos
não foi encontrada em nenhuma das
propriedades pesquisadas.
Existe uma tendência de substituição no
grupo I das demais atividades pela produção
de leite de cabra, visto que a demanda pelo
produto está se consolidando com relativa
rapidez na região. O grupo II destacou-se
pela maior representação no sistema de
criação de caprinos e ovinos (18%).
Observou-se no grupo III uma grande
concentração de atividades destinadas a
produção de leite caprino e bovino. O grupo
IV concentra suas atividades na exploração
dos bovinos leiteiros, caracterizando-se
como uma atividade tradicional decorrente
da maior disponibilidade de terras.
Detendo a maior área das propriedades,
com disponibilidade de água e área construída,
o grupo V caracteriza-se como o que
mais sub-utiliza os recursos das propriedades
e seus respectivos potenciais. Predomina
a exploração de leite caprino e carne
ovina, seguida pela produção de leite bovino.
Dados similares aos encontrados neste
estudo foram reportados por Holanda Júnior
(2004), trabalhando com caracterização
zootécnica e de renda nos sistemas de
produção de caprinos e ovinos praticados
no Sertão da Bahia.
Verificou-se com a pesquisa que muitos
fatores têm contribuído para a baixa
produtividade de caprinos e ovinos na
região, destacando-se entre eles, a utilização
de técnicas inadequadas de manejo alimentar
e reprodutivo, o uso de métodos extensivos
de produção com baixa inversão de
capital e com a idéia de que estes pequenos
ruminantes podem assegurar na pastagem
nativa sua nutrição.
CONCLUSÕES
O sistema extensivo caracterizou-se
como o mais usual em todos os grupos
avaliados, com o ecossistema da caatinga
utilizado de maneira extrativista.
A falta de manejo alimentar adequado,
necessário para atender as exigências
nutricionais dos animais, e o sistema de
produção associativo, com a utilização de
caprinos, ovinos e bovinos, caracterizaramse
como fatores dominantes.
A ausência no grupo IV de práticas de
conservação de forragens, como fenação
ou ensilagem, para fornecimento aos animais
no período de escassez de chuvas, representa
um ponto crítico da atividade pecuária
neste grupo.
Promover o cultivo de forrageiras nativas,
para a confecção de silagem e feno
deve ser priorizada no grupo I. A maior
Archivos de zootecnia vol. 57, núm. 218, p. 204.
COSTA, ALMEIDA, PIMENTA FILHO, HOLANDA JUNIOR E SANTOS
disponibilidade territorial para o plantio de
variedades nativas, em todos os demais
grupos, viabilizaria uma maior oferta de alimentos
para os animais no período de
estiagem e garantiriam a sustentabilidade
do sistema produtivo na região.

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